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Paulo Artaxo: o papel do Brasil nas mudanças climáticas

Acadêmico Paulo Artaxo durante a 74ª Reunião Anual da SBPC (Foto: Jardel Rodrigues/SBPC).

“As mudanças climáticas são inequívocas e só temos uma breve janela de oportunidade para garantir um futuro habitável”. Foi com essa mensagem que o membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC) Paulo Artaxo iniciou sua conferência Mudanças Climáticas, seus Impactos no Brasil e a Construção de uma Sociedade Sustentável, no segundo dia da 74ª Reunião Anual da SBPC, sediada na Universidade de Brasília (UnB). Artaxo foi apresentado pelo também Acadêmico Ricardo Galvão, que ganhou notoriedade por sua defesa da independência científica contra ataques do governo federal quando era diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). 

O cenário atual 

Apesar de a ciência já alertar para a alteração do clima há mais de 50 anos – ou mais de 100 anos, se considerarmos os trabalhos do sueco Svante Arrhenius, que em 1896 já indicavam que o mundo poderia se aquecer em até 5°C –, quase nada de concreto foi feito. Mesmo com o Acordo de Paris e a redução das atividades humanas durante a pandemia, o mais recente relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) mostra que as emissões de gases do efeito estufa (GEE) continuam aumentando a uma taxa de 4% ao ano. “A menos que zeremos muito rapidamente as emissões, limitar o aquecimento a 2°C será impossível”, lamentou Artaxo, que disse já considerar metas abaixo dos 1,5°C como irrealistas no presente cenário. 

Segundo o Acadêmico, que participou da elaboração do relatório, o mundo caminha para ficar em média 3,2°C mais quente, isso se cumprir com o acordado na COP-26. “Mas esse é um cenário otimista”, lembrou. “O caminho atual está nos levando a um aquecimento entre 3,7°C e 4,3°C, em média, comparado com antes da revolução industrial”. É importante lembrar que uma elevação de 3,2 °C global significa um aumento de 4,2°C nos continentes e de 5,6°C nas grandes cidades. “O mundo se tornará um lugar pior para se viver”, resumiu Artaxo. 

Crescimento exponencial dos principais gases do efeito estufa nos últimos três séculos.

Brasil e as mudanças climáticas 

Atualmente, o Brasil é o sexto país que mais emite gases do efeito estufa e o quarto maior emissor histórico. Por ser tropical, os efeitos do aquecimento tendem a se exacerbar, com graves consequências sociais e econômicas. As hidrelétricas brasileiras podem ser severamente afetadas pela alteração na dinâmica das chuvas e o aumento das secas e o ressecamento do solo representam uma grave ameaça ao agronegócio. Além disso, algumas regiões podem sofrer de forma ainda mais intensa. “O semiárido nordestino pode se tornar árido”, afirmou Artaxo. “Imaginem a crise migratória que isso geraria”.

Outro problema está na Amazônia. Com o aumento da temperatura e a queda na precipitação, algumas regiões ao leste da floresta já estão deixando de ser sumidouros de carbono para se tornarem fontes de emissão, e o bioma corre o risco de entrar num ciclo vicioso de degradação. 

A floresta é ponto chave da questão climática, e, nas palavras do Acadêmico, “nossa maior responsabilidade no momento”. Estima-se que 44% das emissões brasileiras venham do desmatamento, que já atinge quase 20% da área total amazônica. Na COP-26, o país se comprometeu a zerar a derrubada até 2028 e Artaxo garante que, com governança séria e empenhada, essa meta é absolutamente factível. “Nenhum outro país no mundo tem potencial para reduzir tanto suas emissões em tão pouco tempo e com enormes benefícios ambientais”, apontou. 

Manter a floresta em pé é uma enorme vantagem estratégica brasileira, que pode gerar inclusive ganhos econômicos através do mercado de carbono. O potencial energético eólico e solar, sobretudo do Nordeste, é outra capacidade ainda pouco explorada. O preço dessas tecnologias caiu exponencialmente nas últimas décadas, e países com menores incidências de luz solar e ventos já estão à frente do Brasil nessa área. “Não é mais uma questão econômica ou tecnológica, mas de vontade política”, alertou o Acadêmico. 

Evolução do desmatamento brasileiro desde 1977. Redução na primeira década do milênio mostra que um outro caminho é possível.

Eventos climáticos extremos 

Nas últimas semanas, o mundo vem acompanhando os efeitos de uma onda de calor extremo que atinge a Europa, causando incêndios de grande extensão na Espanha e um número extraordinário de mortes na Inglaterra. Tragédias como essa estão se tornando cada vez mais comuns no mundo inteiro e estão diretamente relacionadas ao aquecimento do planeta. “Dado um aumento de 4°C na temperatura continental, estima-se que eventos climáticos extremos se tornem trinta e nove vezes mais frequentes e cinco vezes mais intensos”, alertou Artaxo. 

Populações de baixa renda são historicamente mais afetadas por esse problema, o que gera uma cruel contradição. Enquanto os 10% mais ricos são responsáveis por metade das emissões de efeito estufa, os 50% mais pobres respondem por apenas 10% das emissões. “Não podemos aceitar que quem não causou o problema pague o preço”, resumiu o Acadêmico. 

Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável  

Para Artaxo, o principal objetivo do planeta a curto prazo deve ser o cumprimento dos 17 Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS), estabelecidos pela ONU para guiar os esforços de construção do futuro. O combate às mudanças climáticas é o objetivo número 13, mas as ações necessárias perpassam todos os outros, desde a erradicação da pobreza até a redução das desigualdades e a garantia de direitos básicos para todas as pessoas.  

O Acadêmico alerta que a sociedade humana precisa passar por seis grandes transformações: transição para um consumo sustentável, expansão do acesso às tecnologias digitais, descarbonização da energia, planejamento de cidades sustentáveis, equilíbrio entre produção de alimentos e uso de terras e universalização do acesso à educação e capacitação humana. “A ciência vem cumprindo seu papel, que é encontrar pontes entre as necessidades básicas da humanidade e os limites do planeta”, finalizou. 


Confira todas as matérias da ABC sobre a 74ª Reunião Anual da SBPC

Segunda mesa de Webinário ABC/CNPq abordou Sustentabilidade

Na última terça-feira, 7 de junho, aconteceu a segunda edição dos “Webinários ABC/CNPq: A Contribuição dos INCTs para a Sociedade”, que trouxe representantes de diferentes Institutos Nacionais de Ciência, Tecnologia e Inovação (INCTs) para debater em duas mesas com temáticas transversais. A moderação ficou a cargo da diretora de Cooperação Institucional do CNPq, Maria Zaira Turchi.

A segunda sessão abordou “Sustentabilidade do Planeta: Terra, Mar e Ar”, e teve a participação dos membros titulares da ABC José Antonio Marengo Orsini, coordenador do INCT para Mudanças Climáticas (INCT – MC); Jefferson Cardia Simões,  coordenador do INCT da Criosfera; e Maria Fátima Grossi de Sá, coordenadora do INCT de Ativos Biotecnológicos Aplicados à Seca e Pragas em Culturas Relevantes para o Agronegócio (INCT PlantStress Biotech).

José Marengo

Mudanças Climáticas e o futuro do Brasil

O webinário ocorreu dois dias após o Dia Mundial do Meio Ambiente, 5 de junho, que nesse ano trouxe o lema “Uma só Terra”. Marengo fez questão de iniciar sua apresentação com a mensagem central trazida pela data: “A sociedade precisa incluir o capital natural na tomada de decisões, eliminar subsídios prejudiciais ao meio ambiente e investir na transição para um futuro sustentável”.

Em seguida, apresentou as temáticas abordadas pelo INCT para Mudanças Climáticas. Dentre elas está a segurança alimentar, que, no Brasil, enfrenta sérios riscos com os aumentos na temperatura. Simulações de produção, levando em conta diferentes cenários e modelos climáticos, apontam para um futuro de perdas e até de reorientação da geografia agrícola do país. Outro ponto que tange a agricultura e as mudanças climáticas é a perda ecossistêmica, sobretudo na Amazônia e no Cerrado. “O leste da Amazônia já se tornou uma fonte de emissões, quando sempre foi um importante sumidouro de carbono”, alertou Marengo.

Além de coordenar o INCT para Mudanças Climáticas, José Marengo atua também no Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Nacionais (Cemaden), o que traz uma ideia sobre a forte interseção entre os dois temas. Enquanto eventos climáticos extremos se tornam cada vez mais frequentes e intensos, os valores autorizados no orçamento federal para enfrentamento de desastres tiveram uma queda de R$ 6.542 milhões em 2013 para 1.204 milhões em 2022, de acordo com dados do Sistema Integrado de Informações sobre Desastres (S2ID). “A projeção para um aquecimento de 4°C é de que desastres ambientais se espalhem para além das Regiões Sudeste e Sul, que historicamente são mais afetada por esses fenômenos”, finalizou.

Jefferson Simões

O Brasil e a Criosfera

Jefferson Simões dedicou sua apresentação a desfazer o mito de que o que ocorre nos pólos não afeta os trópicos. A criosfera ocupa 10% da superfície do planeta e tem papel crucial no sistema climático de todo o globo. No Brasil, massas polares da Antártica causam frentes frias e ciclones extratropicais e o próprio continente gelado é afetado por poluentes e materiais orgânicos oriundos de queimadas que são carregados pelo vento. Outra consequência bastante drástica para o país é o aumento do nível do mar. Estimativas apontam que o derretimento de geleiras e a expansão térmica dos oceanos pode levar a uma elevação de 1,1 metro até 2100, com graves consequências para o litoral brasileiro.

Outra interação pouco falada ocorre entre as geleiras andinas e a Amazônia. Cerca de 90% do armazenamento hídrico dessas formações é dependente da evaporação da floresta, e sua devastação só faz diminuir esse aporte. Nos últimos 40 anos as geleiras andinas perderam entre 20% e 30% de sua área original, gerando estresses hídricos em países como Bolívia e Peru. “Mais recentemente, constatamos também que o material das queimadas amazônicas vem alterando a cor dessas geleiras, gerando maior absorção de calor e acelerando seu derretimento”, alertou Simões.

Mas as pesquisas em criosfera não se dedicam apenas às consequências das mudanças climáticas. Algumas correntes de estudo se dedicam a bioprospecção, isto é, a procura de espécies adaptadas à vida em ambientes extremos que podem conter novas substâncias bioativas com diversas aplicações. No caso particular da Antártica, manter um esforço de pesquisa contínuo é também uma estratégia política, visto que o Tratado Antártico determina que nações que queiram estabelecer presença permanente a façam por meio de expedições científicas. “O Brasil integra o Comitê Científico em Pesquisas Antárticas, nossa presença no continente é um dos exemplos mais concretos de diplomacia científica na atualidade”, argumentou.

Maria Fátima Grossi de Sá

Biotecnologia e Agricultura

A Acadêmica Maria Fátima Grossi de Sá é atualmente presidente da Sociedade Brasileira de Biotecnologia (SBBiotec) e iniciou sua apresentação trazendo algumas informações sobre o futuro da agropecuária no mundo. De acordo com dados de 2009 da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), a produção mundial de alimentos precisa aumentar em 70% até 2050 para garantir segurança alimentar para todos. O Brasil, como um dos maiores produtores do mundo, é indispensável para o cumprimento dessa meta, mas esse aumento precisa ser feito de forma sustentável no longo prazo.

Ainda de acordo com a FAO, o país é o terceiro maior usuário de pesticidas poluentes no planeta, cuja aplicação não controlada pode colocar em risco o uso continuado do solo. Para melhorar esse cenário, urge que se desenvolvam técnicas alternativas, que passam pelo uso de compostos naturais para o controle de pragas e desenvolvimento de linhagens mais resistentes de cultivares. “Zonas tropicais são, historicamente, as mais desafiadoras para a agricultura, e o Brasil precisará estar sempre inovando em biotecnologia se quiser atingir todo seu potencial produtivo”, avaliou Grossi.

Como exemplo de institutos atuando nesse sentido, a palestrante citou o INCT do Café, que vem produzindo melhoramentos genéticos em linhagens de Coffea canephora, além de desenvolver usos alternativos para os resíduos da produção; o INCT de Genômica para Melhoramento de Citros, que desenvolve inovações e também auxilia agricultores desse que é um dos maiores nichos da produção agrícola brasileira; e o próprio INCT PlantStress Biotech, coordenado pela palestrante, que foca em três commodities cruciais do agro brasileiro – algodão, milho e soja – para promover melhoramentos contra pragas e secas. “Atualmente, contamos com 18 instituições e mais de 100 pesquisadores que atuam em toda a cadeia de pesquisa, desde a descoberta de compostos promissores até a geração de produtos e fenotipagem”, finalizou a Acadêmica.


Leia tudo sobre a primeira sessão do webinário, sobre “Desigualdade e Democracia” e acesse a gravação completa

IAP publica relatório global sobre Mudanças Climáticas e Saúde

As mudanças climáticas ameaçam a saúde de bilhões de pessoas, especialmente aquelas que já são mais vulneráveis. Entretanto, muitas estratégias para reduzir as emissões de gases de efeito estufa podem melhorar a saúde no curto prazo. O novo relatório ‘Saúde na emergência climática – uma perspectiva global’, lançado hoje, 25 de maio, pela Parceria InterAcademias (IAP), examina como a crise climática está afetando a saúde em todo o mundo e pede ação urgente.

Durante três anos, a IAP trabalhou em conjunto com suas redes regionais na África (Nasac), Ásia (Aassa), Américas (Ianas) e Europa (Easac) para analisar as evidências de cada região e compreender melhor quais os efeitos mais drásticos das mudanças climáticas em nível global, nacional e local. Uma equipe de mais de 80 cientistas do mundo inteiro contribuiu para o projeto. O relatório oferece uma revisão global do conhecimento científico atual e examina os efeitos diretos e indiretos das mudanças climáticas na saúde humana, entre eles:

  • Aumento da mortalidade e comorbidades relacionadas ao calor
  • Aumento de eventos extremos como inundações e secas
  • Diminuição de colheita em algumas regiões
  • Mudanças na distribuição de doenças vetoriais
  • Aumento de incêndios florestais causando exposição generalizada à poluição do ar

As mudanças na temperatura levam a uma grande quantidade de problemas de saúde, incluindo doenças cardiovasculares e respiratórias, doenças transmitidas pela água e por alimentos, desnutrição e saúde mental. Há também um risco crescente de migração forçada com suas consequências adversas para os indivíduos afetados.

Um artigo publicado na Nature Climate Change, resumido no relatório do IAP, mostra, por exemplo, que um terço das mortes relacionadas ao calor nas últimas décadas pode ser atribuída às mudanças climáticas, de acordo com a análise de dados de mais de 700 locais em 43 países (Vicedo-Cabrera et al, 2021). Além disso, outros estudos revelaram que a exposição ao calor extremo reduz a capacidade de realizar trabalho físico, como um artigo da Lancet Planetary Health afirmando que aproximadamente um bilhão de pessoas globalmente projetadas para serem incapazes de trabalhar com segurança por parte do ano (mesmo à sombra) após um aumento na temperatura global de cerca de 2,5°C acima do pré-industrial (Andrews et al, 2018).

“Muitas políticas e ações que reduzem as emissões de gases de efeito estufa também beneficiam a saúde no curto prazo, além de mitigar as mudanças climáticas”, diz Andrew Haines, professor de Mudanças Ambientais e Saúde Pública da London School of Hygiene & Tropical Medicine (LSHTM) e co-presidente do projeto IAP. Haines é o vencedor do Prêmio Tyler de Conquista Ambiental 2022 –considerado o ‘Prêmio Nobel do Meio Ambiente’.

Por exemplo, partículas finas de poluentes surgem das mesmas fontes que emitem os gases de efeito estufa. As emissões relacionadas aos combustíveis fósseis e biomassa são responsáveis por uma proporção substancial do risco de saúde da poluição ambiental. De acordo com um estudo publicado no Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), a eliminação gradual dessas fontes antropogênicas de poluição do ar deve evitar milhões de mortes prematuras em todo o mundo a cada ano (Lelieveld et al, 2019).

As mudanças climáticas já estão reduzindo a segurança alimentar e nutricional e, a menos que sejam combatidas, terão impactos cada vez maiores na desnutrição e nas mortes. O IAP destaca que promover mudanças na dieta – aumentar o consumo de frutas, verduras e legumes e reduzir a ingestão de carne vermelha, quando excessiva – pode trazer grandes benefícios à saúde e ao meio ambiente. Essas dietas permitiriam reduções significativas nas emissões de gases de efeito estufa dos sistemas de produção alimentícia, além de reduzir as demandas de uso de água e terra. Além disso, através da redução dos riscos de doenças cardíacas, AVCs outras condições, haveria grandes reduções na carga de doenças não transmissíveis.

A ação climática também poderia evitar um aumento significativo na propagação de doenças infecciosas. Por exemplo, um estudo publicado no Lancet Planetary Health estima que a população em risco de dengue e malária pode aumentar em até 4,7 bilhões de pessoas adicionais até 2070 em relação a 1970-99, particularmente em áreas baixas e urbanas (Colon-Gonzalez et al, 2021). Assim, o IAP pede o fortalecimento dos sistemas de vigilância e resposta de doenças transmissíveis que devem ser uma prioridade para melhorar a adaptação às mudanças climáticas em todo o mundo.

O relatório do IAP enfatiza que as mudanças climáticas afetam a saúde de todas as pessoas, mas o fardo não é distribuído de maneira uniforme ou justa.

“Em vez disso, recai mais fortemente sobre aqueles em condições socioeconômicas precárias e pessoas marginalizadas, e é influenciado por fatores que transversais, como estado de saúde, condições sociais, econômicas e ambientais e estruturas de governança. Os impactos das mudanças climáticas exacerbam as desigualdades e injustiças já existentes, muitas das quais fundadas no colonialismo, racismo, discriminação, opressão e subdesenvolvimento”, diz Sherilee Harper, professora associada da Universidade de Alberta, Canadá e coautora do relatório.

“Enfatizamos que os esforços de adaptação relacionados à saúde devem priorizar os povos indígenas, populações em envelhecimento, crianças, mulheres e meninas, aqueles que vivem em ambientes socioeconômicos pouco desenvolvidos e populações geograficamente vulneráveis”.

Globalmente, os grupos que são socialmente, politicamente e geograficamente excluídos correm os maiores riscos de saúde com as mudanças climáticas, mas não estão adequadamente representados na base de evidências.

“Portanto, a equidade em escala local, regional e internacional deve estar na vanguarda da pesquisa e das respostas políticas”, diz Volker ter Meulen co-presidente do projeto IAP. “A equidade está no centro das respostas eficazes.”

O relatório apela a todas as partes interessadas para que tomem medidas na construção de resiliência climática que limitem os riscos futuros. A ampla cobertura geográfica da IAP é inestimável para ajudar a comunicar as vozes daqueles – de países de baixa e média renda e populações vulneráveis ​​– que nem sempre são ouvidos durante os processos pelos quais as evidências informam a política internacional.

Lançamento de relatório global sobre mudanças climáticas e saúde

As mudanças climáticas são uma crise de saúde global. A escala, a natureza e o impacto dos efeitos adversos na saúde física e mental, por vias diretas e indiretas, variam dentro e entre as regiões. No entanto, existem desafios comuns que devem ser enfrentados por melhores soluções integradas de mitigação (redução das emissões de gases de efeito estufa) e adaptação (ajustando-se ao que não pode ser evitado).

Em um projeto global de três anos, a Parceria InterAcademias (IAP) trabalhou em conjunto com suas redes regionais na África (Nasac), Ásia (Aassa), Américas (Ianas) e Europa (Easac) para capturar a diversidade na avaliação de evidências de suas próprias regiões para informar a política de ação coletiva e personalizada nos níveis nacional, regional e global.

Nesta quarta-feira, 25 de maio, o relatório final ‘Saúde na Emergência Climática – uma perspectiva global’ será apresentado e discutido em um webinário público online, das 9:00 às 11:00 (horário de Brasília). Os palestrantes incluem cientistas de todas as regiões do mundo que contribuíram para o relatório, bem como especialistas de fora do projeto que possuem uma forte experiência no assunto.

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Mudanças climáticas vão aumentar risco de problemas de saúde

Confira a entrevista concedida para Roberta Jansen pelo Acadêmico Paulo Saldiva para o Estadão, publicada neste 12 de abril:

RIO – Enquanto as mudanças climáticas avançam cada vez mais rápido, estudos mostram que temperaturas maiores impõem riscos não só à saúde do meio ambiente, mas dos próprios seres humanos. Mortes por calor, problemas respiratórios em áreas de queimadas florestais, vírus transmitidos por mosquitos e doenças cardiovasculares são apenas alguns exemplos das ameaças que crescem nesse cenário.

Estudo publicado na revista Nature, assinado por cientistas britânicos, suíços e brasileiros, estimou que até 76% das mortes ocorridas de 1991 a 2018 em consequência do calor estão relacionadas diretamente às mudanças climáticas provocadas pelo homem. E o número tende a aumentar, como alertou o relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) das Nações Unidas (ONU). O documento divulgado em fevereiro foi o primeiro a detalhar o impacto do aquecimento na saúde humana.

“Durante muito tempo, o aquecimento global era um urso polar equilibrado na ponta de um iceberg: se fizermos tudo certo agora, vamos estabilizar o clima nos próximos 40 anos e o primeiro beneficiado será o urso”, resume Paulo Saldiva, da USP, membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e um dos maiores especialistas do país na relação entre mudanças climáticas e saúde humana.

“[O novo relatório] apresenta essa ideia de fundar a sociedade protetora do ser humano, porque as alterações acontecem dentro de um ecossistema do qual fazemos parte, com consequências imediatas para a nossa saúde.” Conforme o IPCC, ao menos 40% da população global vive em áreas “altamente vulneráveis” ao aquecimento. Como diz o relatório, toda história climática é também uma história de saúde.

(…)

Leia a entrevista completa no Estadão.

Webinário apresentará relatório da Ianas sobre mudanças climáticas e saúde nas Américas

O Programa de Mudanças Climáticas e Saúde da Parceria InterAcademias (IAP) é uma iniciativa inter-regional que busca trazer soluções de adaptação e mitigação dos efeitos das mudanças climáticas na saúde humana. A Academia Brasileira de Ciências participa do programa através do Acadêmico Paulo Saldiva.

Como representante das Américas, a Rede InterAmericana de Academias de Ciência (IANAS) ficou responsável por redigir o relatório para o continente, que será lançado oficialmente em 8 de março, das 15:00 às 17:00 (horário de Brasília), durante o webinário “Mudanças Climáticas e Saúde nas Américas”, organizado por IAP, IANAS e Royal Society do Canadá (RSC).

Uma prévia do relatório foi disponibilizada em novembro de 2021 e traz análises dos principais problemas de saúde que são agravados pelas mudanças climáticas no continente. No documento são explorados estudos de caso que contextualizam desafios e soluções para diferentes localidades. A prévia destaca também a necessidade de colaboração entre os sistemas de saúde dos países americanos e o papel crucial que o combate às desigualdades cumpre na luta contra o aquecimento global.

O evento contará com tradução simultânea apenas para inglês e espanhol.

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Simpósio discutiu efeitos das mudanças climáticas nas regiões polares

Nos dias 24 e 25 de fevereiro ocorreu o simpósio “O frio está aquecendo: Do Ártico a Antártica”, que reuniu 35 palestrantes e mais de 150 participantes, no Museu Oceanográfico de Mônaco e também online, para discutir o efeito das mudanças climáticas nas regiões polares. O evento faz parte da Iniciativa Polar, uma parceria da Fundação Príncipe Albert II de Mônaco com o Comitê Científico Internacional em Pesquisa Antártica (SCAR) e o Comitê Internacional de Ciências do Ártico (IASC) para gerar conhecimento científico sobre esses ambientes gelados.

O membro titular da Academia Brasileira de Ciências e vice-presidente do SCAR, Jefferson Simões, participou da convenção e alertou para a importância do tema num contexto de aquecimento global. “As regiões polares nos dão nossa última chance de um futuro sustentável; se falharmos lá, falharemos no resto”, sumarizou durante a abertura.

As mudanças climáticas já chegaram ao Ártico e a Antártica, afetando os ecossistemas locais e impactando o cenário global para muito além das regiões polares. O simpósio foi estruturado ao redor de quatro temáticas principais: (i) caracterização das mudanças nos polos, incluindo alterações químicas nos oceanos e degelo e perdas de biodiversidade; (ii) efeitos das mudanças polares no resto do mundo, como aumento do nível do mar e relação com eventos climáticos extremos; (iii) efeitos sociais e econômicos das mudanças polares e (iv) respostas efetivas em um contexto de incertezas.

Apesar das semelhanças geofísicas, as regiões possuem grandes diferenças histórico-sociais e de biodiversidade, o que faz necessários abordagens distintas de preservação. Em particular, foram discutidas a necessidade de se incorporar as demandas dos povos indígenas do Ártico e de se compreender o contexto geopolítico do continente Antártico. Em comum, os participantes concordaram na necessidade de maior integração entre a comunidade científica internacional e de colaboração entre cientistas, setor privado e governos para que decisões sejam tomadas em sintonia com os dados existentes para essas regiões.

O simpósio também está em linha com a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável, iniciativa da ONU que busca jogar luz na importância desses ecossistemas para o futuro do planeta.

Leia o relatório completo do simpósio, em inglês.

Derretimento polar e aumento do nível do mar: consequências diretas para países costeiros.

Em vídeo viral, meteorologista confunde conceitos e distorce informações sobre aquecimento global

O jornal Estadão convidou o climatologista Carlos Nobre e o glaciologista Jefferson Cardia Simões, ambos membros titulares da ABC, para desmentirem as falas equivocadas do meteorologista Luiz Carlos Molion, veiculadas em uma entrevista de 2010. O conteúdo tornou-se viral no Facebook 11 anos após seu lançamento, acumulando mais de 700 mil likes e disseminando conteúdo negacionista na rede social. Confira os comentários dos cientistas no trecho a seguir:

 

Uma entrevista concedida há 11 anos durante um debate sobre aquecimento global voltou a circular nas redes sociais e continua a espalhar desinformação sobre o tema. No trecho viral, que acumula quase 800 mil interações no Facebook, o meteorologista Luiz Carlos Molion afirma falsamente que o derretimento de geleiras no Ártico não tem relação com o aquecimento global e não aumenta o nível dos oceanos. Ele ainda diz, erroneamente, que a temperatura do Ártico, mesmo no verão, nunca é superior a -20°C. Na verdade, em 2020 atingiu o recorde de 38ºC.

No vídeo, gravado em 2010, Molion afirma, de modo equivocado, que nos próximos cinco anos – ou seja, por volta de 2015, de acordo com a época da entrevista – correntes marítimas levariam água fria ao Ártico e o gelo derretido iria se recuperar, como se o problema não tivesse relação com mudanças climáticas e se resumisse a um processo sazonal. Na realidade, a extensão de gelo no Ártico vem diminuindo rapidamente — em 2020, chegou à segunda menor marca já registrada.

(…)

O Estadão Verifica pediu que dois dos mais reconhecidos especialistas no tema do aquecimento global e de glaciologia assistissem ao vídeo viral. Um deles, o climatologista Carlos Nobre, do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP), é PhD em Meteorologia, integrante das academias Brasileira e Mundial de Ciências e da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos. O outro, o cientista Jefferson Cardia Simões, é pioneiro no estudo de Glaciologia no Brasil e primeiro brasileiro a obter um PhD na área; ele é vice-presidente do Comitê Internacional de Pesquisas Antárticas (SCAR), coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia da Criosfera, integrante da Sociedade Glaciológica Internacional, além de professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Para os dois especialistas, as falas de Molion já eram negacionistas há 11 anos, e os dados mais recentes sobre mudança climática, como o Relatório de 2021 do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (INCC) da Organização das Nações Unidas (ONU), confirmam que as afirmações feitas por ele naquela época continuam não se sustentando cientificamente. “Ele se mete a falar absurdos”, diz Simões. “Alguns absurdos são coisas que nós ensinamos para o aluno de graduação do segundo ano de Geografia Física. Ele não tem condição nenhuma de falar o que ele está falando”.

(…)

Veja abaixo os argumentos do meteorologista no vídeo de 2010 e como os especialistas ouvidos pelo Verifica analisam as falas.

 

Diminuição das geleiras não tem relação com a temperatura?

Ao responder à fala do jornalista Fernando Miltre, Molion diz que o efeito físico da diminuição das geleiras não tem qualquer relação com a temperatura do ar. Isso não é verdade, como explica o climatologista Carlos Nobre. A extensão total de gelo no Ártico em setembro de 2021 foi a 12ª mais baixa já registrada, como mostra este estudo. “O Ártico já aqueceu quase 3°C desde a década de 1960 e isso é diretamente relacionado ao aquecimento global”, diz.

(…)

O especialista acrescenta que a poluição das últimas décadas fez com que o gelo ficasse mais escuro. “Com isso, o albedo diminuiu e aumentou a absorção de radiação solar e a temperatura do ar sobre o gelo, também contribuindo para o degelo”, afirma.

 

Mar congelado ou icebergs?

Após falar que o derretimento das geleiras – que levam séculos para se formar – não tem relação com a temperatura do ar, Luiz Carlos Molion tenta explicar que o nível do mar não aumenta com o degelo. Ele faz uma comparação equivocada com um copo d’água com um cubo de gelo, dizendo que o nível de água no copo não aumenta quando o gelo derrete. Mas, ao afirmar isso, ele passa a falar do mar congelado do Ártico e mistura os termos novamente ao usar como exemplo o derretimento de um iceberg. (…) “O mar congelado é formado pelo congelamento de água do mar, não tem nada a ver com geleiras nem com icebergs”, diz Simões. “Icebergs são partes de gelo que partiram das geleiras. Como as geleiras são formadas por água doce, pela precipitação e acumulação de neve, não tem nada a ver com o mar congelado”.

(…)

Temperatura do Ártico nunca é inferior a -20°C?

Em seguida, Molion afirma que não se vê água escorrendo nas geleiras “porque mesmo num verão de lascar, forte, no Ártico, a temperatura nunca é superior a 20°C negativos”. Ele chega a comparar a temperatura no Ártico com a de um freezer e acrescenta que “não é o aquecimento global que está fazendo aquele gelo desmoronar”, e sim as correntes marítimas que passaram um tempo levando água mais quente para lá. Segundo ele, dentro de quatro ou cinco anos, se o mesmo ciclo se repetir, as correntes passarão a levar água fria e o gelo vai voltar.

Segundo Simões, a previsão de resfriamento vem sendo feita por Molion há mais de 20 anos e não se confirmou. “A temperatura do Ártico ultrapassa em muito 0°C e pode atingir até 10°C no verão. Temperaturas de 0°C são encontradas até no Polo Norte e isso é conhecimento de 100 anos”, afirma.

No final do vídeo, o entrevistado afirma que existe uma variação da extensão mínima de gelo marinho e acrescenta que o gelo se recuperou e até aumentou. Simões também critica essa fala. “Isso é um discurso para quem não conhece (o assunto)“, diz. “O mar congelado diminui e aumenta, aí ele vai e fala que já aumentou. É claro, aumentou porque estava chegando o inverno. Acontece que a cada vez que reduz no verão, está ficando cada vez menor”.

(…)

 

Leia a reportagem completa da jornalista Clarissa Pacheco no site do Estadão.

 

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