Leia texto do Acadêmico Paulo Artaxo para ABC, enviado em 6/12, diretamente de Dubai:

Com tanta política sendo jogada na COP-28, a pergunta sobre a relevância da ciência no encontro é muito atual. Vimos o presidente da COP, que é também presidente de uma companhia petrolífera, falar que a ciência não coloca a necessidade de eliminar combustíveis fósseis do planeta. Negacionismo científico a todo vapor para beneficiar as empresas de petróleo. Rapidamente, vários debates mostraram que sim, a ciência exige mudanças profundas no uso de energia no planeta, incluindo a eliminação do petróleo.

A ciência está também presente na importante questão dos chamados “tipping points”, ou pontos de não-retorno climático. Muitas das mudanças que já estamos fazendo no clima do planeta não têm volta, são irreversíveis. Mas onde exatamente estão os tipping points? E onde está o tipping point da Amazônia? Será quando atingirmos 40% do desmatamento da floresta? Ou será quando atingirmos 3°C de aumento na temperatura global? E quanto ao derretimento das geleiras da Groenlândia ou da Antártica? Este importante tema foi palco de várias apresentações na COP-28, e a ciência está fazendo progressos notáveis nesta área.

Outro ponto científico importante foi a discussão das bases científicas dos inventários de emissões que cada nação é obrigada a reportar à Convenção Climática. A diversidade de processos que levam a emissões de gases de efeito estufa, e a necessidade de cada país de reportar valores que lhes beneficiem em termos de emissões fazem deste tema um problema enorme. Como quantificar as emissões de cada país e processo de maneira justa e a mais precisa possível? Comparar emissões de CO2, CH4, N2O entre si e de cada país é uma tarefa hercúlea e o Painel Científico sobre Mudanças Climáticas (IPCC, da sigla em inglês) ajuda desenhando softwares de suporte que podem ser usados pelos países para submeteram seus relatórios à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCC).

Hoje na COP os negociadores climáticos brasileiros fizeram uma reunião com toda a delegação brasileira. O embaixador André Corrêa do Lago, junto com Ana Toni, João Paulo Capobianco e outros que estão participando da negociação discutiram seus pontos para dar transparência às posições brasileiras na COP. Em particular, os negociadores foram questionados sobre emissões da agricultura, desmatamento, resíduos sólidos etc. Capobianco deu uma resposta brilhante: o governo brasileiro nas negociações foca na redução de emissões do petróleo, já que é responsável por 83% das emissões. Os demais setores  têm importância relativa menor na estratégia política, mas que também tem que ser levados em conta. Mas não se pode esquecer das emissões do petróleo. Nota 10 para Capobianco.

Há mais de 50 anos atrás, a ciência alertou os governos e a sociedade dos riscos que a mudança climática teria para nosso planeta. Agora, a ciência busca métodos para sairmos da encrenca em que estamos, com a bagunça no clima. Ciência nunca foi tão importante para ajudar a humanidade.

Painel da Organização Meteorológica Mundial (WMO) e do Painel Científico sobre Mudanças Climáticas (IPCC) discutiu aprimoramentos nos métodos de reportar inventários de emissões de gases de efeito estufa

 

Paulo Artaxo é climatologista e membro titular da Academia Brasileira de Ciências. É professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas. É membro do Comite Orientador do Fundo Amazônia, do Fundo Nacional de Meio Ambiente e do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia. Está presente em Dubai para a COP 28.

 


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