A Coordenação da Área de Ciências Biológicas I (CB I) vem por meio deste documento manifestar sua indignação com a crise sem precedentes vivenciada pela CAPES nos últimos meses. Pela primeira vez, em seus 70 anos de história, há o risco real de não ser realizada a avaliação dos cursos de Pós-graduação stricto sensu. E isso se dá sobretudo por falta de garantias de que esse processo venha a ser realizado com um compromisso de qualidade, uma vez que este é o principal motivo pelo qual os 147 coordenadores das 49 áreas de avaliação participam, como voluntários há cerca de três anos e meio, das inúmeras atividades preparatórias para a avaliação ora em curso. Tal como os nossos colegas coordenadores das outras 48 áreas de avaliação, fomos escolhidos pela comunidade acadêmica da área de Ciências Biológicas I para representá-los, como forma de garantir que Avaliação Quadrienal (2017-2020) dos programas de pós-graduação que dela fazem parte seja procedida com isenção e imparcialidade, com o compromisso de qualidade.

O trabalho de avaliação de mais de 4.500 programas de pós-graduação stricto sensu (com mais de 7.000 cursos) é uma tarefa hercúlea, envolvendo o trabalho voluntário dos Coordenadores de Área e de outros cerca de 4.500 docentes/pesquisadores altamente qualificados, selecionados entre os melhores do país, que atuam como Consultores durante o período de Avaliação.

Todo o processo de avaliação resulta no estabelecimento de indicadores e critérios que servem para aferir, através de análise comparativas, a qualidade dos programas de pósgraduação já em atividade, sendo este um passo essencial para se estabelecer um diagnóstico preciso do atual estado do Sistema Nacional de Pós-Graduação. Esse diagnóstico advém diretamente dos dados gerados pela avaliação quadrienal, sendo ferramenta indispensável para se estabelecer, por exemplo, parâmetros que norteiem a CAPES para a avaliação de novos cursos de pós-graduação.

Infelizmente, a recente publicação das Portarias 195 e 196 da CAPES, que regulamentam a apresentação de propostas de cursos novos (PCNs, que inclui a previsão de funcionamento de programas de pós-graduação com ensino a distância [EaD]), ocorreu de forma apressada, sem o consenso entre os coordenadores das diferentes áreas de avaliação. Houve ainda pressão com ameaças do uso dos documentos orientadores aprovados em 2019 e que poderiam apresentar inconsistências capazes de comprometer (inclusive legalmente) todo o procedimento de avaliação das PCNs apresentadas. Insistimos que devemos manter nosso compromisso com a qualidade, e não nos subordinar a interesses escusos, como por exemplo o interesse comercial na educação brasileira.

O intuito deste manifesto é o de ratificar a manutenção do nosso propósito de atuar proativamente em favor da manutenção da avaliação com compromisso de qualidade dos programas de pós-graduação existentes (e daqueles que venham a ser eventualmente propostos através do atendimento à chamada de PCNs da CAPES). Assim, em respeito à comunidade acadêmica que nos atribuiu esta responsabilidade, nós, Coordenadores da Área de Ciências Biológicas I, mantemos nossa intenção de concluir a avaliação quadrienal 2017-2020 em bons termos. Destacamos, no entanto, que reconhecemos como legítimas e apoiamos a motivação dos colegas Coordenadores das áreas de Astronomia/Física, Matemática/Probabilidade e Estatística, Química e Engenharia III, que recentemente pediram desligamento das suas funções em decorrência dos assuntos tocantes ao processo avaliativo do ciclo 2017-2020. As dificuldades de trabalho relatadas por esses coordenadores (e concordamos com todas elas) são, de fato, de difícil superação, mas entendemos que nossa renúncia poderia representar mais um ponto de fragilidade no já tão combalido sistema de avaliação dos programas de pós-graduação stricto sensu.

Sendo assim, em atenção ao cronograma da Avaliação Quadrienal recentemente aprovado no Conselho Técnico Científico da Educação Superior da CAPES, como forma de garantir a manutenção do compromisso de qualidade assumido, destacamos os seguintes pontos necessários para que o processo ocorra dentro das nossas melhores expectativas:

  1. Recomposição das coordenações das 49 áreas de avaliação, inclusive com convite formal de retorno às atividades de coordenação dos colegas das áreas Astronomia/Física, Matemática/Probabilidade e Estatística, Química e Engenharia III, com garantias de que participarão até a finalização do processo.
  2. Garantias de que os atuais coordenadores de todas as áreas e quadro técnico da CAPES terão condições para atuar com autonomia na conclusão da atual Avaliação Quadrienal (2017-2020), em todas as etapas legais previstas. Essa é a única forma de assegurar que o processo seja realizado por aqueles que, durante todo o último quadriênio, foram responsáveis pelo exaustivo trabalho que resultou na definição dos Critérios de Avaliação, de forma que possam cumprir adequadamente a missão confiada pela comunidade acadêmica e pela CAPES, garantindo o uso desses critérios;
  3. Garantias de que a avaliação das PCNs será realizada por Coordenadores de Área comprometidos com a manutenção da qualidade da pós-graduação brasileira. É essencial que os novos coordenadores sejam escolhidos através de consulta à comunidade. E que sejam respeitados, para a aprovação de novos cursos, os critérios e indicadores dos Documentos de cada Área de Avaliação.

Consideramos ainda que, além da questão da avaliação da quadrienal e da análise de PCNs, a CAPES deve se empenhar no enfrentamento de problemas gravíssimos vividos pela comunidade acadêmica nacional nesse período de crise, a saber:

  1. É altamente preocupante o fato de que ainda não exista definição para a elaboração do Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG). O período do último plano (2011-2020) foi concluído e ainda não se dispõe de indicadores que sirvam para avaliar se as metas nele previstas foram ou não atingidas e quais são os próximos desafios para o próximo decênio. Que este plano a ser elaborado cumpra estritamente os objetivos e compromissos com a manutenção da qualidade dos programas de pós-graduação stricto sensu.
  2. Para o respeito à qualidade de pós-graduação brasileira, é inaceitável que os investimentos em ciência e tecnologia tenham sofrido redução da ordem de cerca de 70% ao longo dos últimos anos. Que a CAPES faça gestão às esferas competentes do governo para garantir a recomposição dos recursos destinados às atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação, haja vista a sua inegável importância para o crescimento sustentável do país e da consequente redução das assimetrias sociais ora observadas. Dentro desta queda nos investimentos, chama a atenção a recente divulgação de que a CAPES não irá honrar o financiamento do último ano dos INCTs, em mais um duro golpe na ciência/educação brasileira.
  3. Durante os últimos anos ocorreram reduções profundas nos orçamentos e quadros de docentes e funcionários dos Institutos e Universidades Federais, o que pode simplesmente inviabilizar o seu funcionamento nos próximos anos. É fundamental que haja a urgente recomposição do orçamento e dos seus quadros de profissionais.
  4. Também é inaceitável que, desde 2013, os valores das bolsas de pós-graduação não tenham sido reajustados, implicando em perdas da ordem de 60% no seu valor real. Acreditamos que reajustes imediatos sejam fundamentais para garantir a manutenção da qualidade das pesquisas desenvolvidas pelos milhares de estudantes de pós-graduação, que dependem da concessão de bolsas de estudo como meio para viabilizar a complementação da sua formação acadêmica.
  5. Desde 2019, houve a paralização da concessão de novas bolsas de pós-doutorado do Programa Nacional de Pós-Doutorado (PNPD), gerido pela CAPES. O PNPD deve ser imediatamente reativado, dada a sua importância para o desenvolvimento da pós-graduação e da ciência brasileira. Profissionais formados com alto nível de competência pelos programas de pós-graduação estão saindo do país por falta de perspectivas, caracterizando uma autêntica evasão de cérebros. Estes jovens pesquisadores, cujos processos formativos foram mormente custeados com recursos públicos, deveriam ser mais bem aproveitados para o enfrentamento dos inúmeros problemas que acometem a nossa sociedade. Esperamos que a CAPES se sensibilize com a situação de abandono vivida pela comunidade acadêmica nacional e que atue intensivamente para o reestabelecimento das condições mínimas de trabalho dos milhares de docentes, alunos e egressos dos programas de pós-graduação, dada a sua importância para o desenvolvimento do país.

Finalmente, reivindicamos que todas as medidas, comunicações e encaminhamentos sejam feitos de forma colegiada e transparente, e amplamente divulgados à comunidade acadêmica. É imprescindível que a atual gestão da CAPES demonstre seu compromisso com a manutenção da qualidade da pós-graduação brasileira, pois acreditamos que esse compromisso é com o futuro do país.

Carlos Frederico Martins Menck (Coordenador da Área CB I)

Célia Maria de Almeida Soares (Coordenador adjunto de Programas Acadêmicos da Área CB I)

Valdir de Queiroz Balbino (Coordenador adjunto de Programas Profissionais da Área CB I)

Apoio dos 16 avaliadores que tem participado da avaliação quadrienal (2017-2020) e das seguintes coordenações de programas de pós-graduação da área CB I.

Apoio declarado das Coordenações de 51 dos Programas de Pós-Graduação que fazem parte da Área de Ciências Biológicas I.

 

Programa / Instituição

Análises Clínicas UFPA
Biociências UFCSPA
Biociências Uerj
Biociências e Biotecnologia Fiocruz/PR
Bioinformática UFMG
Bioinformática UFRN
Bioinformática UTFPR
Bioinformática UFPR
Biologia Animal UNB
Biologia Aplicada à Saúde UFPE
Biologia Celular UFMG
Biologia Celular e do Desenvolvimento UFSC
Biologia Celular e Estrutural UFV
Biologia Celular e Estrutural Unicamp
Biologia Celular e Estrutural Aplicadas UFU
Biologia Celular e Molecular FMRP/USP
Biologia Celular e Molecular PUC-RS
Biologia Celular e Molecular UFRGS
Biologia Celular e Molecular Aplicada UPE
Biologia Celular e Molecular Aplicada à Saúde Ulbra
Biologia de Sistemas USP
Biologia Estrutural e Funcional Unifesp
Biologia Geral e Aplicada Unesp
Biologia Molecular e Celular Unirio
Biologia Química Unifesp
Biotecnologia USP
Biotecnologia e Bioprocessos Instituto Butantan
Ciências Biológicas UFPE
Ciências Biológicas UFJF
Ciências Biológicas UFOP
Ciências Biológicas Unifal
Ciências Biológicas (Biologia Celular e Molecular) UEM
Ciências Biológicas (Biologia Genética) USP
Ciências Biológicas (Biologia Molecular) UNB
Ciências Biológicas (Genética) Unesp/Botucatu
Ciências Biológicas (Genética) FMRP/USP
Genética FMRP/USP
Genética UFMG
Genética UFPE
Genética UFRJ
Genética PUC-GO
Genética UFPR
Genética e Biologia Molecular UFG
Genética e Biologia Molecular UFPA
Genética e Biologia Molecular UEL
Genética e Biologia Molecular Unicamp
Genética e Bioquímica UFU
Genética Evolutiva e Biologia Molecular UFSC
Genética, Conservacão e Biologia Evolutiva INPA
Mestrado Profissional em Ensino de Biologia UFMG*
Toxinologia Intituto Butantan

*Unidade sede do PROFBIO, cuja rede é formada por 18 outras instituições de ensino superior

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