Leia entrevista feita pelo grupo do blog No Cenáculo com o Acadêmico Simon Schwartzman, publicada em 24/7:

Após algum tempo, retomamos o projeto “A biblioteca de…”, que já entrevistou os cientistas políticos Octavio Amorim Netoe  Maria Celina D’Araujo, além dos historiadores Marcos Napolitano e Martha Abreu. O intuito é  convidar nossos leitores a conhecerem mais o universo  de grandes intelectuais, pesquisadores, professores e artistas ligados a diferentes áreas do conhecimento.  Aquele ou aquela que nos  inspira pode indicar caminhos de leitura fundamentais para o nosso aprendizado. Por isso, conhecer o que essas referências  leem é mais do que uma simples curiosidade: é, antes de tudo, um modo de  descobrir novos horizontes do saber.

O convidado dessa edição é o sociólogo e cientista político Simon Schwartzman.

Mestre em Sociologia pela Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales (FLACSO) e doutor em Ciência Política pela University of CaliforniaSimon Schwartzman é membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC). Foi presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) entre 1994 e 1998, além de diretor para o Brasil do American Institut for Research, no período 1999-2002. Tendo sido professor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP), da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), atualmente é Pesquisador Associado do Instituto de Estudos de Política Econômica/Casa das Garças, no Rio de Janeiro.

Uma das referências obrigatórias para a Sociologia no Brasil, Schwartzman é autor do clássico Bases do Autoritarismo Brasileiro (Campus, 1982).

Que livro recomenda para quem está iniciando na área de Sociologia?

Eu me formei em sociologia nos anos 60, e fiz meu doutorado em ciência política dez anos depois. As duas áreas hoje estão bastante separadas, mas eu ainda me identifico como sociólogo, na tradição de pensar a sociologia como uma perspectiva mais ampla, que inclui, mas não se limita, aos temas da estrutura social, dos conflitos sociais, das instituições, da política, das relações sociais e da própria construção do conhecimento. Deve haver excelentes livros introdutórios à sociologia publicados no Brasil recentemente que eu não conheço, e não saberia recomendar. Mas acho que uma boa maneira de começar é ver o que o sociólogo faz, e não quais são as teorias e técnicas que utiliza, e uma boa entrada neste mundo é o livro de Edson D. Nunes, A Aventura Sociológica – Objetividade, Paixão, Improviso e Método, publicado em 1978 e recentemente editado, que dá uma visão bastante rica do dia a dia da atividade dos sociólogos em suas pesquisas. Difícil de encontrar, mas fascinante, é o Invitation to Sociology – a humanistic perspective, de Peter Berger, publicado originalmente em 1963 nos Estados Unidos, que mostra com clareza o que é a perspectiva sociológica, como uma maneira de tomar distância das preconcepções ingênuas e voltar a se envolver com a sociedade a partir de uma perspectiva de indagação crítica. A sociologia, além de ser uma área de estudo e pesquisa, tem também um papel importante de enriquecimento do debate público das questões sociais, e uma excelente introdução ao tema é o livro editado por Michael Burawoy, de 2007 (Public Sociology), com textos de 15 sociólogos sobre o papel da sociologia no século 21.

Qual foi o livro que mais gostou de escrever?

Talvez tenha sido Um Espaço para a Ciência – A Formação da Comunidade Científica no Brasil, escrito originariamente nos anos 70 e com nova edição pela Editora da Unicamp em 2015. O que fez este trabalho especialmente prazeroso foi a oportunidade de trabalhar com uma excelente equipe de colegas, e as entrevistas que fizemos juntos com um grande número de cientistas brasileiros entre os principais fundadores desta comunidade.

Que livro que você escreveu teve maior repercussão e crítica? A que atribui isso?

Creio que foi Bases do Autoritarismo Brasileiro, que teve como origem minha tese de doutorado e foi publicado inicialmente como São Paulo e o Estado Nacional (Difel, 1975), e republicado em 2015 pela Editora da Unicamp. São duas, me parece, as razões desta repercussão. A primeira foi a tentativa de trazer os temas do patrimonialismo burocrático para o centro do entendimento da formação e desenvolvimento político brasileiro, em uma perspectiva weberiana, em contraposição à interpretação classista que predominava até então nas ciências sociais do país. Não foi uma inovação minha, o tema já havia sido tratado antes por Raymundo Faoro em Os Donos do Poder, mas — esta a segunda razão — eu procurei entender a questão no contexto de uma dinâmica que envolvia as tensões entre diferentes maneiras de organizar a vida política, que, de maneira simplificada, descrevi em termos de “cooptação vs. representação política”, que se manifestava também de maneira simplificada na tensão histórica entre São Paulo e o Estado Nacional.

Qual livro de Sociologia é obrigatório ter na estante?

Eu penso que o grande fundador das ciências sociais contemporâneas foi Max Weber. A obra de Weber é difícil de entender, porque está em boa parte contida em um livro póstumo e fragmentado, Economia e Sociedade, mas existe uma brilhante apresentação do conjunto que me parece de leitura indispensável, de Reinhard Bendix, Max Weber – Um Retrato Intelectual, publicado em português pela editora da Universidade de Brasília em 1986.

Em sua biblioteca, tirando as suas próprias obras, qual autor(a) está mais presente?

Não contei, mas acredito que sejam os textos de e sobre Max Weber.

Qual foi o último livro que você leu e te marcou?

Talvez tenha sido The Case against Education: Why the Education System Is a Waste of Time and Money, de Bryan Caplan, 2018. É um livro radical, com o qual não concordo inteiramente, mas é uma crítica poderosa à expansão aparentemente ilimitada das credenciais educacionais nas sociedades modernas, baseado no uso brilhante da evidência empírica disponível.

Qual o seu livro preferido fora da área de Sociologia?

Não tenho um livro preferido, mas poderia citar Disgrace, de J. M. Coetzee, Prêmio Nobel de Literatura da África do Sul, que dá um retrato forte e poderoso de como são vividas as tensões entre os diferentes mundos que se encontram e confrontam em seu país, e que não são muito diferentes do que ocorre em outras partes.

Qual tema você pretende abordar no seu próximo livro?

Não sei ainda. Tenho um sonho, ou fantasia, de “revisitar” as Bases do Autoritarismo Brasileiro, na perspectiva de 50 anos depois. Ou, mais realisticamente, de reunir em um volume meus ensaios mais recentes sobre educação no Brasil. Vamos ver o que vou conseguir fazer.

Simon Schwartzman tem seu próprio site, que pode ser acessado aqui. Para ver todas as suas publicações científicas, o lattes pode ser visualizado clicando aqui.