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Entrevista: havia mamíferos que comiam dinossauros

Há 66 milhões de anos, um asteroide colidiu com a Terra no local onde hoje fica a península de Yucatan, no México. Além de pulverizar instaneamente tudo que havia no local da colisão, o pedregulho de 12 km de diâmetro destroçou o equilíbrio do clima e dos ecossistemas de todo o mundo.

Ali começou uma cadeia de eventos que ficou famosa por extinguir quase todos dinossauros (a exceção foram as aves). Essa não foi a primeira extinção em massa que o planeta enfrentou, nem a pior. Mesmo assim, mais de 75% da fauna terrestre bateu as botas, e os poucos sobreviventes se irradiaram para dar origem ao mundo como o conhecemos. 

Para entender como os mamíferos se aproveitaram do vazio de répteis para dominar a Terra, conversamos com a paleontóloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Marina Bento Soares. Ela explicou por que os dinossauros nunca foram totalmente extintos, como eram os primeiros mamíferos da Terra e como era vida de um mamífero que comia dinossauros.

Junto com Alexander Kellner, também paleontólogo, ela é autora de dois dos capítulos do livro A Evolução é Fato, que conta com a participação de 28 pesquisadores brasileiros. Você pode baixá-lo gratuitamente aqui

A obra aborda diferentes capítulos da história da vida na Terra, de um jeito didático e acessível, sempre através do prisma da seleção natural. O livro levou três anos para ficar pronto, e foi feito pela Academia Brasileira de Ciência (ABC), que se manteve atualizada sobre descobertas científicas durante todo o processo. 

A maior parte das explicações inclui exemplos brasileiros – o que, aliás, não faltam quando falamos de fósseis. A conversa a seguir faz parte de uma série de entrevistas que a Super está publicando com os autores dos textos.

Por que nem todos os animais que viviam na Terra foram extintos da mesma forma que os dinossauros no final do Cretáceo? 

Marina: Eventos de extinção em massa sempre aconteceram ao longo da história da vida na Terra. Não foi uma, nem duas, nem três, foram muitas. Porém, existem cinco delas que são consideradas as big five, que são aquelas em que mais de 75% de todas as espécies, seja vertebrado, invertebrado, planta, foram extintas. A do Cretáceo, que afetou os grandes dinossauros e outras espécies, foi a mais recente, mas não foi a pior.

Essas extinções são explicadas por uma série de causas, sempre tem uma cascata de eventos, uma coisa vai levando à outra. Na extinção dos dinossauros, assim como em outras, há eventos de vulcanismo envolvidos. Mas, aliado a isso, a gente tem o tal do corpo celeste que se chocou com a Terra.

Mas é importante dizer que não foram só os dinossauros que foram extintos nesse momento. Vários grupos foram afetados, e vários se recuperaram. Tartarugas, répteis, aves e mamíferos.

Na verdade, os dinossauros não foram extintos nessa extinção do Cretáceo, porque as aves são dinossauros. Aves surgiram diretamente dentro de um grupo de dinossauros terópodes e são consideradas dinossauros. Então, é por isso que hoje falamos em dinossauros não-avianos, que são aqueles que foram extintos, e os avianos, que estão aí até hoje.

(…)

Leia o artigo na íntegra no site da Super

 

Nobel de Química de 2024: design computacional e previsão de estruturas de proteínas

A Academia Real Sueca de Ciências decidiu conceder o Prêmio Nobel de Química de 2024 com metade para David Baker (Universidade de Washington, Seattle, EUA), “por design computacional de proteínas” e a outra metade conjuntamente para Demis Hassabis (Google DeepMind, Londres, Reino Unido) e John M. Jumper (Google DeepMind, Londres, Reino Unido), “por previsão de estruturas de proteínas”. 

Eles decifraram o código das estruturas impressionantes das proteínas, as engenhosas ferramentas químicas da vida. David Baker conseguiu realizar a façanha quase impossível de construir novos tipos de proteínas. Demis Hassabis e John Jumper desenvolveram um modelo de IA para resolver um problema de 50 anos: prever as complexas estruturas das proteínas. Essas descobertas têm um enorme potencial de aplicação.

A diversidade da vida atesta a incrível capacidade das proteínas como ferramentas químicas. Elas controlam e impulsionam todas as reações químicas que, juntas, são a base da vida. As proteínas também funcionam como hormônios, substâncias sinalizadoras, anticorpos e os blocos de construção de diferentes tecidos.

“Uma das descobertas reconhecidas este ano diz respeito à construção de proteínas espetaculares. A outra é sobre a realização de um sonho de 50 anos: prever estruturas de proteínas a partir de suas sequências de aminoácidos. Ambas as descobertas abrem vastas possibilidades”, diz Heiner Linke, presidente do Comitê Nobel de Química.

As proteínas geralmente consistem em 20 aminoácidos diferentes, que podem ser descritos como os blocos de construção da vida. Em 2003, David Baker conseguiu usar esses blocos para projetar uma nova proteína que não se parecia com nenhuma outra. Desde então, seu grupo de pesquisa produziu uma criação imaginativa de proteínas após a outra, incluindo proteínas que podem ser usadas como fármacos, vacinas, nanomateriais e pequenos sensores.

A segunda descoberta diz respeito à previsão de estruturas de proteínas. Nas proteínas, os aminoácidos estão ligados em longas cadeias que se dobram para formar uma estrutura tridimensional, que é decisiva para a função da proteína. Desde a década de 1970, os pesquisadores tentavam prever estruturas de proteínas a partir de sequências de aminoácidos, mas isso era notoriamente difícil. No entanto, quatro anos atrás, houve um avanço impressionante.

Em 2020, Demis Hassabis e John Jumper apresentaram um modelo de IA chamado AlphaFold2. Com sua ajuda, eles conseguiram prever a estrutura de praticamente todas as 200 milhões de proteínas que os pesquisadores identificaram. Desde seu avanço, o AlphaFold2 tem sido usado por mais de dois milhões de pessoas em 190 países. Entre uma miríade de aplicações científicas, os pesquisadores agora podem entender melhor a resistência a antibióticos e criar imagens de enzimas que podem decompor plástico.

A professora e pesquisadora do Departamento de Ciência da Computação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Raquel de Melo Minardi, que foi membra afiliada da ABC no período 2019-2023, comentou a premiação. 

Ela disse que a modelagem computacional de proteínas é um dos problemas mais desafiadores da biologia moderna e que o trabalho dos premiados com o Nobel de Química 2024 na compreensão e previsão de estruturas proteicas impactam diretamente a medicina, a farmacologia e a biotecnologia, entre outras áreas.

Raquel explicou que prever a estrutura de proteínas é um problema intrinsecamente difícil devido à massiva quantidade de interações moleculares e conformações possíveis. Por muitos anos, o campo de modelagem computacional de proteínas experimentou apenas pequenos avanços incrementais. Isso se deve à complexidade do problema e às limitações dos métodos clássicos, que não conseguiam lidar com a vasta quantidade de dados necessária para previsão da estrutura de proteínas precisamente.

“A modelagem teórica de proteínas é um desafio computacional complexo. As proteínas são compostas por cadeias de aminoácidos que se enovelam em estruturas tridimensionais complexas, que definem suas funções biológicas. Assim, a previsão da estrutura, a partir da sequência, abre caminho para inúmeras análises através de métodos de biologia computacional”, afirmou Minardi.

Jumper e Hassabis contribuíram para o lançamento do AlphaFold em 2018. Este método trouxe um avanço considerável na previsão de estruturas proteínas usando aprendizado profundo e dados evolutivos, contidos em bases de dados públicas de sequências e estruturas de proteínas. Em 2020, uma nova versão do método, com uma nova arquitetura de rede neural baseada em Transformers, alcançou níveis de precisão comparáveis aos métodos experimentais para a resolução de estruturas de proteínas. A versão atual trouxe novos refinamentos e incorporou a modelagem de interações entre proteínas e outras moléculas como peptídeos e ácidos nucleicos.

Raquel Minardi relata que o AlphaFold foi capaz de prever a estrutura de 98% das proteínas conhecidas do genoma humano, com alta confiabilidade para cerca de dois terços delas. “As aplicações tem sido muitas: na medicina, podem auxiliar na compreensão de doenças relacionadas ao enovelamento incorreto de proteínas, como o Alzheimer, além de facilitar o desenvolvimento de terapias personalizadas. Na farmacologia, aceleram a capacidade de previsão da interação entre proteínas e compostos químicos com maior acurácia. Na biotecnologia, têm apoiado a engenharia de proteínas com funções específicas, de interesse industrial”, pontuou.

David Baker também atua na modelagem de proteínas, tendo desenvolvido o Rosetta, uma ferramenta de referência para modelagem computacional de proteínas e suas interações com outras moléculas. Entretanto, suas contribuições envolvendo modelos de Inteligência Artificial Generativa para o projeto de novas proteínas é notável.

“Ele e sua equipe desenvolveram métodos para a criação de proteínas completamente novas, que não existem na natureza. Essas proteínas foram projetadas usando ‘alucinações’ de redes neurais profundas. Essas ‘alucinações’ ocorrem quando um modelo é treinado para criar novas proteínas, sem necessariamente estar restrito a exemplos conhecidos. Assim, a rede neural pode explorar novas combinações de sequências e estruturas de proteínas que podem não ter sido observadas antes, mas que ainda seguem regras de estabilidade estrutural e potencial funcional. O grupo propôs computacionalmente e validou experimentalmente novas estruturas de proteínas”, explicou Minardi.

Baker tem acumulado patentes nos últimos anos envolvendo esses modelos e suas aplicações. “Essas descobertas poderão apoiar o projeto de proteínas capazes de atuar como catalisadores em reações químicas de interesse industrial, na despoluição do ambiente degradando moléculas poluentes, no desenvolvimento de proteínas com potencial de neutralização de vírus e na imunoterapia para tratamento do câncer, por exemplo”, ressaltou a cientista.


Veja matérias na grande mídia com comentários de Acadêmicos!

FOLHA DE S.PAULO, 9/10
Nobel de Química 2024 premia três cientistas por criação e identificação de estrutura de proteínas
Matéria de Reinaldo José Lopes para a Folha de S. Paulo traz comentários do vice-presidente da ABC/SP Glaucius Oliva.

ESTADÃO, 9/10
Nobel de Química vai para trio que usa inteligência artificial para decifrar segredos das proteínas
Matéria de Roberta Jansen para o Estadão é comentada pelo vice-presidente da ABC/SP Glaucius Oliva sobre premiação tripla.

Acadêmica é agraciada com a 1ª edição do prêmio “Elas na Matemática”

Entre os dias 2 e 4 de outubro, a Sociedade Brasileira de Matemática (SBM) organizou o 1º Workshop SBM de Mulheres na Matemática na Universidade Estadual de Maringá (UEM). Entre as várias atividades, foi entregue a 1ª edição do prêmio “Elas na Matemática”, em parceria com o Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).

Na categoria Cientista Destaque de Matemática do Brasil foi agraciada a titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC) Maria José Pacífico, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Conheça sua trajetória:

Maria José Pacífico (Foto:SBM)

Maria José Pacífico – UFRJ

Paulista de Guariba, a 60 km de Ribeirão Preto, Maria José Pacífico procurou adquirir conhecimento ao máximo durante o antigo ‘Primário’ em um dos únicos colégios de sua cidade natal. Logo cedo, juntou-se a colegas em um grupo de estudos e tratou de mergulhar nos livros. Interessou-se por Matemática e Língua Portuguesa, disciplinas de fácil entendimento e de uma maneira mais divertida, em detrimento de decorar os conhecimentos engessados de História e Geografia.

Com isso, não foi muito complicado antever que ela escolheria ir por esse caminho das Ciências Exatas. Entrou na graduação em 1970 para o curso de Licenciatura em Matemática na Faculdade de Ciências e Letras (atual Unesp de Rio Claro), na qual se formou em 1973. Nos sete anos seguintes, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde concluiu Mestrado e Doutorado em Matemática no IMPA em 1980.

Iniciou seus estudos em Sistemas Dinâmicos no fim da década anterior e, até hoje, seus trabalhos na área têm sido publicados em periódicos de grande prestígio e evidenciam a relevância e o impacto de suas contribuições para a Matemática. Após frequentar o IMPA por muitos anos, Maria José se tornou professora no Instituto de Matemática da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IM- UFRJ) em 1982, onde exerce a função até hoje.

Além disso, foi a Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Matemática do IM-UFRJ por quatro mandatos – o último expirou em julho de 2024. Organizou várias reuniões científicas na área, promovendo a vinda de muitos professores visitantes à UFRJ, colaborando deste modo para o fomento do intercâmbio científico entre a Universidade e outras instituições e para a solidificação do Instituto de Matemática como um centro ativo de pesquisa em Sistemas Dinâmicos. É membra titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC) desde 2005, e membra da Academia Mundial de Ciências (TWAS, sigla em inglês) desde 2007.

Extremamente ativa como pesquisadora, a professora Maria José é reconhecida nacional e internacionalmente como uma das principais referências na área, exercendo forte influência no desenvolvimento desse campo ao longo de décadas.

Helena Nader participa de conversa em Harvard sobre a participação feminina na ciência

No dia 2 de outubro, a presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Helena Bonciani Nader, foi convidada pela Universidade de Harvard, EUA, para uma conversa sobre como alavancar a participação feminina na ciência. A moderadora foi a também Acadêmica Marcia Caldas de Castro, professora da Harvard T. H. Chan School of Public Health e diretora do Programa de Estudos Brasileiros do David Rockefeller Center for Latin American Studies, ambos departamentos de Harvard que organizaram o encontro.

Nader lembrou que a primeira mulher eleita como titular da ABC foi a bióloga Marta Vannucci no ano de 1966, quando a Academia já completava 50 anos de existência. No ano de 2007 as mulheres eram apenas 7% dos membros ativos, número que aumentou para 28% nos dias atuais. “O que eu defendi quando assumi o cargo de vice-presidente na gestão Luiz Davidovich foi a busca ativa por mulheres com potencial de ingresso. Nós descobrimos que as mulheres ainda se inscreviam em uma proporção muito menor do que os homens para se tornarem membros. Sabemos que ainda não é o número ideal, ainda não representa a participação feminina na ciência brasileira, mas estamos avançando”, explicou Nader.

A presidente da ABC também reconheceu que a Academia ainda está atrás na representatividade étnica brasileira. “Ainda temos muito poucos representantes negros, que são mais da metade da população brasileira, e temos apenas um indígena, Davi Kopenawa, como membro correspondente”.

Segundo ela, o problema da representatividade vem sendo atacado na graduação graças às ações afirmativas, que permitiram às universidades públicas se tornarem mais plurais. Entretanto, ainda é preciso garantir a permanência de alunos pertencentes a minorias sociais nesse ambiente. “As pessoas precisam se sustentar na graduação e infelizmente os valores das bolsas ainda não são suficientes”.

Helena Nader e Marcia Castro durante conversa na Universidade de Harvard

Em outro ponto, Márcia Castro questionou sobre como lideranças científicas podem lidar com a desinformação crescente. Para Nader, essa é uma questão não trivial sobre como é possível falar, de forma simples e direta, com a população. “A seca histórica que o Brasil vive, as enchentes que afetaram o sul brasileiro e que hoje afetam o estado da Georgia nos EUA, tudo isso aconteceu enquanto alguns negam as mudanças climáticas. É por isso que precisamos criar um canal de diálogo com as pessoas. Quando perguntamos ao público sobre o que é a ciência ou o nome de um cientista, muitos não sabem responder. Precisamos mostrar que seus celulares, seus remédios e quase tudo que usam é fruto da ciência”, respondeu.

Castro perguntou também sobre como foi liderar o S20, o grupo que reúne as academias nacionais de ciência do G20, para produzir recomendações aos chefes de Estado. “Em setembro, a Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou o Pacto para o Futuro, um acordo para que os países membros voltassem a cumprir um acordo anterior, a Agenda 2030. Estou cansada de acordos não cumpridos, o que você espera da Cúpula do G20 em novembro para que este não seja mais um?”, indagou.

Nader explicou que o S20 foi organizado em torno de cinco grupos de trabalho com os temas Inteligência Artificial, Bioeconomia, Transição Energética, Saúde e Justiça Social. O documento final foi aprovado por 19 dos 20 países do bloco.

“Espero que levem a justiça social em consideração, senão não iremos sobreviver. Quando falo em justiça social, há diversas ‘justiças’ para levar em consideração, como a climática. Se não fizermos nada com relação à temperatura, teremos migrações em massa e mais guerras surgirão. Nossos governos não estão prestando atenção no que a ciência diz”, lamentou a presidente da ABC.

Assista à conversa completa:

Estudando os ‘fagócitos profissionais’

A bióloga Larissa Dias da Cunha, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto e nova afiliada da Academia Brasileira de Ciências (ABC), sempre cultivou o gosto pela leitura e pelo aprendizado, e hoje é entusiasta da ideia de fazer ciência no Brasil, mesmo com todos os percalços e a gangorra no financiamento.

Nascida e criada em Brasília, Larissa é a mais velha das três filhas de Alice e Fernando. Apesar de adorar atividades ao ar livre, ela própria se descreve como uma “rata de biblioteca”, ambiente onde adquiriu o amor pelos livros que só cresce. A origem na capital federal é simbólico para alguém cuja família é composta por pessoas do norte ao sul do país, diversidade cultural que ela muito se orgulha e faz questão de destacar.

Mas apesar de ser bióloga, suas matérias favoritas na escola eram as que envolviam matemática, e não tinha aptidão especial pelas ciências da vida. Isso mudou apenas no ano do vestibular, graças às excursões que fazia com o colégio à Universidade de Brasília. “O pouco do que eu havia visto do Instituto de Ciências Biológicas e do trabalho dos pesquisadores me fascinou. Lembro-me particularmente de uma visita ao laboratório de Biologia Molecular e do entusiasmo ao sair de lá”, conta.

Após essa experiência, a jovem não teve dúvida e optou por ingressar no curso de Ciências Biológicas da UnB. Lá ela começou a fazer iniciação científica ainda no primeiro período, no Laboratório de Microscopia Eletrônica, após explorar as complexidades das células num microscópio de transmissão. “Uma simples estratégia didática, que era usada para estimular o interesse dos alunos ingressantes, despertou minha vontade de integrar o laboratório e explorar essa ferramenta incrível”, lembra.

Foi no laboratório onde Larissa conheceu sua primeira orientadora, a professora Sônia Nair Báo, a quem tem como referência. “O seu engajamento em manter um laboratório produtivo, seu suporte para que os alunos se envolvessem com a comunidade científica e seu comprometimento com o fortalecimento do setor acadêmico como política pública para o país influenciam até hoje a minha vontade de fazer ciência no Brasil”, afirma a cientista.

Sua trajetória na graduação a levou direto para o doutorado na Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto, onde hoje é professora. Foi quando conheceu seu segundo orientador e outra referência na carreira, o professor Dario Zamboni. “O professor Zamboni sempre se preocupou em estimular seus orientandos a buscarem perguntas relevantes, e se dedicarem a encontrar respostas da melhor forma possível, sempre questionando nossos achados e não se contentando com conclusões parciais. Também me marcou seu comprometimento em nos oferecer as melhores oportunidades e seu entusiasmo por fazer pesquisa no Brasil”, descreve.

Após o doutorado, Larissa acumulou duas experiências de pós-doutorado, na USP e no St. Jude Children’s Research Hospital, nos Estados Unidos. Ao retornar para o Brasil, ingressou como professora na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, onde trabalha com os mecanismos de regulação e sinalização dos “fagócitos profissionais”, como macrófagos e células dendríticas, componentes do nosso sistema imunológico que reconhecem e capturam patógenos.

“Particularmente, o meu maior interesse é entender como os diferentes compartimentos intracelulares se comunicam no processo de montagem de uma resposta adequada por esses fagócitos profissionais. Uma aplicação dessa ciência é descobrir novos alvos farmacológicos para controlar o processo inflamatório, ou entender se alvos farmacológicos estabelecidos são de fato adequados”, explica.

Para a nova Acadêmica, nós somos o que pensamos e, por isso, o crescimento proporcionado por uma vida dedicada ao aprendizado e ao amadurecimento de ideias é o que a motiva todos os dias. “Na minha área, me encanta enxergar os fenômenos com técnicas incríveis, e compreender como a interação constante com diferentes organismos molda o que definimos biologicamente como ser humano”.

Ela segue apaixonada pela leitura, sobretudo de ficção contemporânea, e tomou gosto por pegar estrada para conhecer a diversidade enorme do Brasil, hábito que herdou dos pais. “Me sinto honrada com a titulação na ABC e espero participar das discussões para elaborar novas estratégias de atração de talentos para a ciência brasileira”, finaliza.

“Mulheres Cientistas: Pioneiras da Inovação e da Ciência”

Leia matéria publicada no site gov.br em 25/9:

Cinco mulheres que adentraram ao seleto grupo da ciência são destaque na Mostra “Mulheres Cientistas: Pioneiras da Inovação e da Ciência”inaugurada nesta segunda-feira (23) na Biblioteca Henrique Morize, no Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST). Das homenageadas, três são estrangeiras e duas brasileiras. Uma das organizadoras, a coordenadora Cristiane Teixeira de Oliveira, lembra que ainda hoje, no mundo, a presença feminina é inferior à masculina, embora o quantitativo do gênero feminino seja superior na maioria dos países. Mas Cristiane destaca que o Brasil rompeu uma realidade que ainda vigora até em países mais desenvolvidos: somos o terceiro no mundo em presença feminina com 49% do universo científico. Ficamos atrás apenas da Argentina e Portugal onde esta presença chega a 52%. A média mundial é de 30%.

Dentre as homenageadas estão as brasileiras Maria Laura Leite Lopes, matemática e uma das pioneiras da Academia Brasileira de Ciências (ABC), assim como a geógrafa Maria Regina Mousinho de Meis. Figuram também a francesa Marie Curie, [que foi membra correspondente da ABC], e as russas Sofya Kovalevskaya e a Peleya Kochina. “Todas desafiaram os limites e moldaram o futuro da ciência”,  diz o enunciado da exposição.

Conheça o perfil de cada homenageada:

Maria Laura Leite Lopes – A pernambucana foi a primeira mulher a se doutorar em matemática no Brasil em 1949 e uma das primeiras a se tornar membro da Academia Brasileira de Ciências (1951). Exerceu seu ofício como efetiva no Instituto de Matemática quando, em 1969, foi cassada pela ditadura militar no Brasil. Aposentada compulsoriamente, deixou o país na companhia do marido, o renomado físico [e Acadêmico] José Leite Lopes, e seguiu para a França. Lá trabalhou no Institut de Recherches sur I’Enseigmnement des Mathématiques, desenvolvendo pesquisas sobre os problemas da educação matemática. Voltou depois da Anistia, em 1979, e retornou à UFRJ. Morreu em 20/06/2013, no Rio de Janeiro, aos 96 anos.

Maria Regina Mousinho de Meis – Geógrafa brasileira e carioca, Maria Regina nasceu em 1939 e estudou no Brasil e no exterior. Em 1958 na Universidade do Brasil e em seguida ampliou os estudos no exterior: pedagogia, mineralogia, climatologia e fotointerpretação na Universidades de Paris e Lisboa (entre 1962 e 1963). Trabalhou na UFRJ entre 1968 até sua morte em 1985. Maria Regina deixou um legado ao estudo e compreensão do Quaternário Continental Brasileiro onde se destacam avanços teórico-conceituais sobre a evolução do relevo no planalto Sudeste, além dos desdobramento de sua obra feitos através da continuidade de suas ideias desenvolvidas pelos seguidores de sua escola.  continuidade de suas ideias desenvolvidas pelos seguidores de sua escola. do relevo no planalto Sudeste do Brasil, além dos desdobramentos de sua obra feitos através da continuidade de suas ideias desenvolvidas pelos seguidores de sua escola sobre o Continental Brasileiro onde se destacam avanços teórico-conceituais sobre a evolução do relevo no Planalto Sudeste do Brasil, além dos desdobramentos de sua obra feitos através da continuidade de suas ideias desenvolvidas pelos seguidores de sua escola.

Sofya Kovalevskaya – Russa com larga contribuição na matemática nas teorias das equações diferenciais parciais, analítica e mecânica. Foi a primeira mulher nomeada para a Academia de Matemática do seu país e uma das primeiras a ter cargo de professora em uma universidade no exterior, Estocolmo. Apesar de ter vivido apenas 41 anos, foi uma das mais influentes matemáticas do século XIX. Ela se distinguiu pelas contribuições para a teoria das equações diferenciais. Apesar de, ainda na infância, ter demonstrado grande talento para a matemática, precisou mudar de país, já que o curso não era aberto às mulheres. Assim, para deixar o país e estudar na Suécia, precisou assinar um falso termo de casamento com um paleontólogo.

Pelageya Kochina – A mulher que viveu cem anos (1899 a 1999) dedicou a vida à matemática. Conhecida por seu trabalho em mecânica dos fluidos e hidrodinâmica, particularmente a aplicação das equações de Fuchs (referência ao matemático Lazarus Fuchs), foi eleita membro correspondente da Academia de Ciências da União Soviética (URSS) em 1946. Neste período, pós guerra, preparou palestras e seguiu no ensino da matemática aplicada. Mais tarde chefiou o Departamento de Mecânica Teórica – cargo até então restrito aos homens – e assumiu a direção do Departamento de Hidrodinâmica Aplicada do Instituto de Hidrodinâmica.  Foi uma das fundadoras da então chamada Academia de Ciências da União Soviética.

Marie Curie – Primeira cientista a arrebatar dois prêmios Nobel em áreas distintas: física e química.  Polonesa naturalizada francesa, ela é orgulho da ciência nos dois países. Em 1903 conquistou o Nobel de Física, feito que repetiria em 1911, agora com o Nobel de Química. Descobriu os elementos químicos polônio e rádio. A singularidade da carreira científica abriu as portas para que se tornasse também a primeira mulher a lecionar na Sorbonne. Sua trajetória para a pesquisa científica começou ainda nos primeiros anos de estudo: nascida em 1867, em 1893 graduou-se em física e em 1894, matemática. Foi a primeira colocada no exame para o mestrado em física e no ano seguinte, matemática. Tornou-se amiga de Einstein, com quem se correspondia frequentemente para discutir temas científicos dos mais complexos.

Saiba tudo sobre o Simpósio e Diplomação dos Membros Afiliados da ABC Região NE & ES 2024-2028

A Academia Brasileira de Ciências promoveu o Simpósio e Diplomação dos Membros Afiliados da ABC da Regional Nordeste e Espírito Santo 2024-2028 em Salvador, no Senai-Cimatec, no dia 23 de agosto, 6ª feira. No dia anterior, a ABC realizou, no mesmo local, sua primeira reunião de diretoria na história fora do Rio de Janeiro.

Na ocasião, apresentaram suas pesquisas, pelas quais foram eleitos, e receberão seus diplomas cinco cientistas de excelência, professores universitários dos estados de Alagoas, Bahia, Ceará, e Pernambuco. São eles Anielle Christine Almeida Silva (UFAL, Ciências Físicas), Bruna Aparecida Souza Machado (Senai/FIEB, Ciências da Saúde), Bruno Solano de Freitas Souza (Fiocruz, Ciências Biomédicas), Enelise Katia Piovesan (UFPE, Ciências da Terra) e Yuri Gomes Lima (UFC, Ciências Matemáticas). Eles foram eleitos no final de 2023, empossados automaticamente em 1o de janeiro de 2024 e cumprirão o mandato entre os anos de 2024 e 2028.

Abertura

A sessão de abertura teve a mesa composta pela presidente da ABC, Helena Nader; o vice presidente da ABC, Jailson de Andrade; e a vice-reitora do Centro Universitário Senac-Cimatec, Josiane Barbosa.

A professora Josiane Barbosa, anfitriã do evento, afirmou ser este um “momento emblemático” para o Senai Cimatec. Ela, que também é afiliada da ABC, deu as boas-vindas aos novos colegas. “Já tive a oportunidade de estar desse outro lado e sei o quanto é importante para nós, jovens cientistas”.

O professor Jailson Bittencourt de Andrade destacou a importância do programa de afiliados e contrastou a ocasião com a última vez que Salvador recebeu a cerimônia. “Já ocorreu na antiga Faculdade de Medicina da Bahia, foi um momento muito histórico em que se olhou para o passado e o presente. Hoje ocorre aqui no Cimatec, uma instituição extremamente jovem, que olha para o futuro”, destacou.

Por último, a professora Helena Nader defendeu que o Brasil precisa dar destaque aos seus casos de sucesso, e o Senai Cimatec é um deles. “É um modelo que deve ser replicado no país e um exemplo de como uma gestão organizada pode servir inovação voltada para a sociedade”, afirmou.

Durante o evento foi assinado uma acordo de cooperação entre a ABC e o Senai-Cimatec. Conheça o escopo da parceria

A mesa de abertura da cerimônia contou com Jailson Bittencourt, vice-presidente da ABC, Josiane Barbosa, vice-reitora do Senai Cimatec e Helena Nader, presidente da ABC.

Os desafios de construir uma agenda para CT&I pós 5ª CNCTI

Anderson Gomes

Em seguida o Acadêmico convidado Anderson Gomes falou sobre o evento que coordenou, a 5ª Conferência Nacional de Ciência Tecnologia & Inovação, e sua expectativa para as recomendações que deverão balizar a próxima estratégia nacional para o setor.

“Tivemos um pico de financiamento após tempos sombrios, a comunidade cientifica foi fundamental na luta, mas precisamos manter. Traçamos como metas chegar a 1,6% de investimento em relação ao PIB até 2028, e 2,5% até 2035. Precisamos subir nos rankings globais de ciência e inovação, não tenho dúvida de que somos capazes”, afirmou.

Os novos membros afiliados, então, começaram suas apresentações. O matemático Yuri Gomes Lima (UFC) falou sobre “Codificação do caos e suas consequências estatísticas” e a apresentação da física Anielle Christine Almeida Silva (UFAL) intitulou-se Explorando o invisível: Como a física está moldando os materiais do futuro”.

Conheça os novos membros afiliados e entenda suas pesquisas nos perfis a seguir.


Estudando os sistemas dinâmicos

Professor da Universidade Federal do Ceará, Yuri Gomes Lima aplica a matemática em sistemas climáticos, de grupos de pessoas ou de mudanças populacionais ao longo do tempo.

 

 


Desenvolvendo novos materiais nanoestruturados

Professora do Instituto de Física da Universidade Federal de Alagoas, Anielle Almeida Silva busca compreender e ajustar propriedades naturais de nanomateriais com vistas a aplicações biotecnológicas.

 

 


Elisa Reis

Ciência como vocação e ciência como profissão

A Acadêmica Elisa Reis, socióloga, foi também palestrante convidada, com o tema “Ciência como vocação e ciência como profissão”.

Elisa abriu citando Max Weber, segundo o qual “a ciência tem o dom da eterna juventude”. Para ela, trazer as novas gerações é manter vivo esse aspecto da prática. Outra característica do pensamento científico, a racionalidade, que permite o avanço contínuo, é também um risco. “Se não a tomarmos como relativa, ela pode tornar-se inquestionável. Tornar a ciência absoluta é grave, inclusive politicamente”, afirmou.

Um dos avanços no sentido da racionalidade foi a burocratização, algo que preocupava Weber. Mas foi isso que permitiu tornar a ciência uma profissão, deixando de ser restrita a aristocratas. A profissionalização permitiu também a especialização. “Esse processo aconteceu de uma forma que não dá mais para pensar numa ciência que não dialoga entre as especializações, sobretudo se quisermos resolver as grandes questões da atualidade”.

Em seguida, outros três novos membros afiliados fizeram as suas apresentações.

A apresentação da geóloga Enelise Katia Piovesan (UFPE) chamava-seO sertão já foi mar? Desvendando o passado através dos fósseis”. O médico Bruno Solano de Freitas Souza (Fiocruz) falou sobre que esperar após a aprovação da primeira terapia de edição gênica com CRISPR/Cas9 e a farmacêutica Bruna Aparecida Souza Machado (Senai-Fieb) tratou do tema “Vacinas de RNA e sistemas de delivery: Uma jornada de ciência e inovação”.

Saiba mais sobre a trajetória e as pesquisas desses jovens membros da ABC a seguir.


Reconstruindo ambientes do passado e ajudando na extração de petróleo

A geóloga Enelise Piovesan é professora da Universidade Federal de Pernambuco, onde se dedica ao estudo de microfósseis que ajudam a contar como evoluiu a vida no nosso planeta ao longo de mais de 4 bilhões de anos.

 

 


Construindo pontes entre a ciência básica e aplicações clínicas

Médico da Fiocruz da Bahia e do IDOR, Bruno Solano de Freitas Souza faz pesquisa clínica e translacional nas áreas de terapia celular, medicina regenerativa, edição gênica, CRISPR/Cas9 e estudos de biomarcadores.

 

 


Focando em vacinas de RNA e nanocarreadores lipídicos

A farmacêutica e professora do Senai Cimatec Bruna Aparecida Souza Machado desenvolve produtos farmacêuticos, como vacinas e medicamentos, desde as etapas iniciais do desenvolvimento e caracterização em laboratório até os estudos em humanos.

 

 


Diplomação

Após as duas palestras, foi chamado à mesa o reitor do Senai Cimatec, Leone Andrade, que falou da trajetória da instituição para conseguir criar um curso superior em tecnologia, e que atualmente vem trabalhando para se tornar uma universidade, incluindo pós-graduação stricto sensu. “Ter a ABC aqui hoje é um reconhecimento a toda essa jornada”.

Por fim, foi realizada a cerimônia de entrega dos diplomas. O ex-afiliado Luis Gustavo Carvalho Pacheco (UFBA, período 2018-2022) fez a saudação aos novos membros afiliados, destacando as portas que são abertas após a titulação. Ele recordou uma fala do filósofo Jorge Larrosa durante palestra na Reunião Magna da ABC de 2023. Na ocasião, o palestrante afirmou que “a educação é o ponto em que decidimos se amamos tanto o mundo a ponto de tomarmos responsabilidade por ele”.

“Concluí dessa fala que fazer ciência de qualidade é uma forma de amar o mundo, é tomar para si as dores do mundo e dedicar sua vida à solucioná-las. Então, novos afiliados, continuem amando o mundo com as suas pesquisas e nos brindem nesse período com a sua excelência. Sejam bem-vindos à Academia Brasileira de Ciências”, recepcionou.

Bruna Machado agradeceu em nome dos novos afiliados. Ela afirmou que a diplomação é um reconhecimento não só das trajetórias, mas também das instituições e das redes de colaborações de cada cientista.

“Queremos, junto com a ABC, continuar na luta pela estruturação de um ecossistema mais favorável e igualitário para desenvolver ciência no Brasil. Reconhecemos a força da nossa comunidade científica e esperamos contribuir de forma interdisciplinar e dentro das nossas áreas de atuação com vistas à promover os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável”, afirmou.

Na mesa da diplomação, Jailson Andrade, o reitor do Senai-Cimatec Leone Andrade e Helena Nader

Assista à cerimônia:

Desenvolvendo materiais nanoestruturados

Anielle Christine Almeida Silva nasceu no ano de 1989, em Uberaba, no estado de Minas Gerais. Dois anos depois, o pai foi redistribuído para Uberlândia, cidade no mesmo estado, onde ela morou até 2018. Sua infância foi marcada por um ambiente muito positivo e por um forte estímulo ao estudo, sempre sustentada pelo amor e apoio incondicional da família. O pai era maquinista na ferrovia em Uberlândia e a mãe optou por trabalhar em casa, como contadora, para se dedicar ao cuidado da filha, enquanto o pai trabalhava fora e viajava frequentemente. Depois, veio um irmão oito anos mais novo, que cursou engenharia elétrica na Universidade Federal de Uberlândia (UFU).

Quando Anielle cursou o ensino médio, sua mãe se dedicou a trabalhos extras como bordadeira para aumentar a renda familiar. Ao longo de sua graduação, liberou a filha das tarefas domésticas para que ela se concentrasse exclusivamente nos estudos e cultivou seu apreço pela música clássica, mantendo-a no Conservatório para o estudo de instrumentos. O pai a ajudava nas atividades de matemática e a incentivava a buscar ajuda nas monitorias quando encontrava dificuldades nas disciplinas. “Ambos afirmavam que eu poderia aprender qualquer coisa com o devido foco e persistência. Me ensinaram valores fundamentais como humildade, disciplina, respeito, compromisso e lealdade”, recorda a Acadêmica.

Anielle fez o ensino fundamental em uma escola estadual. No ensino médio, a mãe a incentivou a buscar bolsas de estudo em escolas particulares, dada a limitação financeira da família para arcar com a mensalidade. Assim, conseguiu obter um desconto e o pai pagou apenas o material escolar no Colégio Anglo durante o primeiro ano do ensino médio. Devido ao bom desempenho acadêmico da menina na escola estadual, Anielle foi alocada no curso integrado, que oferecia um nível mais avançado. “Na minha sala, eu era a única aluna oriunda da escola pública. Enfrentei dificuldades significativas em física e química, mas procurava esclarecer dúvidas com professores e colegas durante os intervalos e participava de todas as monitorias para compreender melhor o conteúdo e obter boas notas. Em matemática, participei de uma turma preparatória para escolas militares durante todo o ensino médio, organizada gratuitamente pelo professor Décio, cuja habilidade em explicar matemática de forma simples e envolvente era notável. Ele sempre incentivava os alunos a atingirem seu máximo potencial”, contou a pesquisadora.

Seus professores desse segmento incentivavam o engajamento dos alunos com a ciência, promovendo discussões sobre pesquisas científicas e destacando tópicos intrigantes em sala de aula. “Eles também nos incentivavam a ler regularmente revistas como ‘Superinteressante’ e ‘National Geographic’, disponíveis na biblioteca da escola. Nas feiras de ciências, os docentes convidavam professores universitários para ministrar palestras sobre suas áreas de pesquisa, que mostravam uma visão prática e inspiradora do ambiente acadêmico. “No primeiro ano, o professor de física, Lênio, despertou meu interesse pela física. Embora eu tivesse facilidade com matemática, tinha dificuldades em visualizar a beleza da física, algo que ele enfatizava em suas aulas. Hoje, reconheço a profundidade dessa disciplina e sou fascinada por ela”, relatou Anielle Almeida.

 

 

Na fase de escolha de carreira, Anielle conta que considerou a engenharia química no Instituto Militar de Engenharia como primeira opção. Paralelamente, frequentava o Conservatório Estadual de Música Cora Pavan Capparelli e tinha interesse nas disciplinas de musicoterapia e criatividade. Diversos professores explicavam a interseção entre música e aprendizado, o que despertou seu interesse em neurologia, apesar do desinteresse pela área hospitalar. Tendo como prioridade, porém, o ingresso numa universidade federal e tendo a UFU como a opção mais próxima, ela estudou as opções na revista de cursos da universidade e frequentou diversas feiras de profissões. Avaliou que o curso que mais se alinhava aos seus interesses era o de física de materiais, que envolvia o desenvolvimento de novos materiais tecnológicos para diversas aplicações, e o escolheu.

Ao ingressar na graduação, atuou como voluntária sob a supervisão do professor Alexandre Marleta na área de polímeros e, posteriormente, integrou o grupo de pesquisa do professor Noelio Dantas, no estudo de cristais e sistemas vítreos, com quem

trabalhou posteriormente no desenvolvimento de pontos quânticos em sistemas coloidais. Sua paixão pela parte experimental a levou a realizar diversos cursos e treinamentos adicionais no Instituto de Química da UFU, onde aprofundou seus conhecimentos sobre a fabricação e caracterização de materiais, abordando o tema tanto sob a perspectiva química quanto física. Durante o curso, Anielle conta que aprendeu com professores pelos quais desenvolveu grande admiração, como José Cândido Xavier, Tomé Mauro Schmidt, José Maria Villas Bôas, Liliana Sanz de la Torre e Roberto Hiroki Miwa, que mostravam a beleza da física através da matemática.

A graduanda não enfrentava dificuldades nos cálculos, demonstrando facilidade nas disciplinas teóricas, ao mesmo tempo em que se dedicava intensamente à pesquisa experimental. Com um rendimento acadêmico superior a nove e conciliando bem os estudos com a pesquisa, foi incentivada a ingressar diretamente no doutorado. Na época, seu orientador, Noelio Dantas, fazia parte de uma rede de nanobiotecnologia, e o projeto que ela desenvolvia na graduação estava alinhado com essa linha de pesquisa. Com seu apoio, participou do processo seletivo e conseguiu ingressar no doutorado direto, ao longo do qual cursou as disciplinas do mestrado e do doutorado, dando continuidade ao projeto iniciado na iniciação científica.

Sua afinidade com a física teórica levou seu orientador a sugerir uma modificação teórica no Modelo de Confinamento de Fônons em Espectroscopia Raman, aplicável a estruturas núcleo/casca. “Assim, trabalhei na modificação do modelo teórico e na fabricação e conjugação de pontos quânticos núcleo/casca de CdSe/CdS, com vistas a aplicações biotecnológicas. Para a parte teórica, contei com a colaboração de um professor do Departamento de Matemática da UFU, enquanto o professor Luiz Ricardo Goulart me apoiou nas aplicações biotecnológicas”, contou Anielle.

O aspecto mais desafiador do doutorado, segundo a cientista, foi a incursão na área de biotecnologia, que difere significativamente da física em termos de controle experimental. “Na biologia, muitos experimentos dependem de fatores alheios ao controle direto do pesquisador, o que pode gerar frustrações. No entanto, essa experiência foi enriquecedora e ampliou minha compreensão sobre a importância da colaboração interdisciplinar, além de reafirmar minha paixão pela física, que permeia todas as áreas do conhecimento”, declarou.

Após concluir o doutorado, Anielle Almeida Silva realizou um estágio de pós-doutorado no mesmo grupo de pesquisa, focando em outros materiais, como os magnéticos e a dopagem de semicondutores, e foi professora efetiva no Instituto de Física da UFU. “Minha área de pesquisa é voltada para o desenvolvimento de novos materiais nanoestruturados, com o objetivo de compreender e ajustar suas propriedades físicas, químicas e biológicas. Por exemplo, investigo como um nanomaterial pode ser projetado para apresentar luminescência, propriedades bactericidas, biocompatibilidade e, simultaneamente, atuar como carreador de fármacos. Além disso, busco otimizar propriedades específicas, como a atividade antitumoral, por meio de manipulações controladas durante a síntese do material. Para aprofundar a compreensão desses processos, aplico modelos teóricos físicos que elucidam os mecanismos subjacentes ao comportamento dos nanomateriais”, explicou a pesquisadora.

A possibilidade que a ciência oferece de se replicar aspectos da natureza em um ambiente controlado de laboratório, permitindo uma compreensão aprofundada dos mecanismos que regem os fenômenos naturais, é o que mais fascina Anielle Silva em sua carreira. Na sua área, o que a atrai é a possibilidade de ajustar e otimizar propriedades específicas dos materiais de interesse, com o objetivo de desenvolver metodologias que possam ser aplicadas em uma escala industrial.” Isso não apenas impulsiona o avanço dos setores tecnológicos, mas também tem o potencial de melhorar a qualidade de vida da população, contribuindo para o desenvolvimento sustentável do país”, apontou.

Nesse sentido, a física recebeu o título de membro afiliado da Academia Brasileira de Ciências (ABC) como uma honra enorme, pois reconhece o trabalho que ela vem desenvolvendo na área científica e, segundo ela, “é como ser chamada para fazer parte de um time de cientistas que trabalham juntos para melhorar a ciência no Brasil”. Integrando a ABC, Anielle quer ajudar a ciência a crescer e a fazer a diferença no dia a dia das pessoas. “Pretendo participar de projetos que tragam soluções para problemas que afetam a sociedade e incentivar mais jovens a se interessarem pela ciência. Quero também colaborar para que o conhecimento científico chegue a todos de uma forma mais clara e acessível, mostrando como ele pode melhorar nossas vidas”, considerou.

E falando de qualidade de vida, Anielle comenta seus interesses pessoais além da ciência. “Sou apaixonada por música instrumental, jazz e blues, e toco piano, bateria e flauta, o que me proporciona grande satisfação. Tenho um profundo interesse por livros científicos e filmes de ação e ciência, que complementam meu amor pelo conhecimento e pela descoberta. Viajar e explorar novos lugares são minhas atividades favoritas e aprecio a experiência de visitar restaurantes e ambientes esteticamente agradáveis. Sou eclética em minhas preferências, gosto tanto da praia como do campo, aprecio tanto o calor quanto o frio. Faço exercícios físicos e meditação. Enfim, gosto de me adaptar a diferentes experiências e ambientes”, concluiu a Acadêmica.

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