O Acadêmico Artur Ávila e o matemático ucraniano Mikhail Lyubich
A Reunião Magna 2016, de comemoração aos 100 anos da Academia Brasileira de Ciências (ABC), ocorrida entre os dias 4 e 6 de maio no Museu do Amanhã, no centro do Rio de Janeiro, teve, em sua data de abertura, uma sessão dedicada à matemática.
A sessão começou com uma palestra do pesquisador ucraniano Mikhail Lyubich, empossado como membro correspondente da ABC neste dia, e foi encerrada com uma homenagem ao Acadêmico Artur Ávila, de 37 anos, vencedor da Medalha Fields em 2014. Ambos se dedicam ao estudo de sistemas dinâmicos, área da matemática que estuda processos cuja evolução futura pode ser compreendida e prevista de acordo com leis matemáticas.
Sistemas dinâmicos também são a área de pesquisa de Jacob Palis, presidente da ABC entre 2007 e 2016, amigo de Mikhail Lyubick e avô científico de Artur Ávila, ou seja, orientador de Welington de Melo, que orientou Ávila em seu doutorado.
Palis foi responsável, na década de 1990, por formular uma conjectura, ainda em aberto, sobre os sistemas dinâmicos. Segundo sua teoria, um sistema dinâmico típico possui um número finito de atratores, que atraem quase todas as órbitas, e o comportamento estatístico de quase todas as órbitas, pode ser descrito por probabilidades físicas com suporte nos atratores.
Em sua palestra, Lyubick destacou a importância da descoberta de Palis para os estudos dos sistemas dinâmicos e, após a palestra, em entrevista à ABC, falou da amizade e do carinho pelo matemático brasileiro. “Jacob Palis formulou conjecturas muito importantes. Ele é um grande amigo e uma pessoa muito prestativa. Quando eu mudei para os Estados Unidos, eu não conhecia nada, era tudo novo para mim e Jacob logo se tornou um grande amigo”, recordou Lyubick.
Durante a década de 1980, Jacob Palis fez diversas visitas à União Soviética, sendo inclusive convidado a ser membro Academia de Ciências da U.R.S.S, a qual hoje pertence à Rússia e da qual o matemático permanece membro.
Numa dessas visitas, no fim da década de 1980, Palis soube, por um outro cientista francês, de um jovem matemático ucraniano que estava fazendo doutorado na Rússia e tinha trabalhos muito interessantes. Jacob se interessou em conhecê-lo, mas ao visitar sua universidade, não conseguiu encontrá-lo. Por volta de dez anos mais tarde, enfim encontraram-se, Jacob Palis e Mikhail Lyubick, dessa vez nos Estados Unidos. “No início dos anos 90, com o fim da União Soviética, houve uma grade crise econômica na Rússia, o que levou muitos pesquisadores a se mudarem para o ocidente e entre eles havia um jovem ucraniano”, recorda Palis, falando sobre Lyubick.
Lyubick também falou sobre Artur Ávila em sua palestra, com que tem trabalhos colaborativos. “Tenho grandes colaboradores aqui no Brasil, como Artur Ávila e Welington de Melo”, diz Lyubick, mas não se posiciona sobre a ciência no Brasil. “É difícil falar de um país onde não se vive. “
Quem observar atentamente o currículo Lattes de Artur Ávila pode notar um fato interessante: o mestrado do primeiro vencedor sul-americano da Medalha Fields, considerado o Prêmio Nobel da matemática, está registrado como tendo sido iniciado em 1996, no Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (Impa), sendo que sua graduação em matemática na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), começou em 1997, um ano antes de começar o doutorado.
Essa peculiaridade na trajetória acadêmica de Ávila se deve ao seu desempenho na Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM), competição na qual participou vários anos, conquistando uma medalha de bronze em 1992, em sua primeira participação, e tendo conquistado a medalha de ouro três anos seguintes.
“Ele revelou um brilho muito grande”, lembra Palis, “e acabou sendo atraído pelo Impa. O instituto tem a tradição de dar muito espaço a jovens brilhantes”.
Em 2013, Ávila foi aceito membro da ABC, com 33 anos, já doutor em matemática, título conquistado antes mesmo de concluir sua graduação em 2001 pela UFRJ. Procurado por jovens estudantes ao fim da sessão da Reunião Magna, Artur Ávila tirou fotos e respondeu, muito à vontade, às perguntas dos aspirantes a matemáticos que o tem como inspiração.
“Não é uma coisa que você espera quando começa a fazer matemática”, disse Ávila sobre o assédio. “Mas como o Brasil tem poucos cientistas de conhecimento do público, isso acaba acontecendo por eu ter tido um reconhecimento internacional importante. Para um certo grupo de pessoas, isso gera um entusiasmo. “
Ávila lembrou, em entrevista à ABC, o papel desta instituição em difundir a ciência na sociedade. “O papel principal da Academia não é fazer algo para os membros, é o papel institucional de tentar criar um interesse pela ciência e focalizar nos esforços para desenvolver a ciência no Brasil. As pessoas que chegam a membros da Academia já são bem reconhecidas pelos seus pares e ficam, naturalmente, felizes de fazerem parte da Academia. Mas o que tem que ser mais visto é o serviço para o desenvolvimento da ciência no país”, opinou.
Questionado sobre a oposição entre as pesquisas em ciência pura e aplicada, Ávila afirmou que, na matemática, tudo está interligado. “Eu trabalho em matemática porque sempre gostei. A tentativa de desenvolver o meu conhecimento sobre coisas que me instigam é o objetivo. A matemática pode ter várias motivações. Algumas áreas são mais voltadas para a ideia de aplicação, mas eu tenho noção que os avanços na matemática pura acabam tendo consequências que reverberam nessas aplicações. Eu vejo a matemática como uma coisa única. Não há nada isolado dentro desse universo. “