Na 75ª Reunião Anual da SBPC, em Curitiba, realizada entre os dias 23 e 29 de julho, a Amazônia foi tema recorrente em inúmeras palestras. Mas a sessão sobre AMAZÔNIA SUSTENTÁVEL realizada na série de debates para a 5ª Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia (CNCT) foi uma das mais aprofundadas, até pela presença de três expressivos nomes: os Acadêmicos Adalberto Val, Ima Vieira e Paulo Artaxo, que foram propositivos e apontaram a construção de uma bioeconomia de floresta em pé e rios fluindo e saudáveis como o caminho para uma Amazônia sustentável.

Por um Instituto da Foz do Amazonas e uma Universidade de Integração Pan Amazônica

Para facilitar o entendimento do tema, o Acadêmico Paulo Artaxo (USP) definiu o conceito de SUSTENTABILIDADE: “O desenvolvimento sustentável é definido como aquele que procura satisfazer as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade das futuras gerações de satisfazerem as suas próprias necessidades.”

Ele apontou que o modelo de “desenvolvimento” que temos agora é predatório e insustentável, porque envolve roubo de terras públicas, garimpos ilegais, invasões de terras indígenas e presença forte do crime organizado. “Além do desmatamento, a degradação florestal hoje é chave na Amazônia. A interação entre as mudanças no uso da terra, que envolvem a expansão da agricultura e, portanto, as queimadas – e as mudanças climáticas são ingredientes críticos na transição da Amazônia”. Ele ressaltou que qualquer plano para o futuro da Amazônia tem que ser feito olhando o novo clima da região.

Os pontos elencados pelo palestrante para garantir o futuro da Amazônia envolvem a ampliação da rede de ciência e tecnologia na região para promover seu desenvolvimento, reduzindo assim as desigualdades sociais. “Temos que desenvolver rapidamente uma nova bioeconomia de floresta em pé e rios fluindo e saudáveis”, alertou.

E Artaxo indicou o caminho: “Precisamos de um Instituto da Foz do Amazonas e uma Universidade de Integração Pan Amazônica para darmos aos jovens locais a oportunidade de desenvolver novos conhecimentos, tão necessários, sobre a região. Precisamos de ciência, tecnologia e inovação desenvolvidas lá. A Amazônia é chave para a sustentabilidade do Brasil e do planeta”. Citando o ex-presidente da ABC, Luiz Davidovich, o Acadêmico finalizou: “Não vamos à Lua, vamos à Amazônia!”

Por alianças entre países amazônicos e não amazônicos

A Amazônia está perto de um ponto sem retorno, dado o desmatamento e degradação florestal. Essa questão motivou a fala do vice-presidente da ABC para a região Norte, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), que apontou caminhos que ainda podem levar o Brasil a um futuro sustentável.

As sugestões apresentadas pelo Acadêmico para a Amazônia envolvem a conservação, restauração e regeneração de ecossistemas, que devem ser centrais para a bioeconomia sustentável de florestas existentes e rios fluindo.  “Precisamos de investimentos em pesquisa e educação, com fortalecimento da governança regional para uma melhor gestão dos recursos naturais e dos direitos humanos e territoriais”, apontou Val.

O biólogo explicou que a ciência é fundamental para revelar o que está escondido na floresta: a imensa biodiversidade desconhecida. E também para a proteção da Amazônia – incluindo os povos originários. “Os investimentos governamentais em ciência, tecnologia e inovação na Amazônia são frágeis. Para avançar, é necessário um novo mecanismo de apoio financeiro ambicioso, descentralizado e ágil”, apontou o cientista. E acrescentou que, para um novo modelo de desenvolvimento regional, são essenciais as áreas de conservação, que precisam ser criadas.

As bases das ações planejadas na Amazônia, de acordo com o pesquisador do Inpa, devem estar firmemente baseadas em inovações tecnológicas originadas da ciência contemporânea e nos conhecimentos dos povos indígenas e das comunidades locais. Val ressaltou que “as novas tecnologias sustentáveis para a Amazônia deverão sempre observar as características locais, a cultura, as necessidades da sociedade e a conservação ambiental”.

A cooperação internacional em ciência e tecnologia foi outro aspecto fundamental abordado por Val, que afirmou que as alianças entre países amazônicos e os não amazônicos, como a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) e o Pacto de Letícia, são essenciais para implementar políticas ambientais efetivas e promover desenvolvimento. “Isso ajudará a evitar os impactos negativos da infraestrutura e do extrativismo na Amazônia e promover uma bioeconomia sustentável, por meio de novas tecnologias sustentáveis, em toda a Amazônia”, destacou Adalberto Val. E resumiu: “Tratar o clima, a biodiversidade e a sociedade humana como sistemas acoplados é a chave para o sucesso dos resultados.”

Pela conservação do coração da floresta na Amazônia ocidental

Academica Ima Vieira, pesquisadora do Museu Goeldi (MPEG), em Belém do Pará, apresentou possibilidades para uma Amazônia sustentável. Vieira identificou a necessidade de maior compreensão sobre as dinâmicas sociais, territorialidades e racionalidades da região. 

De acordo com a pesquisadora, a Amazônia hoje é um mosaico de florestas modificadas pelo homem, com lacunas de conhecimento ecológico. “40% da região não foram estudadas e 15% das áreas com menor probabilidade de pesquisa, geralmente em função de aspectos logísticos, estão sujeitas a severas alterações até 2050”, relatou. “Estima-se que existam 400 bilhões de árvores na Amazonia, de 16 mil espécies. Mas a maioria tem menos de mil indivíduos. A floresta é dominada por mais ou menos 240 espécies dominantes”, relatou Vieira. Ela ressaltou ainda que no ritmo atual, em 2050 teremos duas florestas – uma delas, na fronteira agrícola, quase totalmente destruída. “Precisamos valorizar a floresta em pé e levar mais CT&I para a população da Amazônia.”

Ela apontou os principais desafios para ciência, tecnologia e inovação na Amazônia: desmatamento ZERO até 2030, com restauração florestal; fortalecimento das cadeias produtivas baseadas na sociobiodiversidade; pagamento de serviços ambientais, como créditos de carbono; produção de conhecimento na região e capacitação de pessoal local; e modelos de negócios com perspectiva de impacto socioambiental. “Essas ações levariam à criação de um ecossistema de inovação em bioeconomia na Amazônia”.

E por onde seguir, com tantos obstáculos? Dentre estes, ela destacou a fragmentação cultural e institucional dos planos, programas e projetos na e para a região, com falta de continuidade, decorrente da falta aporte de recursos substanciais à ciência na e para a Amazônia. “Agora tem que ser a vez da Amazônia em todas as políticas de ciência e inovação”, apelou.

Ima Vieira citou a falecida Acadêmica Bertha Becker, grande estudiosa da Amazônia: “É preciso que haja uma valorização da floresta em pé, a conservação do coração da floresta na Amazônia ocidental, ciência e tecnologia e educação de qualidade para toda a população brasileira, especialmente, para a amazônica”.


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