A criatividade é uma característica fundamental de um bom cientista. Crescer num ambiente estimulante é crucial para que uma criança goste de aprender e isso o engenheiro eletricista Leonardo Tomazeli Duarte teve desde o berço. 

Nascido e criado em Sertãozinho, no interior de São Paulo, Leonardo teve uma típica infância do campo, brincando solto pelas ruas com as outras crianças sem as preocupações das grandes cidades. Na companhia de Ronaldo, seu irmão mais velho, faziam de árvores traves de futebol e do portão de casa rede de vôlei. Também improvisavam uma cesta de basquete com um aro numa grade e assim podiam praticar o esporte que mais gostavam. 

Aos pais, Aparecida e Sebastião, Leonardo atribui o gosto pelos estudos. Apesar de só terem cursado até a quarta série, os dois sempre mostraram aos filhos a importância da leitura. Aparecida tinha o sonho de ser professora, o qual podia realizar um pouco ao acompanhar o aprendizado dos meninos. Já Sebastião era autodidata, fascinado por rádio de válvulas e profundo conhecedor de eletrônica, técnica que fez questão de ensinar aos filhos. Não à toa, tanto Leonardo quanto Ronaldo decidiram cursar engenharia. 

Ronaldo foi o primeiro a ingressar na Unicamp, no curso de engenharia da computação. Na época, a família decidiu visitar a universidade onde o primogênito passaria os próximos anos, e Leonardo foi junto. “Eu estava ainda na oitava série e fui mais porque queria conhecer Campinas. Mas chegando lá pensei ‘É aqui que quero estudar!’”, lembra com nitidez. 

Três anos depois lá estava Leonardo, calouro da Faculdade de Engenharia Elétrica e da Computação (FEEC/Unicamp). “Meu irmão, então no quarto ano, me passava várias dicas sobre a universidade e também sobre as disciplinas, pois muitas delas eram comuns aos cursos de engenharia elétrica e engenharia de computação”, explica. 

Já nas primeiras aulas da graduação, Leonardo foi tomando gosto pela pesquisa e logo entrou para a iniciação científica no Laboratório de Processamento de Sinais para Comunicações (DSPCom/Unicamp), sob orientação dos professores Romis Attux e João Marcos Travassos. O projeto, na área de processamento de sinais, já dava pistas do caminho que o Acadêmico seguiria na carreira.  “Além do domínio da matemática e dos aspectos técnicos da área, os professores me apresentaram uma visão de ciência mais ampla, que estimulava a reflexão e as perguntas fundamentais. Essas discussões filosóficas eram novas para mim e me fascinavam”, conta. 

A decisão de seguir a carreira acadêmica já estava tão consolidada, que mesmo antes de se formar o pesquisador cursou algumas disciplinas da pós-graduação, que eram oferecidas como optativas. Ao concluir o curso, continuou na Unicamp no mestrado, que fez com os mesmos orientadores. Ele valoriza muito o tempo que passou no DSPCom, lembrando que a interação com os colegas o fazia aprender diariamente. “Cito um deles, o Ricardo Suyama, que hoje é professor na UFABC [Universidade Federal do ABC]. O Ricardo foi muito importante no meu mestrado, me impressionava com suas habilidades matemáticas e precisão nas suas investigações”. 

No doutorado, Leonardo teve a oportunidade de se aprofundar ainda mais na área de separação de fontes com uma experiência internacional no Instituto Politécnico de Grenoble, França. Lá ele foi orientado por Christian Jutten, um dos pioneiros no assunto. “Lembro que tive um certo receio de como seria o professor Jutten, pois ele já era uma ‘estrela internacional’ na área de processamento de sinais. Esse receio acabou logo no primeiro dia de trabalho, pois pude constatar que, além um cientista brilhante, ele era uma pessoa muito especial, gentil e sempre disponível para conversas”, lembrou. 

Também o surpreendeu na França o laboratório onde atuou, o GIPSA-lab, cuja reputação o precedia. O tamanho e a diversidade de pesquisas ali realizadas eram algo novo para o pesquisador. “Foi um momento que pude ter contato mais fácil com pesquisadores de diferentes lugares do mundo, e entender a importância do investimento robusto para a estruturação de laboratórios de ponta em nível mundial”. 

Em 2010, o Acadêmico retornou para o Brasil, e em 2011 se tornou professor em sua Alma máter, a Unicamp, na então recém-criada Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA), em Limeira. Desde então, vem se dedicando a três linhas de pesquisa principais. 

Na primeira, em processamento de sinais, onde atua desde o mestrado, o Acadêmico desenvolve métodos computacionais capazes de recuperar um conjunto de sinais – fontes – a partir de sinais que são versões misturadas dessas fontes. “Imagine que há várias pessoas conversando em uma festa. Cada sinal de voz de uma pessoa é uma fonte. Se colocarmos alguns microfones no recinto da festa, eles captarão misturas das vozes. Meu trabalho é recuperar cada voz individual”, exemplificou. 

Outra área que estuda é o da decisão multicritério, que, como o próprio nome diz, envolve o aprimoramento de processos de decisão com base em variáveis múltiplas e, muitas vezes, inter-relacionadas. “Investigo uma ferramenta matemática conhecida como integral de Choquet, que pode ser entendida como um modelo não linear capaz de tratar as relações entre os critérios existentes”, explica. 

Por fim, Leonardo também se dedica ao aprendizado de máquina, área cada vez mais popular com a profusão de algoritmos e aplicativos em nosso dia a dia. Nessa área, suas pesquisas envolvem questões importantes sobre ética e inteligência artificial. “Máquinas ‘aprendem’ observando conjuntos de dados históricos, onde possíveis vieses – preconceitos, por exemplo – podem estar presentes. Desta forma, torna-se fundamental pesquisar métodos capazes de identificar e mitigar o impacto desses vieses nas recomendações feitas pelos algoritmos.” 

Essas áreas têm uma alta gama de aplicações, como finanças e concessão de crédito, análise de frotas veiculares, desenvolvimento de políticas públicas e até análise esportiva. Essa multidisciplinaridade é o que fascina o Acadêmico. “Eu necessito, a todo momento, recorrer a ferramentas de várias áreas do conhecimento e cooperar com diversos pesquisadores, com métodos e domínios completamente distintos. Isso me permite descobrir temas fascinantes de pesquisa. Essa interdisciplinaridade me agrada muito e é cada vez mais importante para o desenvolvimento científico”. 

Todo esse caminho, ele destaca, só foi possível graças ao financiamento público. Ele defende o papel fundamental das agências de fomento nacionais, CNPq e Capes, e também das fundações estaduais (FAPs). Mas o maior suporte vem da família que formou com a esposa Josyane, com quem teve Eduardo, de apenas dois aninhos. Com eles divide a vida, as viagens e as playlists, sempre ecléticas e recheadas de estilos brasileiros, que vão desde BaianaSystem à Lô Borges. 

Agora na ABC, Leonardo se diz honrado e pretende atuar nas discussões sobre ciência e também na cada vez mais necessária divulgação científica. “É cada vez mais importante conscientizar a população que a ciência, além de ser algo grandioso em sua essência, é fundamental para o desenvolvimento socioeconômico do país. Em tempos de negacionismo e ataques orquestrados contra a área, essa não é uma tarefa fácil, mas deve ser levada com afinco pelos cientistas”, finalizou.