Agência Fapesp – Quando amigos passavam por momentos difíceis, [o falecido Acadêmico] Erney Plessmann de Camargo recomendava coragem, atributo que ele tinha de sobra e que dá título ao livro em sua homenagem, publicado pela Fundação Conrado Wessel. Falecido em março de 2023, aos 87 anos, Erney Camargo era um dos principais pesquisadores em malária e doenças negligenciadas no mundo.

Lançado sete meses depois, na cerimônia de entrega dos Prêmios FCW de 2023, Coragem! – Erney Plessmann de Camargo e o desafio de fazer ciência no Brasil reúne depoimentos de 28 amigos, parceiros de ciência e de seus filhos, além de excertos de documentos que reconstituem suas trajetórias acadêmica e pessoal, ambas brilhantes.

O livro está organizado em 11 capítulos, cada um deles enfatizando uma fase ou um aspecto de sua vida. “Medicina e Saúde” reproduz trechos de uma entrevista de Erney Camargo à revista Pesquisa Fapesp em 2015, em que ele conta ter escolhido parasitologia como área de pesquisa por identificar-se com o “departamento vermelho”, do qual faziam parte [os Acadêmicos] Luiz Hildebrando Pereira da Silva (1928-2014), Ruth (1928-2018) e Victor Nussenzweig, além de Maria (1916-1995) e Leônidas Deane (1914-1993) e Luis Rey (1918-2016), “gente muito boa e intelectualmente diferenciada”.

O comprometimento social que pautou a atuação do grupo liderado por Samuel Pessoa (1898-1976) é sublinhado nos depoimentos de Luís Marcelo Aranha Camargo e Anamaria Aranha Camargo, filhos de Erney; além de Drauzio Varella, Moisés Goldbaum, Isaac RoitmanWanderley de Souza e Marco Antonio Zago.

O capítulo “Ditadura e Exílio” trata da cassação de boa parte dos membros do “departamento vermelho” pelo Ato Institucional nº1, em 1964, e traz trechos do depoimento de Erney à Comissão da Verdade da Universidade de São Paulo (USP) e de amigos que com ele conviveram no exílio e no seu retorno ao Brasil, no período em que esteve na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, entre eles, [os Acadêmicos] Carlos MorelHenrique KriegerHelena Nader, além de Marta Maria Geraldes Teixeira.

A estada em Ribeirão Preto foi curta: Erney foi novamente cassado pelo Ato Institucional nº 5. O capítulo “Cientista e Professor” trata do período em que ele esteve afastado do mundo acadêmico e de seu reingresso, em 1970, a convite de José Leal do Prado (1918-1987), para a então Escola Paulista de Medicina. Lá ficou por 15 anos: deu aulas, remontou o Departamento de Parasitologia e orientou pesquisas, como relatam suas ex-alunas Clara Lúcia Barbiéri Mestriner e Marta Maria Geraldes Teixeira, além dos amigos Soraya Soubhi Smaili, Rubens Belfort Mattos JúniorCarlos MorelJorge Guimarães, [os últimos três também membros da ABC, como Erney].

Entre 1982 e 1983, Erney foi trabalhar como pesquisador associado no Instituto Pasteur, em Paris, onde iniciou-se nas novas técnicas da biologia molecular, antes de voltar à USP, em 1985, por meio de concurso para professor titular. Os depoimentos são [dos também Acadêmicos] Marcello Barcinski Nísia Trindade Lima, entre outros.

O capítulo “Gestão e Política Científica” enfatiza uma outra face de Erney: a de gestor. Ele foi chefe do Departamento de Parasitologia, vice-diretor do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) e pró-reitor de pesquisa da USP, nas gestões [dos Acadêmicos] José Goldemberg e Roberto Leal Lobo e Silva Filho, diretor do Instituto Butantan e presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Os depoimentos são de José Roberto Drugowich de Felício, Franco Maria Lajolo, Vahan Agopyan, Carlos Vogt, Marco Antonio Zago, Osvaldo Shigueru Nakao, Manoel Domingos, [os Acadêmicos] Manoel Barral NettoWanderley de Souza, e Álvaro Toubes Prata, entre outros.

“Amazônia e África” deixa claro o compromisso social do pesquisador no enfrentamento da malária em Rondônia, na década de 1980, ao lado do velho companheiro do “departamento vermelho”, Luiz Hildebrando. Além de dezenas de artigos sobre doenças infecciosas na Amazônia, eles conseguiram apoios para instalar um posto avançado de pesquisa do ICB-USP na cidade de Monte Negro, que também realiza atendimento gratuito em saúde para a população.

Em 2004, quando presidente do CNPq, Erney criou o ProÁfrica, com a intenção de aumentar a capacidade científica e tecnológica dos países africanos por meio do financiamento da mobilidade de cientistas e pesquisadores com atuação em projetos em áreas selecionadas. Entre os depoimentos, destaca-se o de Maria Lucilene de Araújo Barros, que acompanhou Erney em viagens a Moçambique e Angola.

“Encontro e Amigos” reúne depoimentos sobre o convívio com Erney e em “Ciência em Família”, seus quatro filhos, todos eles pesquisadores, falam da influência do pai em suas carreiras. No último capítulo, “Fundação Conrado Wessel”, Drugowich, Soraya Smaili, [o Acadêmico] Rubens Belfort Mattos Júnior e Lajolo, membros do conselho curador, e Vogt, que sucedeu Erney Camargo no cargo de diretor-presidente, falam sobre a gestão de Erney à frente da Fundação.

Vogt também assina a “Introdução”. “O Erney era um sábio com uma vocação social muito grande. Tudo que Erney fez, ele fez bem.”

O livro Coragem! está disponível para download gratuito no site da Fundação Conrado Wessel: www.fcw.org.br/post/fcw-lan%C3%A7a-livro-sobre-erney-camargo.