Confira o artigo de Mercedes Bustamante, vice-diretora da ABC para a região de Minas Gerais e Centro-Oeste, para o Correio Braziliense. No texto publicado em 10/10, a Acadêmica reflete sobre os índices de desmatamento na Amazônia e as novas pautas da agricultura brasileira, que cada vez menos prezam pela consciência ambiental.

É difícil escolher qual o maior desserviço gerado pela ausência de visão para o país ao longo dos últimos quatro anos do governo federal. Entre os ataques ao processo democrático, a consolidação do orçamento secreto, o descaso com a saúde na pandemia, o negacionismo científico, a falta de políticas para a educação em todos os níveis, cabe também analisar os impactos extremamente negativos da fusão equivocada e destrutiva das pautas da agricultura brasileira com as ações de redução da proteção ambiental.

Tal fusão rendeu ao governo federal o apoio massivo da chamada bancada ruralista que, ao contrário do que deveria defender, privilegia a visão de curto prazo em um setor econômico que depende essencialmente da garantia de condições de longo prazo. O endosso de setores da política brasileira reforça a associação do agronegócio a pautas sem fundamento científico e sem futuro e que, sobretudo, projetam riscos sobre o próprio setor.

Os dados mais recentes do Inpe indicam o maior número de alertas de desmatamento na Amazônia desde 2015. O crescimento do desflorestamento também afeta os demais biomas do país. A expansão das atividades de agricultura e pecuária sobre áreas de vegetação nativa perpetua práticas dissociadas tanto das demandas internacionais, como das perspectivas de viabilidade do setor e da construção de sua resiliência frente às incertezas crescentes.

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A intensificação sustentável da agricultura é preferível a uma maior expansão sobre áreas naturais e é possível quando políticas adequadas estão em vigor para limitar o aumento da conversão de terras. Esforços para aumentar e diversificar a produção de alimentos através de maior rendimento e integração de sistemas, ao mesmo tempo em que se reduzem os impactos ecológicos adversos, aumentam a segurança alimentar. Hoje, enquanto as áreas plantadas com milho e soja para exportação aumentam, há retração das áreas plantadas com arroz e feijão.

O desmatamento é reconhecido como um risco sistêmico para a economia universal. Globalmente, o Fórum Econômico Mundial calculou que US$ 44 trilhões — mais da metade do PIB global — estão sob um risco significativo pelo aumento da degradação da natureza.

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O descontrole do desmatamento e as mudanças no uso da terra são responsáveis pela maior fração das emissões brasileiras de gases de efeito estufa, ameaçam a biodiversidade que garante polinizadores, controle de pragas e doenças e a fertilidade do solo e os direitos e à subsistência das comunidades locais.

Os usos da terra que contribuem com vários serviços para soluções climáticas, segurança alimentar e integridade dos ecossistemas dependem da trajetória da mudança do clima — quanto maior o grau de aquecimento, maior será a incerteza sobre a capacidade produtiva de nossos sistemas naturais e manejados. Quem, falsamente, defende a agricultura por meio da degradação do meio ambiente está destruindo as condições mais básicas para seu sucesso em um mundo em mudança.