Na quarta-feira, 19 de julho, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) sediou o Simpósio e Diplomação dos Novos Membros Afiliados da ABC para o período de 2017 a 2021 da Região Minas Gerais e Centro-Oeste (MG & CO). Compuseram a mesa do evento o vice-presidente da ABC João Fernando Gomes de Oliveira; o diretor de Ciência, Tecnologia e Inovação da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e Acadêmico, Paulo Sérgio Lacerda Beirão; e a pró-reitora de pós-graduação da UFMG, Denise Maria Trombert de Oliveira.
Recepcionando os novos componentes do quadro da Academia, o vice-presidente da ABC reforçou a dificuldade do momento, dada a situação econômica e política que o Brasil e a ciência brasileria estão passando. Ele destacou ainda como a Academia tem se posicionado nesse momento. “Hoje a ABC, junto com SBPC, tem expressado sua opinião para os gestores do país. E nós precisamos ter uma posição séria, coerente e forte”, afirmou. Oliveira pontuou que o momento de crise é também uma chance de repensar como fazer ciência e inovação no Brasil: “E nós queremos mais gente fazendo isso”, enfatizou.
Diretor da Fapemig, o Acadêmico Paulo Beirão contou que a Fundação procura estimular a cooperação e não a competição entre os pesquisadores. Segundo ele, a parceria na ciência é uma ferramenta essencial. Beirão disse ainda que a ABC hoje integra seniores e jovens, que contribuem em diversos níveis. É uma iniciativa muito importante da Academia trazer sangue novo”, afirmou.
Pró-reitora de pós-graduação da UFMG, Denise Trombert de Oliveira reforçou a posição dos colegas. Para ela, há a necessidade da comunidade científica se posicionar diante da situação do país e por isso acha importante a entrada de novos membros nesse esforço coletivo. “Um país que não prevê crescimento com investimentos na ciência é um país fadado a encolher e não podemos permitir isso”, afirmou.
Era das fake news e pós-verdades: como enfrentar?
O Acadêmico Virgílio de Almeida foi convidado a palestrar no evento e falou sobre o perigo das fake news e pós-verdades na comunicação do século 21. Engenheiro e cientista da computação, Virgílio salientou que o crescente e rápido avanço tecnológico facilitou que informações não baseadas em fatos concretos e experimentos se propaguem como verdades.
Segundo Almeida, as fake news são notícias fabricadas ou manipuladas de forma a favorecer determinada visão política ou mercadológica e atende a certos interesses. Já as pós-verdades são fenômenos de propagação de uma determinada opinião que também não levam em conta dados e experimentos e que apelam para uma visão e posição política de grupos.
Como exemplo, Almeida citou estudo publicado na revista The Lancet, em 1998, por um pesquisador britânico, que conduziu estudo sobre a relação do autismo com doenças como sarampo e rubéola. A pesquisa foi feita com uma amostra restrita, de 12 indivíduos, mas ainda assim começou a ser usada como base para argumentações contra campanhas de vacinação. Mesmo tendo sido retirada da revista posteriormente, o estudo se propagou amplamente.
Almeida argumentou ainda que o bloqueio e a tendência, cada vez mais crescente, de “viralização” de noticias e opiniões sem base experimental é um desafio e uma missão para os pesquisadores. “Os pontos que afetam a sociedade como um todo requerem a opinião dos cientistas, de forma clara e sólida. Quando os pesquisadores não se manifestam, eles estão cometendo uma omissão”, apontou.
O Acadêmico explicou ainda que as redes sociais são os espaços principais de propagação desses conteúdos e, para ele, é preciso que sejam também espaços onde os cientistas se posicionam. É neste ambiente que entra a influência dos algoritmos, sequências de instruções com regras abstratas. Segundo Almeida, no aprendizado de máquinas (machine learning) tudo é baseado em dados. “Elas apreendem esses dados e os usam para gerar novos funcionamentos. Isso ocorre de forma personalizada e o principal risco disso é a opacidade, isto é, a falta de controle humano sobre esses dados”, explicou.
Redes sociais e ferramentas de busca como Facebook, Twitter e Google funcionam sob esse sistema. Dessa forma, quanto maior o volume de buscas e interações dos usuários referentes a um determinado tema, maior será também o volume de conteúdo que o próprio aplicativo mostrará em seu feed de notícias. Isso cria o que é chamado de “câmara de eco”, que impossibilita ampliar a variedade de informações e, principalmente, influencia o universo de informações ao qual uma pessoa está exposta.
Almeida lembrou que esse sistema de algoritmos é usado também em importantes processos decisórios, como a concessão de vistos migratórios e no sistema judicial americano, no qual juízes usam alguns mecanismos de algoritmos, que ajudam a decidir o tamanho de uma pena ou a probabilidade de uma pessoa ser culpada ou não de um crime. Esses programas usam dados antigos e é comprovado que tendem a apresentar resultados que culpam mais negros do que brancos.
Ao concluir sua fala, o Acadêmico afirmou que a principal missão e também desafio do cientista é difundir para o público em geral a importância da comunicação bem fundamentada. “É necessário que haja um processo de maior responsabilização dessas questões e é preciso mostrar ao público o valor da pesquisa científica baseada em evidências. O cientista precisa aprender a se comunicar com as pessoas e traduzir o trabalho que ele produz”, argumentou Almeida.
Academia, indústria e inovação
Fechando a rodada de apresentações, João Fernando Gomes de Oliveira falou da relação entre a pesquisa e a indústria e apresentou o funcionamento da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii). A instituição atua como uma ponte que conecta pesquisadores da academia com o meio industrial, facilitando e, principalmente, diluindo as burocracias que atrasam o avanço de projetos e pesquisas.
Oliveira lembrou que a ciência tem um grande valor como produtora de conhecimento, mas que isso não pode anular seu aspecto aplicado. Para o vice-presidente da ABC, a cooperação e a interdisciplinariedade são fundamentais para resolver um problema da melhor forma possível. “Esse paradigma de cooperação precisa ser introduzido, com vários grupos de diferentes áreas integrados para solucionar um mesmo problema”, disse.
Oliveira explicou à plateia que a Embrapii atua selecionando projetos já organizados e em funcionamento, injetando um estímulo ao fornecer a verba necessária para que esse projeto se desenvolva. Por não se tratar de investimento público, os processos se tornam menos demorados e burocráticos e os gestores das pesquisa têm mais autonomia para decidir de que forma organizar o investimento em sua pesquisa.
“A nova geração precisa se conectar, fazer ciência de qualidade, propor valor, se relacionar com as empresas”, concluiu o vice-presidente da ABC.
Conheça os novos membros afiliados da Regional MG&CO
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