O movimento de emancipação das mulheres registra avanços irregulares, mas constantes desde o século XIX, quando seu símbolo principal eram as aguerridas sufragistas. Graças a essa luta contínua, hoje um grande número de países incorpora em suas legislações dispositivos que asseguram, pelo menos aos olhos da lei, a igualdade de direitos entre homens e mulheres. Assim como adotam políticas públicas destinadas a corrigir desigualdades ou estimular ações afirmativas.
O ingresso efetivo no mercado de trabalho, o aumento do protagonismo no mundo profissional, novos arranjos familiares em que as mulheres alteraram velhas estruturas patriarcais, assim como maior poder de decisão sobre o próprio corpo, são parte de uma realidade inexistente há algumas décadas. Ter vencido essas etapas não significa, entretanto, ignorar que ainda existe uma longa caminhada pela frente. Sobretudo quando se considera que, para as camadas mais pobres da população, em muitos casos a “liberdade” conquistada pelas mulheres significou a dupla jornada de trabalho, no emprego e no lar. Também, quando se leva em conta os alarmantes números de violência contra as mulheres registrados pelo País. Segundo o recém-publicado relatório Women, Peace and Security 2017/2018 (Georgetown University’s Institute e The Peace Research Institute Oslo, veja o relatório aqui), o Brasil ocupa a 82ª posição, entre 153 países, no ranking que foi elaborado para avaliar a situação das mulheres no mundo, a partir de três critérios: inclusão (econômica, social, política), justiça (legislação formal e discriminação informal) e segurança (na família, comunidade e relações sociais). No topo da lista, com as melhores classificações, estão Islândia, Noruega, Suíça e Eslovênia. Enquanto os últimos colocados são a Síria, Afeganistão, Iêmen e Paquistão.
A pesquisa sociológica brasileira sobre o tema examina hoje as várias faces desse processo, detendo-se em perspectivas como classe e gênero, como mostrou recentemente a reportagem da Revista Fapesp “Novos arranjos nos lares brasileiros”, publicada em janeiro deste ano.
No âmbito da Universidade, a preocupação de quem hoje olha para as questões de gênero está voltada para aspectos sutis e complexos da desigualdade, que permanece em vários níveis. O fenômeno da sub-representação feminina no mundo acadêmico vem sendo amplamente mapeado e é claramente identificado. Mesmo nas áreas em que o número de mulheres é superior ao de homens quando ingressam na graduação, a trajetória que leva ao topo da carreira vai reduzindo o grupo de mulheres, por várias razões. Apesar da lenta evolução, continua sendo uma realidade, mesmo nas economias avançadas, a desigualdade de gênero nas chamadas áreas STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática, da sigla em inglês), com marcante predomínio masculino.
Contudo, quando se vive o cotidiano da Universidade, e da educação em geral, é possível perceber vários sinais, talvez não captados pelas estatísticas, que abrem questões interessantes sobre o ritmo e a qualidade dessas mudanças.
São cada vez mais frequentes as pesquisas científicas de qualidade lideradas por jovens pesquisadoras que enfrentam o desafio de conciliar carreira e família. Um número crescente de ações afirmativas, na forma de premiações patrocinadas por empresas, editais das agências de fomento e outros mecanismos de estímulo, vem, aos poucos, construindo uma nova mentalidade entre estudantes do ensino médio e superior. É visível a quem participa de eventos como as ”feiras de ciência” do ensino médio a participação ativa das estudantes, sugerindo, talvez, que a velha ideia de que ciência é “coisa de meninos” vai se dissolvendo.
No entanto, sabemos que a única forma de acelerar o ritmo desse processo é debater, ampliar e diversificar tais iniciativas em escala exponencial para que os resultados venham de fato a fazer diferença. Essa, sem dúvida, é a forma para construirmos um mundo melhor para nossos filhos, netos e bisnetos. Sonho com um mundo onde homens e mulheres se sintam respeitados e valorizados como seres humanos em todos os aspectos.