O Acadêmico Luiz Eugênio Mello e Antônio José da Costa Filho, membro afiliado da ABC entre 2011 e 2015, se reuniram no dia 2/9 em um encontro virtual promovido pelo Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEARP/USP), polo Ribeirão Preto, e pela Cátedra Sérgio Henrique Ferreira. O objetivo era discutir os riscos à ciência e ao ensino superior que podem ser causados pelo projeto de lei (PL) 529/2020 em tramitação na Assembleia Legislativa de São Paulo desde agosto deste ano. Entre as mudanças, o artigo 14 do PL propõe o recolhimento de reservas financeiras das universidades e agências paulistas de apoio à pesquisa para a cota única do tesouro estadual. 

Além de Mello, diretor científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), e Costa Filho, coordenador do IEA-RP, estavam o titular da Cátedra e integrante do Conselho Superior da Fapesp, Mozart Neves Ramos, e o ex-coordenador do IEA-RP, Oswaldo Baffa Filho. 

“A comunidade científica de São Paulo estava voltada para o combate à pandemia e, de repente, fomos chamados para a batalha contra os cortes para a ciência”, disse Costa Filho. Desde então, segundo ele, instituições científicas, como a Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a Academia de Ciências do Estado de São Paulo (Aciesp), têm se mobilizado para sensibilizar a população e os políticos contra os novos cortes. “A ideia do artigo 14 do PL 529 é tornar as reservas financeiras para o amparo à ciência em superávit, o que seria transferido para o pagamento de aposentadorias e pensões pelo Estado”, explicou.

Segundo o entendimento do Acadêmico Luiz Eugênio Mello sobre a proposta de lei, os recursos destinados à Fapesp para as pesquisas realizadas em São Paulo têm uma finalidade defendida pela Constituição Federal. “Uma lei não pode alterar a constituição”, disse. As universidades paulistas contam com o direito de “autonomia administrativa”, garantido pelas Constituições Federal de 1988 e pela Estadual, de 1989, que reafirmam a utilização independente dos recursos públicos. Nesse sentido, o artigo 14 da nova proposta violaria a Constituição.

Nesse cenário, o diretor científico da Fapesp, órgão que também seria afetado pela nova lei, acredita que é necessário o apoio da população, a partir do entendimento do que a ciência é capaz de produzir para a melhoria de vida das pessoas. “Nos últimos meses, ficou claro como a atividade científica tem contribuído no enfrentamento da pandemia”, afirmou. “A Fapesp tem compromissos com a ciência de longo prazo. Sem uma reserva financeira, muitas atividades seriam descontinuadas”, disse.

“Parece que estamos voltando ao passado”, disse Oswaldo Baffa. Docente da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da USP, Baffa acredita que uma medida como a da proposta de lei pode desconstruir o trabalho de cerca de 30 anos para a conquista da autonomia administrativa pelas universidades paulistas. “Esse direito garante o olhar da universidade como política de Estado, de longa duração e eficiente no uso de recursos públicos. Não podemos dar um passo atrás”, alertou o professor.

Para Mozart Ramos, no ano de 2021 haverá uma concorrência ainda maior por recursos públicos. “Ainda que consigamos tirar o artigo 14 do projeto de lei, devemos nos mobilizar permanentemente para o cenário complexo que se aproxima”, disse ele. “A Fapesp não é importante apenas para São Paulo, mas para todo o país. Devemos ficar atentos contra o comprometimento da ciência brasileira e de tudo o que ela vem fazendo em nosso país”, afirmou.

As receitas da Universidade Estadual Paulista (Unesp), da Universidade de Campinas (Unicamp), da USP e da Fapesp dependem da arrecadação do imposto sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS) pelo estado de São Paulo. A gestão de autonomia administrativa praticada pelas instituições paulistas permitiram que elas criassem, ao longo de anos, reservas financeiras para a manutenção de suas atividades e a gestão de seus serviços.  aprovação do projeto de lei 529/2020, segundo os gestores das universidades públicas paulistas, prejudicaria todo o sistema científico e de ensino superior de São Paulo e, consequentemente, do Brasil. 

 

Assista ao vídeo do encontro na íntegra: