Arnaldo Colombo, membro titular da ABC, durante entrevista.

O membro titular da ABC Arnaldo Colombo é agora o primeiro brasileiro a ocupar o cargo de presidente eleito da Sociedade Internacional de Micologia Humana e Animal (Isham, na sigla em inglês), uma organização mundial independente que almeja representar todos os médicos micologistas, cientistas clínicos e pesquisadores fundamentais com interesse em doenças fúngicas.

Colombo assumiu o cargo em setembro de 2022, em Nova Delhi (Índia), onde ocorreu a cerimônia de posse. Em entrevista para a ABC, o Acadêmico contou detalhes do processo eleitoral, quais são as principais preocupações da instituição com a América Latina e quais pautas ele pretende levantar durante seu mandato.

Eleição e primeiros passos

A Isham foi fundada em 1954, no VII Congresso Internacional de Botânica. Inicialmente, contava com 150 membros, tendo se expandido ao longo das décadas seguintes para se tornar um órgão internacional. Hoje ela representa mais de 900  profissionais que trabalham com doenças fúngicas e fungos patogênicos em humanos e em animais, sendo reconhecida como afiliada não governamental da Organização Mundial da Saúde (OMS).

Ao todo, Colombo passará nove anos no Conselho da Isham. Isso porque a presidência da instituição é dividida em três fases: como presidente eleito, cargo que ocupa agora, o Acadêmico irá colaborar com as pautas e se preparar para assumir o cargo seguinte; após três anos, ele assumirá como presidente em exercício, quando de fato comandará a Isham; já no último triênio, atuará como presidente anterior, sendo mentor das outras duas categorias.

O cientista relatou que ele mesmo aplicou para a vaga e foi eleito através do voto. Seu vasto currículo, é claro, foi um fator decisivo: o Acadêmico é médico infectologista graduado pela Universidade Federal de São Paulo (1983), onde também cursou o mestrado (1989) e uma parte do doutorado sanduíche (1994), realizado em parceria com a Universidade do Texas (EUA). Atualmente, é professor titular em sua alma mater, a Unifesp. além de ser diretor técnico do Laboratório Especial de Micologia da instituição.

Doenças fúngicas na América Latina

No Brasil, a esporotricose é uma das doenças fúngicas que mais se propagou durante os últimos anos, preocupando especialistas. Considerada endêmica no país, o fungo que tradicionalmente infecta felinos vem contagiando um número cada vez maior de humanos, enquanto a doença se alastra com rapidez em outros países latino-americanos, como o Chile.

Apesar de o governo prover o medicamento para tratamento humano contra a doença de forma gratuita, Colombo afirma que há uma “falta uma visão de controle de zoonoses”, uma vez que o governo não o oferece para tratamento animal, e tampouco realiza campanhas de conscientização da população sobre os riscos da doença.

Colombo demonstrou também uma preocupação especial com pacientes imunossuprimidos, frequentemente afetados por micoses oportunistas: “Tratar essa população exige muita tecnologia diagnóstica e terapêutica, com tratamentos adequados para cada grupo”, apontou o cientista.

Nos últimos anos, a histoplasmose tem sido considerada uma ameaça maior do que a tuberculose para pacientes com HIV/Aids. Uma pesquisa com 600 portadores do vírus indicou que pelo menos 20% deles apresentaram infecção pulmonar causada pelo fungo. O descobrimento tardio da doença – que é assintomática na maioria das vezes – pode ocasionar lesões em outros órgãos e deixar sequelas.

Para o Acadêmico, os países da América Latina carecem de políticas públicas capazes de controlar essas infecções e prover tratamento adequado de forma acessível. “No entanto, um trabalho em conjunto com a sociedade também é essencial”, comentou Colombo, ao mencionar ações de divulgação científica e conversas diretas com as populações alvo de cada doença fúngica. “Nas sociedades urbanas, precisamos alertar sobre os cuidados com gatos, que quando em contato com o fungo, pode se tornar um forte transmissor. Nas áreas rurais, o ideal é trabalhar em conjunto com sindicatos do setor agro, para alertar sobre o uso de equipamentos de proteção, como botas e luvas para os trabalhadores.”

Novos rumos

A eleição de Colombo é um feito muito significativo para a instituição e para a comunidade internacional de micologistas, especialmente para a América Latina. Orgulhoso, o cientista afirmou ter grandes planos para os países do hemisfério Sul, uma região que, segundo ele, é mais vulnerável e suscetível a quadros fúngicos. “Essa é uma região muito importante para o mundo, de uma maneira geral, incluindo para a segurança alimentar. É um grande feito conseguir inserir esses países no debate dentro de uma comunidade extremamente eurocêntrica”, comenta.

Antes de assumir a presidência da Isham, Colombo já exercia um papel importante dentro da instituição: junto do pesquisador Flavio Queiroz-Telles, ele comandava o grupo de trabalho latino-americano em micologia. Cada região possui seu próprio grupo de trabalho, e Colombo pretende empoderá-los para que consigam alavancar ainda mais os estudos sobre a geografia das doenças.

Entre os principais tópicos levantados pelo GT, está a incidência de doenças fúngicas em crianças – tópico que ele pretende continuar promovendo. “Por 15 anos anos, a Isham só debatia doenças fúngicas em adultos. Estamos mudando essa visão, promovendo debates sobre a incidência de fungos e micoses em crianças nos últimos cinco anos, algo que é muito comum até a fase da adolescência”, explicou o professor da USP, citando a dermatite de fralda e o sapinho como exemplos. 

Com mais de 20 anos de uma carreira bem-sucedida, o Acadêmico ganhou reconhecimento internacional em sua área de pesquisa, tendo consolidado uma forte rede de relacionamentos no exterior. Ao longo de seu mandato, ele planeja incentivar a formação de novos cientistas na área, visando formar novos líderes, mas sem desamparar os profissionais já consolidados, para quem pretende oferecer suporte. Outros compromissos de seu mandato incluem trabalhar na assistência em saúde pública global, incluindo segurança alimentar; elaborar novas estratégias para os periódicos da Isham; e oferecer programas de educação continuada.

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