Confira o artigo da Acadêmica Vanderlan da S. Bolzani  publicado em 23/4, no JC Notícias. Vanderlan é professora-titular do Instituto de Química – Campus de Araraquara da Universidade Estadual Paulista (IQAr/Unesp), membro do Conselho da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e presidente da Academia de Ciências do Estado de São Paulo (Aciesp).

O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) faz 70 anos neste mês de abril. Desta vez, dadas as circunstâncias do momento em que o fato ocorre, uma crise sem precedentes na história do País, há pouco espaço para o espírito efusivo das comemorações merecidas. No entanto, pensar sobre a criação do CNPq pode nos ajudar a fazer uma pausa nesta sequência de notícias negativas e, assim, termos um bom motivo de celebração: a institucionalização da pesquisa científica brasileira.

Hoje, quando olhamos para aquele estranho país, em 1951, ano de fundação do CNPq, surgem muitas perguntas relevantes na tentativa de entender como foi o processo político e social que levou à construção passo a passo de uma estrutura eficiente de fomento à pesquisa nacional.

O Brasil de então, com 53 milhões de habitantes, metade dos quais não alfabetizados, vivia todos os dilemas de um país pobre que dependia da exportação de café para gerar divisas. As bases para o desenvolvimento industrial estavam todas por construir: mineração, siderurgia, energia, o petróleo em particular, transporte, educação. Os recursos das universidades para pesquisa científica eram irrisórios e, no ambiente das universidades estaduais paulistas só existia a USP. A Unicamp e a Unesp só foram criadas anos depois, em 1962 e 1976, respectivamente.

Ao mesmo tempo, no novo mundo polarizado da “Guerra Fria”, os avanços em ciência e tecnologia estabeleciam um divisor de águas radical que determinaria o destino das nações nas décadas seguintes. Devido, principalmente, aos efeitos trágicos da bomba atômica, esse status de C&T estava associado, sobretudo às conquistas da física no campo da energia nuclear.

Mas a realidade mostra que mesmo em um país com tantos obstáculos a superar era possível fazer escolhas políticas ambiciosas que construíssem o alicerce para futuros avanços na formação científica.

Assim, a criação do CNPq e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) marca uma postura afirmativa de fomento à pesquisa e uma opção tão almejada em um período de tantos desafios e de tantas urgências. Postura que vinha embalada no entusiasmo pelo “desenvolvimento” e na crença de que era possível reverter o grande nível de desigualdade que nos separava das economias centrais pelo conhecimento e pelo fomento à pesquisa em todas as áreas. Quanto dessa crença ficou como herança na memória coletiva da nossa identidade de brasileiros? Acredito que muitas, e o CNPq é um hoje um patrimônio conquistado por este Brasil continental.

Uma formulação adequada dessa iniciativa, que norteou cientistas e políticos da época, pode ser vista no livro “Prelúdio para uma História, Ciência e Tecnologia no Brasil”, organizado pelo historiador Shozo Motoyama.

“A questão central poderia resumir-se neste ponto. Nenhum projeto científico ou tecnológico de envergadura, incluindo o de energia nuclear, teria êxito se não contasse com o número suficiente de cientistas, pesquisadores e tecnólogos. Nos países subdesenvolvidos, a prioridade máxima está na formação de recursos humanos – eis a variável essencial da política científica e tecnológica dessas nações.” (Edusp, 2004, pág. 294)

Ilustrando esse impulso, além da Capes, aquele momento viu surgirem também o Centro Tecnológico da Aeronáutica (CTA), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), o Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa) e o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Ou seja, estava nas mãos dos políticos, planejadores e cientistas tomar decisões, mesmo em situações adversas, que teriam implicações essenciais no futuro e que tornou o Brasil um país do Sul-americano tão importante.

O aniversário de setenta anos do CNPq pode ser visto de várias formas, mas assinala, principalmente nesse momento da vida do País, a importância de não esquecermos, de não perdermos o fio condutor da memória para preservamos o que foi tão duramente conquistado. Parabéns ao CNPq pelos seus 70 anos e à comunidade científica brasileira por este legado!

Leia a matéria da ABC sobre a Cerimônia de Comemoração dos 70 ANos do CNPq