Os laureados com o Prêmio Nobel de Física de 2023 foram anunciados neste dia 3 de outubro pela Royal Swedish Academy of Sciences. Os franceses Anne L’Huiller e Pierre Agostini, e o húngaro Ferenc Krausz, foram agraciados por experimentos capazes de capturar pulsos extremamente rápidos de luz, que permitem observar as dinâmicas de elétrons como nunca havia sido possível.
Para se ter uma ideia da escala de velocidade, estamos falando de attosegundos. Essa unidade de medida de tempo é tão curta que existem tantos attosegundos em um segundo quanto segundos desde a origem do universo!
A escala dos attosegundos é necessária quando analisamos eventos que ocorrem dentro de átomos e moléculas, cuja velocidade é tão grande que dificulta a análise pelas tecnologias convencionais. Os cientistas tiveram sucesso na produção e captação de pulsos de luz com apenas algumas centenas de attosegundos, que podem ser utilizados para gerar um “retrato” em altíssima resolução das propriedades microscópicas da matéria.
Em 1987, Anne L’Huillier descobriu que muitos tons diferentes de luz surgiam quando ela transmitia uma luz laser infravermelha através de um gás nobre. Cada tom é uma onda de luz com uma determinada frequência para cada ciclo da luz laser e são causados pela interação da luz laser com os átomos do gás, que fornece a alguns elétrons uma energia extra que é então emitida como luz. O trabalho de L’Huillier preparou o terreno para avanços subsequentes.
Em 2001, Pierre Agostini conseguiu produzir e observar uma série de pulsos de luz consecutivos, em que cada pulso durava apenas 250 attossegundos. Ao mesmo tempo, Ferenc Krausz trabalhava com outro tipo de experimento, que permitia isolar um único pulso de luz com duração de 650 attossegundos. Esses desdobramentos permitiram à ciência imaginar toda uma série de novos experimentos até então impossíveis, servindo de vanguarda para compreensões inovadoras sobre a matéria, cujas possibilidades de aplicação se espalham desde as engenharias até a medicina.
O físico e ex-presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz Davidovich, explicou em detalhes a premiação:
“Este Prêmio Nobel para a área de pulsos ultracurtos já era esperado há algum tempo. A Anne L’Huillier realizou os primeiros experimentos que possibilitaram a construção desses pulsos e, baseado nesse trabalho, Pierre Agostini e Ferenc Krausz conseguiram produzí-los. Esses pulsos são medidos em attosegundos, um intervalo de tempo extremamente curto. Para se ter uma ideia, existem tantos attosegundos num segundo quanto segundos desde a origem do Universo.
Esse intervalo mínimo de tempo é necessário para entender a dinâmica dos elétrons em átomos, ajudando a explorar esse mundo extremamente microscópio. A razão para isso é mais ou menos a razão pela qual uma fotografia com exposição curta nos permite observar as asas de um beija-flor em pleno voo. Ela permite imobilizar as asas.
Da mesma forma, esses pulsos de laser nos permitem acompanhar as dinâmicas do elétron nesses intervalos muito curtos. O trabalho da L’Huillier consistiu em mandar um pulso de laser num gás de átomos e observar a radiação resultante. Na luz visível essas frequências estão associadas à cor da luz, então ela irradiou os átomos com o laser na região do infravermelho e obteve várias frequências, chamados harmônicos, que funcionam como as cordas de um violão. Observou-se que a soma desses harmônicos, um fenômeno chamado de interferência, produz esses pulsos ultracurtos de radiação.
Essa era uma pesquisa em ciência básica, cujo interesse era estudar as propriedades dos elétrons. Hoje em dia, já se pensa em aplicar essa técnica para estudar o início das reações químicas, fase em que os elétrons têm uma importância grande. Outra aplicação pensada é na análise de componentes do sangue, permitindo o diagnóstico de doenças. Também pode ser aplicado na área de semicondutores, fundamental para a economia global.
As diversas aplicações aparecem uma após a outra, por isso é importante ressaltar que elas são todas fruto da pesquisa básica, cuja motivação inicial não foi outra senão a curiosidade dos cientistas em torno de como funcionam os átomos.
Luiz Davidovich, ex-presidente da ABC”