O vice-presidente da ABC para região Minas Gerais e Centro-Oeste, Virgílio Almeida (professor associado ao Berkman Klein Center da Universidade de Harvard, professor emérito da UFMG e ex-secretário de Política de Informática do Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação) e Francisco Gaetani (professor da EBAPE/FGV e secretário extraordinário para a Transformação do Estado, do Ministério de Gestão e da Inovação em Serviços Públicos) publicaram o seguinte artigo no Valor Econômico: 

O avanço acelerado das tecnologias de inteligência artificial (IA) traz novas incertezas e possibilidades para o cenário político. São novas perguntas, que levantam novas preocupações éticas e legais e que terão impacto nas futuras disputas eleitorais. Como bem resumiu o professor Hany Farid da Universidade da California, Berkeley: “A preocupação é que, à medida que se torna mais fácil manipular a mídia, também se tornará mais fácil negar a realidade”.  Por exemplo, se um candidato presidencial fizer uma declaração ilegal ou inadequada, ela ou ele poderá simplesmente afirmar que a gravação é falsa, ampliando a dúvida central: é autêntica ou falsa a declaração, é real? Como consequência, a erosão da confiança pública e a integridade dos fatos poderá ser uma questão crítica, para às próximas eleições ao redor do mundo.

Com a crescente disponibilidade de ferramentas avançadas como o ChatGPT e outras tecnologias de IA generativa, surge uma nova dúvida.  Estamos à beira de desenvolvimentos em inteligência artificial que mudarão radicalmente o cenário político? Esse cenário já se encontra bastante abalado pela dinâmica das “fake news”, como as últimas eleições demonstraram, alterando ainda mais as conflagradas relações de poder dos atuais atores políticos. 

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A corrida presidencial de 2024 será a primeira eleição americana com o uso generalizado de ferramentas de inteligência artificial, que podem cada vez mais apagar as fronteiras entre realidade e ficção.

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A discussão do projeto de lei de regulação de IA pode abrir espaço para uma ampla discussão envolvendo múltiplos setores da sociedade, num debate que leve a proposição de limites éticos e legais para o uso das tecnologias de IA em temas críticos, como eleições, saúde, dados pessoais e privacidade, dentre outros. O congestionamento da agenda nacional é uma realidade, mas há temas que podem redefinir a forma como tratamos todos os outros. Este é o caso da inteligência artificial.

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Estamos caminhando por terra incógnita na política, assim como na educação, nos negócios, na cultura, na medicina e em vários outros campos do conhecimento. Nossas vidas já estão mudando, estejamos conscientes do que se passa ou não com as novas tecnologias. A democracia é a forma como nos organizamos e gerenciamos a vida na sociedade. A inteligência artificial já está afetando-a. Cabe a todas e todos comprometidos com os valores democráticos buscar compreendê-la e priorizar sua regulação na pauta das prioridades nacionais. Esta conversa pede tempo, porque a razão não se produz instantaneamente. Envolve escuta, clareza, troca e respeito. Deve envolver todos setores da sociedade. Dado o calendário das eleições brasileiras, temos uma janela estreita de menos de um ano para nos entendermos sobre as eleições municipais de 2024, um ensaio geral do que nos aguarda em 2026.


Leia o artigo na íntegra no Valor Econômico