Francisco Thiago Aragão, novo afiliado da ABC

O trabalho do cientista envolve muito mais do que só teoria, método e experimentação. É uma atividade profundamente colaborativa, exigindo uma boa dose de tato e compreensão das relações humanas. São essas relações que pavimentaram a trajetória de Francisco Thiago Sacramento Aragão, novo membro afiliado da Academia Brasileira de Ciências, não apenas no trabalho, mas na família, nas amizades, na religião e em todos os aspectos da sua vida.

Nascido em Fortaleza, Thiago conta que teve uma infância divertida junto aos amigos: adorava soltar pipa e jogar futebol. Sua primeira inspiração científica foi a mãe pediatra, que desde cedo levava o filho para congressos e eventos médicos. “De início, pensei em seguir o mesmo caminho que ela, mas logo percebi que tinha mais afinidade pelas ciências exatas. Era atraído pelo raciocínio lógico e pela possibilidade de encontrar soluções para problemas complexos”, contou.

A escolha pela engenharia civil também passou, indiretamente, pela convivência com a mãe. Ela havia desejado ser engenheira antes de ser convencida a cursar medicina. “Quando eu era novo, creio que a minha admiração por ela me levou a pensar que, de algum modo, poderia ajudá-la a realizar este sonho”, lembra Thiago, que acabou se apaixonando pela área.

Ao entrar no curso da Universidade Federal do Ceará (UFC), Thiago conheceu aquele que seria sua segunda grande inspiração científica: o professor Jorge Barbosa Soares, seu primeiro orientador no Laboratório de Mecânica dos Pavimentos. Jorge o apresentou à linha de pesquisa com a qual faria carreira. “O dinamismo e as falas cheias de conteúdo e paixão me estimularam bastante. Até hoje, lembro e reproduzo frases e conhecimentos que aprendi com ele”, contou, com carinho.

O começo do trabalho no laboratório foi desafiador, e Thiago resolveu começar a estudar por conta própria sobre asfalto em uma biblioteca pública de Fortaleza. Outra forma de aprender era acompanhando o time do laboratório em visitas a refinarias e usinas, ou acompanhando o técnico de laboratório Rômulo, cuja habilidade e paciência para explicar o deixavam muito à vontade. “Eu ficava maravilhado com as histórias e a desenvoltura de todos. Observei, observei e cheguei à conclusão de que queria aquilo para a minha vida”.

Após um ano acompanhando as atividades do laboratório de forma voluntária, Thiago conseguiu uma bolsa de iniciação científica e começou de fato a realizar atividades de pesquisa, supervisionado pela então mestranda Verônica Castelo Branco, com quem colaborou por anos. “O meu TCC foi alinhado com a dissertação de mestrado da Verônica, um estudo sobre o uso de escória de aciaria na pavimentação. Eu a ajudava no que precisava, no ar-condicionado ou sob o sol escaldante, estávamos sempre juntos e ela sempre me ensinando”, lembrou.

Antes de completar a graduação, Thiago foi contemplado com uma oportunidade única: um intercâmbio nos EUA. O professor Jorge havia conseguido uma parceria com o professor David Allen, da Universidade de Nebraska, em Lincoln, e Thiago foi um dos três brasileiros escolhidos para essa experiência internacional. “Fui para Nebraska com 21 anos para passar seis meses. Voltei sete anos depois, casado com a mulher mais linda do mundo, a Gabriella Moreira, com uma filha de cinco meses, a Giovanna Aragão, e com o nosso querido cachorro mais velho, o Chambinho”.

Em Nebraska, além de construir família e relações que carregou para a vida inteira, Thiago conheceu aquele que seria seu orientador de mestrado e doutorado, e quem considera sua terceira grande influência científica: o professor Yong-Rak Kim. “Eu o conheci como professor de uma disciplina ainda no semestre de graduação nos EUA. Ao final da disciplina, ele me convidou para ser seu aluno de mestrado e me ofereceu uma bolsa para estudar a chamada Zona de Restrição em curvas granulométricas de misturas asfálticas para vias de baixo volume de tráfego”, conta.

A obstinação e a dedicação ao trabalho do Dr. Kim foram ensinamentos de grande valia para o novo Acadêmico até hoje. “Ele chegava cedo, liderava múltiplos projetos e pessoas, ocupava funções em comitês diversos, mas sempre estava com a porta aberta, sempre escutava sugestões e investia no crescimento dos seus liderados. É um homem honesto e de palavra”, disse Thiago sobre seu mestre.

Sob orientação de Kim, Thiago concluiu mestrado em 2007 e doutorado em 2011 – este último em cerimônia repleta de familiares, que o emocionou bastante. O engenheiro contou que teve oportunidade de seguir em um pós-doutorado na Universidade de Nebraska e até chegou a tirar uma autorização de trabalho para o país. Também foi convidado para trabalhar como pesquisador em um grupo de pesquisa da Universidade Texas A&M. Mas uma oportunidade de se tornar professor de uma renomada instituição brasileira o fez retornar ao país. “O que realmente mexeu comigo foi um concurso para o Programa de Engenharia Civil da Coppe/UFRJ. Como eu poderia não tentar trabalhar nesta instituição? Não tive como resistir e desisti das oportunidades nos Estados Unidos para vir prestar concurso”, lembrou Thiago.

E foi assim que, sete anos depois de ir para os EUA, Thiago voltou de lá com esposa, filha e cachorrinho para tentar a sorte no Rio de Janeiro. Os três meses que se seguiram foram os mais agitados de sua vida. Sem endereço fixo, Thiago dedicava-se exclusivamente aos estudos enquanto morava com a família em apartamentos cedidos por amigos e familiares. Três meses também foi o tempo que demorou para que todos os seus móveis chegassem de navio dos EUA, então tiveram que se virar apenas com as malas que vieram no avião.

“No meio deste pequeno caos, sempre que podia, eu me isolava em uma biblioteca próxima de casa. Estudei com foco extremo. Chegava cedo na universidade e voltava à noite para a minha família. Preparei um arquivo de powerpoint para cada tópico do concurso, pois não queria ser surpreendido na prova didática. Também preparei dezenas de folhas resumindo os tópicos que poderiam ser abordados. Fui aprovado em dezembro de 2011, um momento especial!”, lembrou, com gosto.

Naquele momento, Thiago Aragão percebeu que iniciava um novo ciclo, passando de orientado para orientador e líder de pesquisa. Um turbilhão de pensamentos passava pela sua cabeça. Como desenvolveria projetos para seus orientandos? Como obteria recursos para manter e expandir um laboratório? Como estimular sua nova equipe?

Desde então, Aragão foi responsável por formar 13 mestres e oito doutores, alguns dos quais já se tornaram professores em universidades renomadas do país. “Entendi que o meu papel na orientação não era dominar completamente os assuntos de meus alunos, mas ajudá-los a voarem mais alto, a aumentarem sua autoestima, a se tornarem independentes e a produzirem conhecimento inédito”, relatou. “O melhor professor é aquele que produz pupilos ainda melhores do que ele”, afirmou Aragão.

Dessa forma, sua trajetória de pesquisa foi enveredando por caminhos que antes não havia sonhado trilhar. Hoje, Thiago Aragão pesquisa desde características microscópicas dos materiais, passando pela identificação de novos parâmetros para seleção de ligantes utilizados em grandes rodovias do país, pela busca por asfaltos menos poluentes e até pelo uso de inteligência artificial nas análises de pavimentos. “São pesquisas desafiadoras, mas que nos dão muito prazer. Sinto-me honrado por poder contribuir de maneira objetiva com a nossa sociedade, e aproveito para agradecer todo o corpo técnico e científico do laboratório. Sem eles, nada seria possível”, destacou.

A pavimentação asfáltica é um campo que continua fascinando o novo membro afiliado da ABC. Assim como nas diversas outras áreas da engenharia, ela envolve uma mescla robusta de conhecimentos teóricos e experimentais, desde estudos exploratórios até análises aplicadas e processos que traduzem esse conhecimento para a prática, que requerem o trabalho de muita gente comprometida. “Toda essa complexidade é necessária para termos estradas cada vez mais seguras e resistentes ao tráfego de veículos e a agentes ambientais”, explicou. “A pavimentação é crucial para acessibilidade de locais remotos, levando desenvolvimento aos quatro cantos do país”.

Agora na ABC, Thiago conta que ficou honrado ao receber a indicação. “Quando fui eleito, um filme passou na minha cabeça. Lembrei de pessoas que me ajudaram durante a carreira e todos os desafios nestes vinte anos. Todas as inseguranças e incertezas, e todas as portas que me foram abertas. É uma conquista profissional maravilhosa e pela qual sinto muita gratidão”.

Ele conta que gostaria de atuar na atração de jovens para as áreas da tecnologia, como já faz pela UFRJ em atividades que desenvolve junto a escolas de ensino fundamental e médio. “Pretendo defender sempre a importância de a sociedade dar ouvidos aos cientistas e não aos negacionistas”, defendeu.

Mas nem só de ciência vive o cientista. Nas horas vagas, Thiago Aragão gosta de estar rodeado por familiares e amigos, e sempre que possível visita sua cidade natal, Fortaleza. Desde que voltou ao Brasil, a família cresceu: 12 anos depois de Giovanna, nasceu Manuella, em maio de 2023. Também foi adotado o Marley, um lindo cachorrinho Maltês.

Para o futuro do Brasil, Thiago Aragão tem um desejo: “Que a ciência e a tecnologia sejam sempre tratadas com muito carinho pela sociedade brasileira”, finalizou o novo Acadêmico.