Dando continuidade à exposição das experiências do Programa ABC na Educação Científica no Planetário do Rio de Janeiro, no final de outubro, falaram Icléa Maso, da Organização do Auxilio Fraterno/Universidade da Criança e do Adolescente (Unica-BA), Lenir Abreu (Universidade Federal da Bahia e Centro Universitário Jorge Amado – BA), Sandra Reis Abreu (Universidade Estadual de Santa Cruz – BA), Anadir Vendruscolo (Centro Universitário de Jaraguá do Sul – SC), Carlos Wagner Araújo (Universidade Federal do Vale do São Francisco – PE/BA), David Morato e Ana Paula da Silva. Eles discutiram as dificuldades e conquistas encontradas por cada pólo, além de apresentarem especificidades de cada região.

Mão na Massa na Bahia

Icléa Maso – coordenadora do pólo de Salvador – ressaltou os aspectos positivos do programa e os bons resultados obtidos com as crianças. Agradeceu e parabenizou as instituições pioneiras no projeto: “a Estação Ciência foi a nossa mãe e o CDCC nosso pai neste processo, trazendo um conhecimento que nós levamos para Salvador”. Entretanto, Icléa reclamou de uma dificuldade encontrada também por outros colegas: a descontinuidade das políticas públicas, infelizmente uma prática comum em nosso país. Ela lamentou o fato do programa não ter recebido recursos da prefeitura da capital baiana neste ano de 2009, mas afirmou que o projeto continua sendo levado adiante no interior, na cidade de Camaçari, com recursos da Secretaria Municipal de Educação e das indústrias do pólo petroquímico da região.

Também da Bahia, Lenir de Abreu e Sandra Reis Abreu tocaram no mesmo tema ao apontar as dificuldades e preconceitos encontrados entre os próprios professores, tanto do ensino superior quanto do fundamental. “Muitos professores me questionaram no início, mas ciências não é para o ensino médio?”, contou Sandra sobre os primeiros passos do programa que atende crianças nos primeiros anos escolares. Por isso, a prioridade inicial do programa foi a formação de professores. Sandra também chamou atenção para a necessidade de unir as Ciências Humanas e as Exatas: “não basta um professor saber pedagogia, ele também precisa dominar o conteúdo que leciona”.

Apesar das dificuldades, a professora se sente muito satisfeita com o projeto. Ao demonstrar as conquistas do projeto, ela citou a exemplo do aluno Jean, um menino que antes não se interessava pela vida escolar e depois de ter contato com o programa ABC na Educação Científica-Mão na Massa decidiu tornar-se cientista. Sandra lembrou emocionada a conclusão de Jean depois do módulo Flutua ou Afunda: “Essa coisa que flutua ou afunda é igual a minha vida, aqui eu consigo flutuar, pensar”. Para encerrar sua apresentação, Lenir preferiu usar as palavras do poeta Carlos Drummond de Andrade e declamou o poema “Verdade”.

Educação científica em Santa Catarina

Vinda do Sul do Brasil, Anadir Vendruscolo relatou uma experiência um pouco diferente e disse não ter encontrado grandes dificuldades inicialmente, pois além do apoio do poder público, eles contavam com uma população local que cobrava a qualidade no ensino.”Em Jaraguá do Sul, Santa Catarina, os professores da rede municipal possuem pelo menos especialização ” destaca.

O foco do Mão na Massa, então, foi a formação de professores, para quebrar um ciclo vicioso de alunos que chegavam sem uma boa base de ciências no curso de pedagogia porque não tiveram bons professores e, não podendo suprir essa carência na faculdade, tornavam-se professores incapazes de ensinar e despertar crianças para a ciência. Para evitar isso, a secretaria destinou recursos para que professores formados na área de Ciências tivessem uma carga horária prevista para acompanharem os pedagogos de nível fundamental, auxiliando no conteúdo. Além disso, é feito um trabalho na universidade, junto aos alunos do curso de Pedagogia. “É preciso desafiar os professores. Porque senão as novas gerações também não terão uma boa formação” – constata Anadir.

Infelizmente, apesar do sucesso do programa na formação de professores e no ensino das crianças, ele perdeu o apoio da secretaria (devido à mudança de poder público e às chuvas no estado). Agora, os trabalhos continuam a ser desenvolvidos individualmente, pelos professores que perceberam a importância dessa metodologia no processo de aprendizagem. Mesmo com este revés, Anadir faz planos para no futuro poder levar o Programa a mais municípios, podendo integrá-los.

ABC na Educação Científica integrando interior e grandes centros em Pernambuco

Do vale do São Francisco, veio o relato de Carlos Wagner Araújo. A Univasf é uma iniciativa importantíssima, que faz parte de processo que busca reverter uma realidade brasileira: a concentração de pólos de pensamento nos grandes centros. A universidade está instalada em uma região semi-árida, a muitos quilômetros de distância das universidades mais próximas, Salvador (500km) e Recife (800km). Lá, o Programa ABC na Educação Científica-Mão na Massa atende a mais de um município – reafirmando o caráter da própria faculdade, que atravessa fronteiras (Bahia, Pernambuco e Piauí) e que conta com o apoio do poder público em apenas alguns deles. A preocupação da universidade é a formação dos professores e também a adequação dos temas à realidade local – foram criados módulos sobre o uso racional da água, por exemplo.

Entre os projetos específicos deste pólo estão o Teatro Científico, a Trupe da Ciência, o Curta Ciência, a Mostra Científica Itinerante e criação de espaços para a ciência, como o Espaço Ciência e Cultura (que funciona em uma casa doada pelo Governo de Pernambuco) e o Museu de Ciências na beira do Rio São Francisco (que ainda está na planta). Todos esses projetos buscam incentivar a criatividade e fazer uma união entre ciências e arte, além de levar o conhecimento para as escolas do sertão.

Uma constatação dos realizadores do projeto, inclusive, foi que os alunos da área rural se apropriaram mais do programa do que os das cidades. Nas escolas que o programa foi utilizado, foi percebida também uma queda na evasão escolar. “Os pais procuram mais a escola, ela ganhou mais credibilidade perante a sociedade”, disse Araújo, referindo-se a uma das escolas envolvidas.

Ele também destacou a dificuldade de continuidade do programa em cidades como Petrolina, em que há alta rotatividade de professores e mostrou-se entusiasmado com o projeto em conjunto com dez assentamentos do MST. Além disso, ressaltou a importância do intercâmbio com outras universidades e das mostras científicas produzidas nas próprias escolas, para que os professores possam mostrar o que está sendo produzido em sala de aula.

Superação e evolução

As diferentes experiências revelam dificuldades que o país ainda tem que superar, mas pelo entusiasmo e dedicação dos professores que se apresentaram, além dos bons resultados já encontrados, é possível perceber a importância e o alcance do Programa ABC na Educação Científica-Mão na Massa, que também está em vários outros países (como França e Estados Unidos) e, por aqui, ainda tem muito a crescer, melhorando o ensino de ciências e aproximando-a cada vez mais da sociedade.

* O V Seminário Nacional ABC na Educação Científica – Mão na Massa foi realizado com o patrocínio do Programa Desenvolvimento & Cidadania Petrobras

(Elisa Oswaldo-Cruz e Julia Dias para as Notícias da ABC)