Na última sexta-feira de fevereiro (26), ocorreu a 5ª Mentoria da ABC, intitulada “Saúde Mental na Academia: o impacto da pandemia e estratégias para o futuro”. A palestra foi ministrada pela pesquisadora e psiquiatra Gisele Gus Manfro, doutora em ciências biológicas/bioquímica e medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e professora do Programa de Pós Graduação em Ciências Médicas/Psiquiatria da UFRGS. Manfro também coordena o Programa de Transtornos de Ansiedade (Protan) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).


Conflito natural foi agravado pelo isolamento

Durante as quase duas horas de palestra, Manfro abordou os principais estressores que despertam distúrbios como ansiedade em jovens acadêmicos, as formas como a pandemia agravou esse quadro e sugestões de como transformar a academia em um ambiente mais agradável tanto para os universitários, quanto para os professores – que também sentiram os impactos do isolamento.

Manfro apresentou as principais evidências de crise de saúde mental durante a graduação. Ela explicou que sentir-se capaz e confiante são sentimentos diretamente relacionados à carga de estresse e a pensamentos negativos, como “não sirvo para isso”. Os dados apresentados pela pesquisadora mostraram que, quando separados por gênero, quase metade dos alunos transgêneros ou mulheres sofrem de ansiedade e/ou depressão. Cerca de 57% dos universitários transgêneros sofrem de ansiedade. 


‘É ok não estar ok”

A frase usada pela psiquiatra simboliza que aceitar que tem um problema e buscar ajuda é o primeiro passo que o aluno consiga melhorar sua qualidade de vida. Contudo, faltam iniciativas por parte das universidades para promover a melhoria da saúde mental do corpo discente e docente. A pesquisadora sugere a criação de grupos de apoio, programas de suporte para alunos que vieram de outros estados e a criação de uma linha telefônica de suporte de crise, tal como existe nos EUA.  

Para muitos, a quarta onda de COVID já é uma realidade: o surgimento de doenças mentais, o burnout (estado de estresse crônico), e o trauma físico provam isso. A pandemia afetou ainda mais a saúde dos acadêmicos e jovens pesquisadores, conforme mostra um gráfico apresentado na matéria “Pandemic fear and COVID-19: mental health burden and strategies”, publicado no Brazilian Journal of Psychiatry, mostrando a gravidade do estresse durante o confinamento. Confira:

Um estudo apresentado pela Nature em agosto de 2020 analisou os principais sintomas de ansiedade e outros problemas psicológicos frequentes durante a pandemia e os dividiu em grupos. Ansiedade, depressão e dificuldade no trabalho remoto compõem o principal quadro apresentado por mulheres e população LGBTQIA+; a depressão é o mal que mais acomete estudantes das áreas da ciência/física, enquanto profissionais da área biomédica são mais afetados pela ansiedade.


Ampliação das redes de apoio

Entre as propostas de melhoria apresentadas por Gisele Manfro, foi mencionado o artigo de 2018 da Nature, que lista práticas saudáveis para serem incorporadas no ambiente de pesquisa com base em conversas com inúmeros cientistas. Entre as principais sugestões, estão a incorporação de a prática de train-the-trainers (atualizar as práticas didáticas dos professores, para que eles estejam mais preparados para lidar com os jovens em seus projetos); a aposta em um número de maior de mentores para orientar os universitários; a educação sobre vida acadêmica e novas síndromes que podem afetar os jovens (burnout, pressão, excesso de dados); e a promoção um balanço entre a vida universitária e a vida pessoal. A adoção de tais práticas tornariam o ambiente acadêmico mais acolhedor para jovens e também para os professores. 

O debate foi fomentado pela participação dos ouvintes, que compartilharam suas experiências pessoais durante o último ano de isolamento. Como estão lidando com o estresse? Como se adaptaram às aulas e reuniões on-line? Como ficaram os diálogos com seus grupos de pesquisa durante a pandemia?

Os participantes também puderam compartilhar iniciativas de preservação da saúde mental que vêm se destacando ao longo na pandemia, como o Protaia (@protaia no Instagram) da USP. O Programa de Transtorno de Ansiedade na Infância e Adolescência utiliza uma linguagem jovem e leve para falar sobre transtornos mentais. Ao trazer exemplos de filmes e personagens da cultura pop que abordem o assunto e incentivar crianças e adolescentes a buscarem ajuda, o PROTAIA se torna uma das iniciativas principais para consolidar a conscientização sobre a importância da saúde mental no ambiente escolar desde a infância.

E você, leitor? Conhece algum projeto na área de saúde mental que tenha feito a diferença durante a pandemia? Como o seu grupo de estudos está lidando a atual situação? Envie-nos um comentário!