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Dia Internacional da Mulher: a dura tarefa da busca por igualdade

Leia a seguir matéria da Acadêmica Vanderlan Bolzani, publicada pelo Jornal da Ciência em 8 de março:

Quando se olha para o objetivo de eliminar as desigualdades de gênero, temos à frente uma realidade complexa que exige esforço particular de visão e compreensão sobre o papel das mulheres na sociedade. Trata-se, por um lado, de mudar mentalidades e crenças construídas ao longo de séculos. E, por outro, de criar novos valores que substituam os antigos, em um mundo em rápida transformação.

A empreitada é enorme, mas não há dúvida de que nos últimos anos tivemos conquistas substantivas na redução de desigualdades entre homens e mulheres, especialmente quando se considera o panorama da educação superior e da pesquisa científica no País. As estatísticas de instituições nacionais e órgãos internacionais mostram o quadro no qual as mulheres passaram a se colocar em nível de igualdade, ou mesmo superaram os homens no ingresso aos cursos superiores ou na adesão às carreiras acadêmicas. Os mesmos dados mostram, porém, que essa presença vai se reduzindo quando chegamos ao topo das carreiras e dos cargos de comando, um fenômeno que ocorre não somente no Brasil, mas também nos países desenvolvidos. Outra característica desse panorama, mesmo com a constatada evolução dos últimos anos, é a presença diminuta das mulheres nas chamadas “ciências duras”, isto é, física, química, engenharias e matemática.

Mas o fato de que houve mudanças indica que elas são possíveis e que temos que continuar educando e mostrando que o futuro sustentável dependerá de uma necessária sintonia de gênero. Em faixas distintas da população, as velhas crenças e posições conservadoras vão, aos poucos, sendo substituídas por novos valores. Nesse processo, é evidente também a força de inúmeras iniciativas que tentam construir tais referências: desde políticas implementadas por vários setores representativos do País, como sociedades científicas – destacando aqui a SBPC e a ABC -, setores governamentais, até projetos pontuais de empresas privadas que estimulam jovens e meninas a se interessarem pelo conhecimento e pelo estudo como instrumento de mudanças profissionais e comportamentais.

No entanto, seria ilusório considerar o Brasil atual a partir desse recorte que leva em conta o ambiente acadêmico. O País exibe tenebrosos indicadores quando se considera os números sobre violência de gênero, que salta a cada dia nos jornais, assim como está tristemente colocado entre os que apresentam os maiores índices de feminicídio nas estatísticas mundiais. Estão amplamente documentadas as análises sobre as desigualdades salariais entre homens e mulheres na economia como um todo, e as menores chances de ascensão profissional para elas. Aspectos da desigualdade sempre mais acentuados nas classes pobres e sem acesso à educação de qualidade.

A tarefa de realizar essa mudança de valores tem muitas faces. Mas é certo que ela deve ir além dos louváveis esforços e resultados obtidos com a redução da desigualdade de gênero no ingresso à universidade, e exige a intensificação do debate sobre igualdade em toda sociedade brasileira.

Sobre a autora:

Vanderlan Bolzani é vice-presidente da SBPC e da Academia de Ciências do Estado de São Paulo (Aciesp), membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e professora titular do Instituto de Química da Unesp/Araraquara

Por que as meninas não querem fazer ciências exatas?

Desde a primeira mulher a receber um diploma de graduação no Brasil, em 1887, as brasileiras ocuparam cada vez mais as instituições de ensino superior. Segundo o Censo da Educação Superior de 2016, as mulheres, que são a maior parte da população brasileira, já representam 57,2% dos estudantes matriculados em cursos de graduação no país. Ainda assim, este aumento não acompanhou a proporção entre homens e mulheres nos cursos de ciências exatas. O mesmo relatório mostra, por exemplo, que no curso de engenharia mecânica a participação feminina está em 10,2%, fenômeno que se repete na engenharia elétrica (13,1%) e na engenharia civil (30,3%). Então, se as brasileiras já são maioria no ensino superior, por que são tão poucas nas ciências exatas e engenharias?

Segundo a socióloga política e Acadêmica Elisa Reis – doutora em Ciência Política pelo Massachusetts Institute of Technology, professora titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ) e membro da Academia Mundial de Ciências (TWAS) – a resposta para esta questão está nos processos e mecanismos de socialização, que “fazem tanta gente ainda acreditar que existem características intrínsecas e divisões naturais de funções na sociedade, reservando a homens e mulheres distintos caminhos para aprender e conhecer”. Para Reis, a escolha da carreira se deve muito mais a cultura apreendida durante a infância e adolescência do que a um fator biológico.

A Acadêmica alerta para os padrões de socialização no interior das famílias, nas escolas, nos meios de comunicação e em outros nichos de difusão de valores, que se prestam a recriação de mitos e preconceitos sobre habilidades e vocações diferentes para homens e mulheres.

Um exemplo disso são os brinquedos discriminados por gênero, como destaca a física e Acadêmica Yvonne Mascarenhas –  doutora em química (físico-química) e livre-docente pela Universidade de São Paulo (USP), com pós-doutorado pela Universidade de Harvard e professora titular aposentada do Instituto de Física de São Carlos, da USP, ainda em exercício. Ela trabalha há muitos anos com divulgação científica na educação básica, e observa: “São diferentes os brinquedos oferecidos às meninas e meninos, e as meninas tem menor contato nas atividades do pai, que tem uma cultura social mais ligada a temas tecnológicos”.

No Instituto de Estudos Avançados (IEA) – Polo São Carlos, da Universidade de São Paulo (USP), Mascarenhas coordena o projeto Agência Multimídia de Difusão Científica e Educacional Ciência Web, que deu origem ao Portal Ciência Web. No portal são disponibilizados vídeos, jogos e outros conteúdos multimídia como forma de complementar o ensino de ciências em escolas públicas e divulgar a produção universitária.

Em correlação com a divulgação das lutas e direitos conquistados pelas mulheres no passado e de histórias sobre o sucesso alcançado por mulheres cientistas, a Acadêmica vê nos blogs de ciência na Internet um grande aliado para despertar o interesse das meninas em ciência.

No Reino Unido, a campanha Let Toys Be Toys, concebida a partir de um segmento no site parental Mumsnet, tem alertado aos pais sobre o aumento de marketing e propaganda para crianças que reforçam estereótipos de gênero. Eles apoiam que as crianças decidam com o que brincar e também defendem que elas precisam de uma ampla gama de jogos para desenvolver diferentes habilidades.

Este é também o argumento levantado pela farmacêutica e Acadêmica Vanderlan Bolzani, doutora em ciências pelo Instituto de Química da USP, com pós-doutorado na Universidade Estadual da Virgínia, EUA, e livre-docente pelo Instituto de Química da Universidade do Estado de São Paulo (Unesp) , onde é professora titular.

Ela tem participado ativamente do debate sobre mulheres na ciência. “Eu fui de uma geração em que a minha mãe não queria que eu brincasse com meninos. E eu gostava das brincadeiras dos meninos, achava mais interessantes. Ficava olhando os meninos jogarem bolinha de gude. Se analisarmos friamente, esta é uma brincadeira que exige do cérebro um estímulo maior”, compartilha a Acadêmica. Ela assegura: “Quanto mais você colocar uma criança em contato com desafios, com situações que estimulem a capacidade cerebral, melhor”.

Reis lembra que, da mesma forma que perpetua o status quo, a família pode transformar crenças e valores. Bolzani observa ainda que a divulgação científica feita de forma igualitária para ambos os gêneros é também responsabilidade do Estado. “As escolas são muito importantes para colocar para meninas e meninos a importância do conhecimento, e como ele é um instrumento maravilhoso de descoberta dos segredos do mundo”, ela complementa.

Como indica a socióloga Elisa Reis, a quebra de estereótipos que segregam meninas e mulheres corresponde também ao fim de preconceitos que oprimem, de maneira reversa, meninos e homens. “Livres de tais preconceitos todos poderão exercer com mais liberdade suas escolhas, desenvolver melhor suas potencialidades e assim contribuir, plenamente, para o avanço do conhecimento científico e do bem-estar da sociedade”.

Iniciativas aproximam meninas das ciências exatas

Apresentando-se como alternativas aos ambientes que reforçam escolhas de carreira baseadas nos estereótipos de gênero, universidades, institutos científicos e ONGs tem oferecido ao público projetos e atividades de iniciação nas ciências exatas para meninas. Conheça alguns exemplos:

Tem Menina no Circuito

Coordenado por professoras do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o projeto propõe oficinas de eletrônica têxtil e em papel para alunas do ensino médio. Nessas oficinas, as adolescentes fazem desde circuitos elétricos simples a sistemas mais complexos que podem ser como conjuntos de LEDs e motores que respondam a estímulos sonoros. O trabalho realizado nas oficinas pode ser facilmente relacionado ao conteúdo de física do ensino médio, na parte de eletricidade e magnetismo.

Meninas Olímpicas do Impa

Criado pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa), com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o programa visa promover a efetiva presença de meninas em atividades ligadas à matemática, inclusive nas olimpíadas escolares, para que elas possam se interessar e desenvolver carreiras no âmbito científico e tecnológico.

Ainda em fase de desenvolvimento, o projeto contará com a participação de cinco escolas públicas do estado do Rio de Janeiro e será coordenado por Leticia Rangel, docente aposentada do Colégio de Aplicação da UFRJ. Serão desenvolvidas, em cada escola, atividades motivadoras e educativas complementares para turmas de alunas. A ideia é que os encontros sejam semanais. Também acontecerão sessões de preparação das alunas para as olimpíadas escolares, além de visitas das escolas participantes ao Impa para atividades como palestras e oficinas.

ELAS nas Exatas

Resultado de uma parceria entre o Fundo ELAS, único fundo voltado exclusivamente para a promoção de direitos de mulheres no Brasil, o Instituto Unibanco e a Fundação Carlos Chagas, o Programa ELAS nas Exatas tem por objetivo incentivar projetos que estimulem meninas a se envolverem com as ciências exatas e tecnológicas, sensibilizando a gestão escolar para transformar o cenário de desigualdade de gênero existente no Brasil.

O Programa ELAS nas Exatas investiu R$ 553 mil em projetos inovadores que, em apenas 1 ano, alcançaram: mais de 1 mil beneficiárias diretas; mais de 12 mil beneficiárias indiretas; 10 escolas públicas; 18 organizações da sociedade civil; e 10 instituições governamentais.

Em 8 de março, homenageamos Helena Nader: mãe, mulher, pesquisadora e defensora da ciência brasileira

Criado para lembrar e celebrar as lutas das mulheres ao longo dos séculos e que acontecem até hoje, o Dia Internacional da Mulher, em 8 de março, resgata também as trajetórias de mulheres inspiradoras que tiveram de superar os desafios impostos por uma sociedade patriarcal para ascender na vida e darem sua contribuição para a humanidade. No âmbito da ciência, as histórias das pioneiras Marie Curie, Rosalind Franklin e Katherine Johnson talvez sejam algumas das mais conhecidas.

O Brasil, um país extremamente desigual em vários aspectos, pode se orgulhar de brilhantes exemplos na categoria de mulheres cientistas. Um relatório publicado pela editora científica Elsevier mostrou que, dentre os países pesquisados, Brasil e Portugal são as nações com a maior porcentagem de autoras em trabalhos científicos (49% do total). A biomédica Helena Bonciani Nader é um desses modelos inspiradores para meninas e meninos que desejam fazer ciência no país. Presidente de Honra da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), da qual foi vice-presidente e presidente por dez anos, hoje ela está concorrendo à vice-presidência da Academia Brasileira de Ciências (ABC), em chapa única.

Bacharel em ciências biomédicas e doutora em biologia molecular pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), com pós-doutorado pela Universidade do Sul da Califórnia, nos EUA, a Acadêmica Helena Nader é professora titular da Unifesp e bolsista de produtividade nível 1A do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

É membro titular da Academia de Ciências de São Paulo e da World Academy of Science (TWAS) for the Advancement of Science in Developing Countries. Recebeu diversas honrarias: Ordem do Mérito Naval, grau Comendador do quadro Suplementar, Marinha do Brasil, 2018; Grão-Mestre da Ordem Nacional do Mérito Educativo, Presidência da República, 2018; Classics in Cell Biology, Sociedade Brasileira de Biologia Celular (SBBC), 2018; Science Service Award, Federação de Sociedades de Biologia Experimental, FESBE 2018; Ordem do Mérito da Defesa, grau Oficial, Presidência da República (2016); Medalha Carneiro Felippe, Comissão Nacional de Energia Nulear (CNEN) (2016); Ordem do Mérito Naval, classe Grã-Mestra, Marinha do Brasil (2015); Medalha Mérito Tamandaré (Marinha do Brasil) (2013); Medalha de Ouro Moacyr Alvaro (2012); Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico (2008); Prêmio Scopus 2007 (Elsevier/Capes); Professor Honoris Causa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2005); Comenda da Ordem Nacional do Mérito Científico (2002), entre outros.

Além do trabalho de excelência na pesquisa, a professora tem se destacado, desde o início da sua carreira, na atuação política em prol da ciência, tecnologia e inovação brasileiras. Se eleita vice-presidente da ABC, será a segunda mulher a ocupar o cargo, em 102 anos de ABC, depois da engenheira agrônoma Johanna Döbereiner, em 1995.

As irmãs Helena e Heloisa com a mãe

Helena nasceu em 5 de novembro de 1947, na cidade de São Paulo. Passou a infância na companhia dos pais e da irmã, em São Paulo e Curitiba, no Paraná, para onde seu pai foi transferido. Ela lembra com alegria desse período: “Brincávamos de boneca, de construção, de tijolinhos de engenheiro, de bicicleta, não tinha uma brincadeira de menina ou de menino, a brincadeira era de tudo. Tive uma infância incrível”.

Seus pais sempre a incentivaram muito a estudar, e ela, por outro lado, também sempre gostou da escola. Sobre suas matérias preferidas na época, ela comenta: “Eu gostava muito de matemática, das ciências, física, biologia, em outras palavras, eu gostava de estudar. Tinha alegria de ir para escola, de fazer lição de casa”, ela explica.

Ainda na adolescência, Helena teve sua primeira experiência acadêmica no exterior, e foi cursar o último ano do ensino médio nos Estados Unidos. De volta ao Brasil, prestou o exame vestibular do Centro de Seleção de Candidatos às Escolas Médicas e Biológicas (Cescem), colocando como opções o curso de medicina da Escola Paulista de Medicina e da Universidade de São Paulo (USP), e o bacharelado em ciências biomédicas da Unifesp, criado em 1966, apenas um ano antes de seu ingresso. Esse foi o escolhido: ela conta que foi totalmente absorvida pela filosofia do curso. “Nossa turma tinha passagem direta para medicina, e dos 20, só dois elegeram essa opção ao final do bacharelado. Isso significa que foi um curso que motivou os estudantes, hoje professores no país e no exterior. O projeto pedagógico do curso permitiu descobrir talentos com vocação para essa área”.

Colega de curso na Unifesp e amiga de longa data de Helena, a Acadêmica Regina Markus relembra os tempos da graduação: “Desde aquela época, Helena era uma pessoa de opinião, que sabia lutar pelo que queria, e era uma pessoa de muito estudo e muitas ideias. A vida toda em que corremos juntas é uma prova de que Helena é uma pessoa que soube estar no seu tempo e a frente dele”.

Enquanto por um lado estava na vanguarda, nos quesitos talento e vocação, por outro lado Helena iniciou sua vida acadêmica num período conturbado da história do país: a ditadura militar. Ela lembra: “Vivi em uma época trágica do Brasil, que espero não ter que viver nunca mais. Eu tive professores e colegas presos, torturados, desaparecidos… Não foi fácil”.

Durante o bacharelado na Unifesp, em 1969 a Acadêmica iniciou outra graduação, em biologia, na Universidade de São Paulo (USP). Em 1970, começou o doutorado em biologia molecular na Unifesp, sob a orientação do Acadêmico Carl Peter Von Dietrich, que depois viria a se tornar seu companheiro por 22 anos, e pai de sua filha. Em 1974, iniciou sua carreira como docente na Unifesp. Entre 1975 e 1977, realizou o pós-doutorado na Universidade do Sul da Califórnia, nos Estados Unidos.

Helena e Julia, 1986

A cientista reforça que conciliar carreira e maternidade é um grande desafio. Nader recorda do período em que ela e Dietrich criaram um grupo de pesquisa em bioquímica na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). O casal se revezava entre Natal e São Paulo, para cuidar da filha Julia, ainda pequena na época. Eles encontraram um equilíbrio para que ambos pudessem continuar trabalhando, contando com a ajuda dos pais de Helena.

“Muitas mulheres não tiveram a sorte que eu tive. Eu digo sempre: eu sou quem eu sou começando pelo pai e mãe, pela família e pelos professores que tive”, reconhece.

Como pesquisadora, Nader trabalha com a heparina, um composto que evita a coagulação do sangue e impede a formação de vasos. Ela relata que muitos pensaram que, com a morte do professor Dietrich, em 2005, sua vida acadêmica teria acabado, pois como eram parceiros na vida pessoal e profissional, era ele quem orientava e escrevia os trabalhos.

“Mas está aí provado que eu continuei fazendo tudo isso, embora com muita saudade. Sinto saudade dele até hoje”, declara.

Ela orientou 46 mestres, 50 doutores e supervisionou 19 estágios de pós-doutorado, tendo atuado ainda como professora visitante da Loyola Medical School (Chicago, EUA), W. Alton Jones Cell Science Center (NY, EUA), Istituto Scientifico G. Ronzoni (Milão, Itália) e Opocrin Research Laboratories (Modena, Itália).

Helena, Peter e Julia, em Paris

Helena Nader tem na ciência brasileira uma de suas paixões. Além de professora e pesquisadora, a cientista já ocupou diversos cargos administrativos em instituições científicas: foi vice-presidente (2007-2011), presidente (2011-2017) e presidente de honra (desde 2017) da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), presidente da Sociedade Brasileira de Bioquímica e Biologia Molecular (SBBq, 2009-2010) e é membro do Conselho Superior da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). “Qual é a minha obrigação hoje? Preservar a Constituição e os direitos que ela garante. E lutar cada vez mais pela qualidade da educação e da ciência no nosso país, que é a única coisa que vai mudar o perfil econômico do Brasil”, afirma a Acadêmica.

Como vice-presidente da ABC, Nader pretende trabalhar para colocar o Brasil cada vez mais na fronteira científica mundial. Ela lembra que é a diversidade que torna as nações grandes, e dentro da Academia, ainda que lentamente, o cenário tem se tornado mais plural, especialmente com uma maior entrada de mulheres. A cientista ressalta: “A participação da mulher na ciência brasileira é gritante, somos mais de 50% nas universidades. Então, eu não entendo porque ainda tem que ter subserviência. Eu não quero ser melhor do que o homem, eu quero ser igual. Equidade: é isso que nós queremos”.

Ela é uma batalhadora, com uma perspectiva ampla em relação ao papel do cientista no mundo. “Eu, como Acadêmica, tenho que lutar por uma sociedade justa, e não só por uma sociedade científica mais justa. Enquanto a mulher não tiver seus direitos preservados, eu vou continuar lutando”.

Seja como mulher, mãe, cientista ou pesquisadora, a trajetória de Helena Nader inspira não apenas jovens meninas que querem fazer ciência: sua atitude e seu pensamento servem também de estímulo para brasileiras e brasileiros pensarem coletivamente, e lutarem pela equidade de gênero, pela qualidade da ciência e da educação, em prol do desenvolvimento do país.

Resolução da resposta imune por lipoxinas

Fabiana Simão Machado demonstrou uma vocação precoce e surpreendente. Desde pequena, brincava com insetos, os abria pra ver como eram por dentro. “A primeira coisa que pedi pros meus pais de presente foi um kit de laboratório, gostei muito da lupa, porque dava pra ver melhor os insetos, os bichos”, recorda. O interesse foi totalmente espontâneo, dado o fato de não ter nenhum parente que trabalhasse com nada relacionado à Ciência. “Acho que fui uma mutação na família”, brinca a pesquisadora.

O que parece ter alimentado seu interesse pela biologia foram algumas aulas práticas de laboratório na quinta série. Ela recorda que a professora, em um experimento para revelar a diferença entre a respiração cutânea e a pulmonar, levou um sapo, o abriu e mostrou sua respiração. O sapo ainda sobreviveu por dois, três dias. “Eu fui a primeira a levantar a mão e querer fazer a mesma coisa, mas meu sapo morreu logo que eu abri. Fiquei frustrada, mas não me traumatizou a ponto de me desmotivar!”

No ensino médio, Fabiana não teve dúvidas na hora de escolher o curso e entrou para biomedicina, no Centro Barão de Mauá, em Ribeirão Preto. Na faculdade, tomou a iniciativa de procurar laboratórios que atendessem a sua curiosidade. Interessou-se pelas áreas de parasitologia e imunologia, nas quais atua até hoje. Após a graduação, Fabiana Machado formou-se mestre e doutora em imunologia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) e hoje é professora adjunta no Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

O que encanta a pesquisadora na ciência não é apenas o diagnóstico das doenças, mas entender suas causas naturais, partindo dos detalhes da interação dos organismos envolvidos. “Além disso, é uma forma de contribuir com o desenvolvimento de terapias que evitem a formação de uma patologia”, acrescenta.

Ela adora trabalhar com pesquisa. “Cada dia é uma descoberta, surgem novas idéias e às vezes frustrações, já que a ciência nem sempre é exata. A possibilidade de ajudar na saúde de pessoas é uma sensação inexplicável”. Apesar das dificuldades e do avanço por vezes lento, Machado não se desanima: “a gente sabe que nossa pesquisa pode demorar anos, mas é uma pedrinha que colocamos de cada vez, é um passo que damos”.

A pesquisa que Fabiana Machado vem desenvolvendo é sobre a resolução da resposta imune por lipoxinas. Ela partiu da constatação de que a indução de mediadores pró-inflamatórios é fundamental para o sucesso da resposta imune contra patógenos como o Trypanosoma cruzi e o Mycobacterium tuberculosis. “O mediador lipídico antiinflamatório derivado das lipoxinas exerce um papel biológico muito importante ao revigorar a resposta imune contra esses patógenos”, garantiu Machado. Tais estudos, segundo ela, sugerem um novo alvo molecular para o desenvolvimento de drogas contra doenças marcadas por respostas inflamatórias desreguladas.

Quanto à afiliação à Academia Brasileira de Ciências, Machado agradeceu a indicação dos Acadêmicos Ricardo Gazzinelli, Sérgio Pena e Paulo Sérgio Beirão, afirmando ter sido uma honra e uma felicidade muito grandes. “É muito bom fazer parte de um grupo de pesquisadores, professores e doutores da qualidade que encontramos na ABC”, entusiasma-se, “e por outro lado, nos faz perceber que todo nosso esforço, nosso trabalho, nossa contribuição está sendo de alguma forma reconhecida. Fiquei realmente muito emocionada.”

Nos próximos anos, a cientista pretende, antes de tudo, fazer jus à nomeação continuando seus projetos e colaborando para o desenvolvimento da ciência. “Além de ajudar a área da saúde, quero divulgar a qualidade da pesquisa brasileira”, acrescenta a bem vinda afiliada.

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