*Por José Tadeu Arantes | Agência FAPESP

A complementaridade entre os saberes das sociedades tradicionais e os saberes da ciência acadêmica; entre a vida prática e a visão de mundo das comunidades indígenas; entre as atividades agrícolas e as imersões de caça, pesca e coleta no ambiente florestal; entre a vida na aldeia, como espaço de subsistência, e as incursões na floresta, como espaço de liberdade: tais ideias foram o foco de uma conferência ministrada pela antropóloga Manuela Carneiro da Cunha em dezembro, durante a “Escola Interdisciplinar FAPESP 2023: Humanidades, Ciências Sociais e Artes”. E são também a tônica de uma entrevista exclusiva, concedida por ela à Agência FAPESP.

Professora titular da Universidade de São Paulo (USP) e professora emérita da University of Chicago, Carneiro da Cunha é um nome referencial da antropologia. Filha de judeus que deixaram a Hungria devido à ascensão do nazifascismo, nasceu em Cascais, Portugal, em 1943. Aos 11 anos, mudou com a família para São Paulo. Graduou-se em matemática pela Faculté des Sciences de Paris, França, em 1967. E, durante esse período de residência na França, especializou-se em antropologia sob a orientação de Claude Lévi-Strauss (1908-2009). De volta ao Brasil, doutorou-se em ciências sociais pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em 1976, com tese sobre o sistema funerário e a noção de pessoa dos indígenas Krahô, orientada por Peter Fry. Na sequência, ao longo das décadas de 1980 e 1990, fez pós-doutorado nas universidades de Cambridge, na Inglaterra; Stanford e Chicago, nos Estados Unidos; e no College de France, na França.

Carneiro da Cunha combinou sua atuação como professora na Unicamp, na USP, na University of Chicago e no College de France com uma vasta produção intelectual e a atuação em várias entidades. É autora de 12 livros, 38 artigos em periódicos especializados e 32 capítulos de livros, além de organizadora de quatro livros. Foi presidente da Associação Brasileira de Antropologia, é membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e integra a Comissão Arns de Direitos Humanos, entre outras atividades. Dos muitos prêmios que recebeu, destacam-se a Ordem do Mérito Científico, no Brasil, e a Légion d’honneur na França.

Sua conferência no evento realizado pela FAPESP em Embu das Artes (SP), intitulada “A relevância do conhecimento indígena”, trabalhou fortemente a ideia da complementaridade, que também foi tema desta entrevista.