Da esquerda para a direita: Patricia Pestana Garcez, Clarissa Reily Rocha, Fabiana Kommling Seixas, a coordenadora Luisa Lina Villa, Alexandre Bruni Cardoso, Taissa Rodrigues Marques, o diretor da ABC Francisco Laurindo e o coordenador Alexander Kellner.

 

O 3º Simpósio Científico dos Membros Afiliados da ABC 2020-2021 foi realizado no dia 15 de junho, com apresentações de cinco jovens cientistas de excelência da área de ciências biomédicas e da Terra. Entre os principais assuntos abordados pelos novos afiliados, estavam câncer, zika e biodiversidade. O evento foi coordenado pelos Acadêmicos Luisa Lina Villa e Alexandre Kellner.

Os membros afiliados da Academia Brasileira de Ciências (ABC) são eleitos anualmente por região e tomam posse automaticamente no dia 1º de janeiro do ano seguinte à eleição. Os eleitos em 2020 e 2021 foram recepcionados conjuntamente em cerimônia online realizada em 3 de maio de 2021 e apresentarão suas contribuições à ciência em 12 simpósios ao longo do ano. A agenda completa dos simpósios científicos virtuais pode ser conferida aqui.  

O diretor da ABC Francisco Laurindo fez as honras do evento, explicando o que é e como funciona o programa de membros afiliados. Em seguida, apresentou Luisa Lina Villa, coordenadora do 3º Simpósio junto com Alexander Kellner. A Acadêmica detalhou o funcionamento do evento, deixando claro que no fim haverá tempo para que os espectadores façam perguntas aos palestrantes.

Conheça os membros afiliados da semana:

Paleontologia: uma viagem ao passado

A professora da UFES Taissa Rodrigues Marques da Silva realiza pesquisas na área da paleobiodiversidade animal ao longo do tempo geológico e atua na divulgação científica.

Encantamento pelo desconhecido e pela fronteira do conhecimento

A carioca Patricia Pestana Garcez é professora da UFRJ e faz pesquisa sobre a síndrome congênita do vírus Zika e malformações cerebrais.

Impacto social das ciências biológicas

Professora e pesquisadora da UFPel, Fabiana Kommling Seixas atua no desenvolvimento de vacinas terapêuticas e coordena o Programa de Pós-graduação em Biotecnologia da universidade.

Investigando como as células de câncer escapam dos medicamentos

Professora da Unifesp, Clarissa Reily Rocha tem interesse nos mecanismos moleculares de resistência à quimioterápicos.

As ciências biológicas e o funcionamento da vida

Professor da USP e líder do e-Signal Lab, Alexandre Bruni Cardoso estuda como a interação das células com o seu meio externo influencia processos fisiológicos e doenças.

 

Debate 

O debate foi bem rico, com grande participação do público. Os webinaristas interagiram por cerca de 45 minutos, respondendo à questões de alta relevância.

Confira:  

Onde está concentrado o maior número de fósseis de dinossauros no mundo?
Taissa confirmou que existem três principais depósitos de fósseis de pterossauros no mundo, sendo eles no leste da China, no meio oeste dos Estados Unidos e no sul do Ceará – sendo este último local o que mais sofre com a venda ilegal de fósseis.

Zika: fatores ambientais e formas de prevenção
Patricia Garcez foi questionada sobre se seu grupo de pesquisa vem estudando outros fatores ambientais que têm marcado a incidência da doença em outras regiões, além da subnutrição proteica. Ela disse que sim e afirmou que há outros fatores sendo estudados, como existência da saxitoxina (um anestésico local produzido por cianobactérias) em reservatórios de água. Já foi provado que a toxina exacerba os efeitos no cérebro, mas ainda estão estudando como ele afeta na transmissão materna. Além disso, também estão analisando como os acúmulos de pesticidas podem agravar os efeitos da doença. A cientista voltou a reafirmar que não há cura ou vacina para o zika vírus. Assim como no caso da dengue, há vacinas em desenvolvimento, porém nenhuma no mercado. “A nossa única prevenção é se proteger contra o vetor, no caso, os mosquitos. E como o zika também pode ser transmitido sexualmente, também deve ser usado o preservativo”, recomendou.

Prevenção do câncer e fatores genéticos
A professora Fabiana Seixas recebeu diversas perguntas sobre o tema de sua apresentação: câncer. Questionada sobre as possíveis formas de prevenção, ela comenta que há fatores ambientais que aumentam o risco, como a exposição à radiação UV que facilita o melanoma, o vírus da HPV que pode dar origem ao câncer de colón de útero, além de questões alimentares, tabagismo e obesidade. Ela ressaltou que o fator hereditário é o menos importante; a genética adquirida ao longo da vida acaba sendo uma influenciadora mais relevante.

A dupla função da glutationa
Clarissa Rocha recebeu várias perguntas sobre a glutationa, que possui dupla função: além de antioxidante, também se livra da droga, impedindo que ela afete as células saudáveis. Ela mencionou a dependência de tais antioxidantes, que fazem com que a célula tumoral sofra muito mais do que a célula normal. A intenção dessa enzima é tentar identificar o que está diferente entre a célula tumoral e a célula saudável para ela não agredir a segunda tão severamente.

Alterações na rigidez da matriz do câncer
Alexandre Bruni foi questionado sobre as alterações na rigidez da matriz do carcinoma. Ele contou que, em geral, os tumores sólidos são mais rígidos que os tecidos normais de órgãos como mama, próstata e pulmão. Isso ocorre devido ao acúmulo de colágeno e por conta das ligações cruzadas entre as fibras de colágeno, o que deixa as células mais juntas. Essa rigidez é, também, um prognóstico. Em testes laboratoriais, inclusive, foi possível induzir uma transformação maligna, alterando a concentração de colágeno e a rigidez em células normais cultivadas – o que caracteriza uma progressão agressiva da doença.  Luisa também questionou o pesquisador sobre a proliferação celular dos tumores: que proteínas da matriz extracelular atuam diretamente na produção de células normais e, quando desviadas, nas tumorais? Ele citou novamente o colágeno e a glicoproteína laminina, que aumenta a capacidade de proliferação da doença, especialmente no caso do câncer de mama.

Como incentivar jovens pesquisadores e como sobreviver em tempos de negacionismo?

Kellner levantou uma pergunta geral para todos os afiliados palestrantes: “como os jovens doutores talentosos presentes estão lidando com a falta de recursos para pesquisa?” Em geral, todos os profissionais afirmaram que “deram sorte” de continuar recebendo investimentos, ainda que, alguns deles, em menor quantidade; nas palavras do mediador, foram reconhecidos por sua competência.  

Patricia Garcez afirmou ter vivido uma boa fase na obtenção de  recursos nos últimos anos, que foi afetada pelos cortes severos e pelo redirecionamento de verbas para o tratamento da COVID-19. Atualmente, sua pesquisa sobrevive com parcerias e colaborações. Entre as dificuldades mencionadas, ela incluiu o fato de não conseguir fazer toda uma análise em um único laboratório dentro da própria universidade. “A interação entre vários pesquisadores é bacana, mas isso é algo que faz falta”.

Fabiana Seixas conta ainda com apoios das agências de fomento: desde 2009, quando iniciou seu grupo de pesquisa, obteve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), Capes e CNPq. Para ela, uma política que deveria ser adotada o mais breve possível é a interação entre grupos consolidados de jovens doutores.

Clarissa Rocha afirmou que a forte conexão que manteve com seu orientador vem sendo indispensável para sua pesquisa até hoje. Além disso, o fato de ela residir em São Paulo e poder contar com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) faz toda a diferença. A solução ideal para a inclusão de jovens pesquisadores no mercado, em seu ponto de vista, seria a liberação de editais voltados para esse público, para que eles consigam montar seus próprios laboratórios e grupos.

Alexandre Bruni disse que ter a pesquisa financiada pela Fapesp é um privilégio. No momento, ele se encontra em uma fase de transição: recebeu apoio do Programa de Auxílio ao Jovem Pesquisador da entidade, o que lhe permitiu montar um laboratório e obter bolsas para seus pesquisadores. Atualmente, ele está numa fase regular, com menos verba. “É uma fase de reinvenção”, categorizou.

Kellner indagou como eles incentivam seus alunos que desejam seguir a carreira científica, diante dos grandes cortes de verbas e do negacionismo.

Patricia Garcez afirmou que a palavra-chave nesse momento é resiliência. Ela afirmou que é sempre bom lembrar que o Brasil tem a grande vantagem de ser um país muito colaborativo, que está sempre produzindo em conjunto com centros de pesquisa internacionais. “Conseguir um estágio ou doutorado sanduíche no exterior é uma grande oportunidade para um jovem cientista”, afirmou. “Mas essa fase vai passar, eu acredito”, disse a pesquisadora, refletindo a opinião dos demais.

Para Alexandre Bruni Cardoso, a ciência é um empreendimento global: “É possível fazer ciência em qualquer lugar do mundo, basta não desistir.” Fabiana Seixas afirmou que incentiva seus alunos a seguirem o caminho do empreendedorismo, uma vez que faltam jovens empreendedores na área de biomedicina.

Taissa Rodrigues também acredita que essa fase não irá durar para sempre, e disse que nunca antes a importância da educação e da comunicação científica de qualidade foram tão evidentes no país.  “Falta entendimento sobre o vírus e a vacina. Nesse momento, o combate às fake news também foi fundamental”, completou. Reily Rocha completou, afirmando que o país precisa investir ainda mais pesado em divulgação científica: “Afinal, de que adianta a gente publicar vários artigos se ninguém da população sabe?”

Luisa Lina Villa agradeceu a todos que assistiram ao webinário e enviaram suas perguntas. Disse que para ela foi uma grande oportunidade de conhecer os membros afiliados e se inteirar das novas pesquisas produzidas por eles. “Apesar das adversidades que levaram à realização dos eventos online, esta alternativa está permitindo divulgar o conhecimento científico para um maior número de pessoas”, afirmou.

O encerramento do evento ficou por conta do diretor da ABC Francisco Laurindo, que destacou que este é o momento em que os cientistas não devem pregar apenas para quem não crê na ciência, mas também para os “convertidos”. Nos últimos anos, os sucessivos cortes na área de pesquisa e educação acentuaram um alarmante histórico de descrédito. Para Laurindo, o momento é de perseverar: “Dar o melhor não é só dizer que fez o melhor, é se reinventar todo dia. Nenhuma outra carreira além da nossa oferece essa perspectiva.”

Veja a transmissão completa aqui.

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