No dia 6 de dezembro, acadêmicos de todo o mundo realizaram uma travessia de barco no rio Negro até a comunidade Tumbira, a duas horas de Manaus, para o segundo dia de debates do evento ”A ciência e os desafios do desenvolvimento sustentável da Amazônia”, com organização da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e da Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (SDSN-A), e com o apoio da Fundação Amazonas Sustentável (FAS).

Neste dia, o evento se deu no Núcleo de Conservação e Sustentabilidade (NCS) Agnello Uchôa Bittencourt, em homenagem ao professor da Universidade Federal do Amazonas que, na década de 70, dedicou-se ao desenvolvimento sustentável da Amazônia. Contando sua experiência e ambições para o projeto, o diretor-geral da FAS, Virgilio Viana, concedeu uma entrevista à ABC.

 

ABC | Quais, na sua opinião, foram os maiores feitos da Fundação Amazônia Sustentável?

VIANA | Nós fechamos o ano de 2014 tendo alcançado a marca de 575 comunidades beneficiadas pelo programa Bolsa Floresta e pelo programa de educação e saúde desenvolvidos pela Fundação Amazônia Sustentável. É um número muito expressivo e que só foi conseguido graças às muitas parcerias que estabelecemos ao longo deste ano, tanto com instituições governamentais quanto com empresas privadas e instituições não governamentais.

Os destaques são muitos. É difícil fazer um resumo em poucas palavras, mas gostaria de salientar, entre tantas outras coisas, a formatura do primeiro grupo de nossos estudantes no ensino técnico pós-médio. São jovens que tiveram uma formação de produção sustentável voltada para o açaí, pirarucu, borracha, madeira… enfim, para as atividades produtivas com maior viabilidade econômica naquela região.

Eles concluíram esse processo de formação educacional com a elaboração de planos de negócios, que estão agora sendo transformados em empreendimentos geridos por eles mesmos. Acredito que isso seja um destaque não apenas pelo resultado em si, mas pelo ineditismo da ação para a Amazônia como um todo.

 

ABC | Quais os objetivos da Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável da Amazônia?

VIANA | Nesse encontro, nós estamos trazendo representantes da Academia Brasileira de Ciências, da Academia de Ciências do Peru, da Bolívia, da Colômbia, do Equador e da Venezuela para participar de um projeto muito desafiador, que é o desenho de uma rede de intercâmbio entre as instituições de pesquisa, organizações da sociedade civil e os governos da bacia amazônica para que se possa trocar informações e experiências, visto que os problemas de muitos são parecidos.

Até o manejo de pirarucu que temos aqui na Amazônia é, grosso modo, o mesmo praticado no Peru ou na Colômbia. Com a troca de informações entre técnicos e pescadores, por exemplos, podemos colher grandes ganhos em produtividade. Ou seja, em vez de reinventar a roda, nós podemos nos inspirar e reproduzir experiências bem sucedidas nos países vizinhos.

 

ABC | O senhor mencionou que a estrutura do NCS foi planejada com base na realidade geográfica e cultural da região, o que requer o uso de tecnologias como a energia solar. O senhor acredita que este modelo possa ser replicado em grande escala?

VIANA | Essa estrutura é um núcleo de conservação e desenvolvimento sustentável. Ela foi inventada como resposta à realidade amazônica. Portanto, ela pode e deve ser replicada em outras regiões e estados.

A nossa visão é que cada unidade de conservação e território indígena deveria ter um núcleo como esse para servir como uma casa do saber, onde pesquisadores possam vir e compartilhar seu conhecimento e os moradores possam falar sobre suas experiências. Eu acredito que isso venha a servir de referência de uma era inédita, somando a ciência com o saber tradicional.

 

ABC | Qual o papel do capital privado na iniciativa?

VIANA | Vivemos uma seríssima crise ambiental e de sustentabilidade no planeta Terra. Vencê-la não é uma tarefa apenas dos governos; as empresas e a sociedade civil devem se envolver na busca de soluções para mudar radicalmente os processos de produção e consumo em todo o mundo.

As empresas mais modernas e sofisticadas já estão profundamente convencidas de que seu papel vai além da produção daquilo que é o seu negócio em stricto sensu, passando a ter uma visão mais ampla de seu desempenho nos processos econômicos de hoje.

Na FAS, nós temos a felicidade de ter um número grande de parceiros privados. Ela é uma fundação que desenvolve atividades fundamentalmente com recursos do setor privado e serve de exemplo sobre como as empresas podem contribuir com recursos cujo papel assume grande relevância no aumento da eficiência de programas públicos.

 

ABC | Há algum tipo de conflito com as populações locais durante a introdução dos núcleos ou outras estruturas da FAS ou a relação é completamente harmônica?

VIANA | A interação é extremamente harmônica, porque essas populações são historicamente abandonadas e com muito pouco acesso aos serviços de educação, saúde e outros. Como os núcleos trazem essas estruturas, eles são recebidos com muito carinho pelas comunidades. Apesar de ser uma novidade, não há nenhum tipo de estranhamento.

Assista, abaixo, aos vídeos do evento: