Começou no dia 2 de agosto o encontro “Ciência para e pela Amazônia”, que reúne as academias membras da Rede InterAmericana de Academias de Ciências (Ianas) no Instituto Nacional de Pesquisas Amazônicas (Inpa), em Manaus. O encontro entre representantes das comunidades científicas dos países amazônicos vai discutir os múltiplos aspectos de preservação da maior floresta tropical do mundo. Como símbolo da importância dos povos tradicionais nesse debate, o encontro foi aberto com o Hino Nacional Brasileiro cantado na língua indígena Macuxi.

A mesa de abertura contou com representantes da Ianas, do Inpa, da Academia Brasileira de Ciências (ABC), da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), dos ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (MMA) e das Relações Exteriores (Itamaraty), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Amazonas (Fapeam) e da Academia Mundial de Ciências (TWAS).

 

Marcia Perales (Fapeam), Braulio Dias (MMA), María Alexandra López (OTCA), Karen Strier (Ianas), Helena Nader (ABC/Ianas), Marcia Barbosa (MCTI/ABC), Antonio Ricarte (Itamaraty), Marina Anciaes (Inpa), Virgilio Almeida (ABC) e Marcos Cortesão (ABC) | Foto: Erikson Fernandes

 

A presidente da ABC, Helena Nader, abriu o debate saudando os presentes e apontando a  importância de serem definidas ações com efeitos práticos imediatos para o bioma. “Esperamos que essa não seja apenas mais uma reunião. O diagnóstico já foi feito e o paciente está morrendo. Mas que diferença faz o diagnóstico, se não nos unirmos para salvá-lo?”, questionou. Nader, que é biomédica, também é co-presidente da Ianas ao lado da antropóloga norte-americana Karen Strier, que lembrou que o evento pode servir de exemplo para outras regiões. “A Amazônia é crucial e iniciativas como essa podem servir de exemplo para outros biomas”, disse.

A advogada com especialização em direito econômico e ambiental María Alexandra Moreira López, secretária-geral da OTCA, lembrou da importância do investimento e engajamento científico no tema. “Os cientistas, gostemos ou não, se converteram em atores políticos. É momento de encarar e enfrentar o problema de forma direta e imediata”, afirmou.

A Acadêmica Márcia Barbosa, que é física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e atualmente secretária de Políticas e Programas Estratégicos do MCTI, listou algumas ações do ministério quanto à questão amazônica. Ela afirmou que a pasta pretende criar o Pro-Amazônia, programa para englobar e dar escala a várias iniciativas relacionadas à bioeconomia, ou seja, a criação de produtos com valor  agregado a eles, de forma sustentável e mantendo a floresta em pé. “Nós dizemos que a ciência voltou, mas isso não é totalmente correto. A ciência voltou ao governo, mas nós, cientistas, nunca fomos embora”, ressaltou.

 

Karen Strier, Helena Nader e Marcia Barbosa | Foto: Erikson Fernandes

 

Biólogo com doutorado na Escócia, Braulio Dias é hoje diretor para Conservação de Biodiversidade e Uso Sustentável do MMA, onde trabalha há 20 anos. Ele lembrou que não adianta apenas o Brasil fazer sua parte quanto ao bioma para a humanidade resolver as mudanças climáticas. “O maior vilão são os combustíveis fósseis e seu uso nunca parou de crescer”, lembrou.

Para a diretora-presidente da Fapeam, Márcia Perales, que tem formação como assistente social e é ex-reitora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), a participação da população amazônica no debate e elaboração de soluções para a questão amazônica é indispensável. “Nada por nós sem nós”, enfatizou.

Na mesma linha, a bióloga e pesquisadora do Inpa Marina Anciaes, que foi membra afiliada da ABC entre 2009 e 2014, deu as boas-vindas da casa aos participantes do evento e lembrou da importância de se estimular os pesquisadores jovens locais. “Esses cientistas, hoje na graduação e pós-graduação, são o futuro da questão amazônica”.

 

Braulio Dias, Marcia Perales e Marina Anciaes | Fotos: Erikson Fernandes

 

O vice-presidente da ABC para a região Minas Gerais e Centro-Oeste, Virgilio Almeida, falou enquanto membro da Academia Mundial de Ciências (TWAS), sediada em Trieste, na Itália. Ele relatou que a TWAS têm duas grandes missões. A primeira seria criar condições para a ciência se desenvolver no sul global “e eu percebo que esta discussão pode repercutir lá, então pretendo levar a mensagem poderosa e as recomendações desse encontro para a Reunião Anual da TWAS, em novembro.” O segundo ponto seria a preocupação da TWAS com a falta de apoio para jovens cientistas. “O que está acontecendo é a fuga de cérebros em toda a região do sul global. Mas precisamos manter esses jovens, porque precisamos de ciência construída nesse eixo sul-sul. Precisamos trabalhar juntos nisso.” 

 

Palestra de abertura

O embaixador Antonio Ricarte, do Itamaraty, ministrou a primeira palestra do encontro lembrando da Cúpula de Belém, que será realizada semana que vem e reunirá políticos, juristas, cientistas e demais atores da sociedade civil de todos os países amazônicos em 405 encontros diferentes para diálogos sobre a região.

Ricarte também fez um breve histórico das iniciativas ambientais que trataram da Amazônia, desde as primeiras Conferências das Partes das Nações Unidas, passando pela Rio 92 e a Rio+20, até desenvolvimentos mais recentes como o Observatório para a Amazônia e o Painel Científico para a Amazônia (SPA).

Em um recente manifesto, o Fórum Político de Alto Nível (HLPF) reconheceu que a ciência, a tecnologia e a inovação devem enfrentar a postura de “Business as Usual”, ou seja, a postura de quem acha bom que as coisas continuem como sempre, evitando mudanças. “Desse modo, essas áreas podem acelerar a realização dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), observou Ricarte. “Foi definido que a inclusão social é parte fundamental desse processo. Pois não se pode negar o papel fundamental das comunidades indígenas, povos tradicionais, além de mulheres e jovens. Assim preenchemos lacunas no conhecimento e promovemos uma aceleração das soluções”, afirmou.

O embaixador terminou lembrando que a questão amazônica envolve diretamente a soberania nacional. “Desvendar os mistérios da maior floresta tropical do mundo é algo que só pode ser alcançado multilateralmente. Os países da região tomaram para si o dever de criar conhecimento autóctone para e região. Não se pode aceitar que países de fora tomem a liderança de um desafio que não lhes compete”, finalizou.

 


O evento foi organizado pela Rede InterAmericana de Academias de Ciências e a Academia Brasileira de Ciências (ABC).


Acesse aqui a gravação na íntegra.


 

 


Leia as matérias da ABC sobre o evento: