O processo de urbanização atualmente acontece quase exclusivamente nos países pobres e em desenvolvimento. Na maior parte das vezes, ele se dá de forma desordenada, dando origem a tensões sociais, assentamentos informais e aumento de desigualdade. A necessidade de planejamento urbano, baseado em ciência atual e que olha especificamente para a realidade do Sul Global é uma das ênfases da Declaração sobre Implicações da Urbanização em Países de Baixa – e Média – Renda, publicada em 5 de outubro pela Parceria InterAcademias (IAP), e endossada pela Academia Brasileira de Ciências (ABC).
“Cidades e Comunidades Sustentáveis” é o 11º Objetivo do Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas.
A urbanização na África e Sudeste Asiático
Apesar de historicamente ligado à industrialização e ao desenvolvimento econômico, a urbanização que vem ocorrendo hoje nessas regiões se deve mais a explosão demográfica e empobrecimento do campo do que às oportunidades oferecidas pelos grandes centros. “A persistência de um urbanismo baseado nas metrópoles europeias, como Paris, é insuficiente para analisarmos esses casos”, explica o engenheiro e cientista social Eduardo Cesar Leão Marques, indicado pela ABC para participar da elaboração do relatório
Estima-se que, até 2035, as dez cidades em mais rápido crescimento no planeta estarão na África. A maioria dessas cidades já é desproporcionalmente maior do que quaisquer outros centros urbanos ao redor. Estimular o crescimento ordenado e conjunto das cidades de médio porte, assim como combater a pauperização do campo, devem ser os objetivos principais do planejamento urbano, segundo o documento. Outro desafio é institucionalizar modelos decisórios democráticos e participativos, que de alguma forma mitiguem a exclusão geográfica de populações marginalizadas.
A urbanização no Brasil
No Brasil, a transição demográfica está mais avançada, e tratar a migração campo-cidade é menos relevante do que resolver as já sedimentadas contradições internas dos centros urbanos. A enorme desigualdade de acesso a serviços públicos, infraestrutura e moradia, bem como a incapacidade dos governos em lidar com essas questões são características que aproximam o fenômeno urbano na América Latina do resto do Sul Global. “As megacidades são microcosmos dos problemas estruturais à nível nacional”, explica a Acadêmica Elisa Reis.
A vulnerabilidade contra desastres naturais e epidemias também é abordada no documento. Deslizamentos de terra são problemas históricos no Brasil, e o aumento no nível do mar, resultante das mudanças climáticas, pode ter consequências ainda não previstas em nossas zonas costeiras. A alta densidade populacional, aliada à falta de serviços adequados de saúde nas zonas periféricas, também facilita o alastramento e o impacto de novas doenças, como foi o caso com a Covid-19.
“Reduzir a precariedade, com investimentos em infraestrutura pública e transporte, urbanização de comunidades vulneráveis e acesso à moradia popular são os principais desafios do Brasil. O país já experimentou programas nesse sentido, como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o Minha Casa Minha Vida. É preciso dar continuidade a esses esforços, com atenção especial à sustentabilidade e à transição verde, algo cada vez mais urgente na atualidade”, resumiu Eduardo Marques.