O Acadêmico Niro Higuchi, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), tem o foco dos seus estudos em manejo florestal. Cursou graduação e mestrado em engenharia florestal pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), doutorado na mesma área pela Universidade do Estado do Michigan (EUA) e pós-doutorado pela Universidade de Oxford (Reino Unido).

Convidado como palestrante do 2º Encontro Regional de Membros Afiliados da Academia Brasileira de Ciências/Região Norte, Higuchi situou sua apresentação. ”Quem trabalha com manejo florestal, trabalha com volume de madeira. Quem trabalha com volume de madeira, trabalha com biomassa, quem trabalha com biomassa, trabalha com carbono da floresta. Afinal de contas, a floresta não é o maior reservatório de carbono na biosfera, mas é o mais importante de todos”, destacou. O Acadêmico relatou que, ”nas horas vagas”, trabalha com carbono da vegetação.

Higuchi começou com definições básicas, diferenciando ”clima” e ”tempo”. ”Clima é a estatística descritiva do tempo em termos da média de variáveis da superfície – como temperatura, precipitação e vento – em períodos de várias décadas, ou melhor, especificamente, três décadas, como definido pela OMM
Organização Meteorológica Mundial].” Já o tempo, segundo ele, é o estado físico das condições atmosféricas em um determinado momento e local. ”Isto é, a influência do estado físico da atmosfera sobre a vida e as atividades do homem”, explicou, informando que trataria de tempo e não de clima, porque não tem médias históricas de mais de 30 anos para analisar.

O ponto de partida de sua análise foi um gráfico publicado no 4º Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), que representa a variação da temperatura de 0.7ºC em 124 anos, caracterizando a mudança climática.

Higuchi apontou duas causas prováveis para essa mudança na temperatura terrestre: o aumento da concentração de CO2 na atmosfera, a partir da Revolução Industrial, e o aumento da população. ”O mundo levou mais de 1800 anos – fora o tempo antes de Cristo – para chegar ao primeiro bilhão de habitantes. A partir de então, em apenas 150 anos surgiram mais seis bilhões de pessoas no planeta.” Ele mostrou a foto do bebê filipino eleito simbolicamente pela ONU, em 31 outubro de 2011, como o habitante nº 7.000.000.000 da Terra.

E quais são as possíveis consequências desse aumento de temperatura no Brasil? Segundo Higuchi, a pior consequência é o que ele chama de ”mau humor” do tempo.

O especialista – que é membro de comitê assessor da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam), do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (FunBio), do Instituto Lasting Initiative for Earth e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa)/Unidade de Florestas – apresentou então um cuidadoso levantamento dos fenômenos extremos ocorridos no país desde 2005.

O primeiro episódio que considerou marcante foi a seca de 2005 em toda a Amazônia, antecedida por temporais com ventos de até 147 km/h. ”Esse fenômeno é chamado ‘roça de vento’, porque provoca um desmatamento na área e o produtor aproveita pra plantar. Isso sempre aconteceu na região, mas nunca nessa dimensão – dessa vez atingiu quatro mil hectares. Isso ocorreu em vários municípios e matou mais de 500 milhões de árvores. As áreas ainda estão sendo regeneradas”, relatou Higuchi. Outra severa seca ocorreu em 2010. ”Em Manaus, a cheia do Rio Negro em 2009 quebrou o recorde, que era de 1953, recorde quebrado novamente em 2012”, observou.

Dentre as dezenas de exemplos, Higuchi destacou as chuvas em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul em 2009, seguidas de seca. Em 2010 houve nova seca no Sul, mais rigorosa que a de 2005. Desastre em Angra de Reis e tempestades no Rio de Janeiro em 2011, assim como seca no Rio Grande do Sul e chuvas em Santa Catarina. Em 2013, um tornado arrasou o interior de São Paulo, caiu neve no Sul e ocorreram temporais em Manaus. Em 2014, houve cheia no Rio Madeira e também no sul do país, seca em São Paulo e incêndios no Centro Oeste, assim como excesso de chuvas em Recife.

O pesquisador esclareceu que ninguém pode afirmar que tudo isso seja resultado do aumento de 0,7º de temperatura, mas ressalta que há muitos indicadores nesse sentido. ”Nós estamos geralmente preocupados com o clima e, por isso, costumamos olhar as variações interanuais e não observamos as variações intraanuais. Às vezes, a variação anual de precipitação é igual a de outros anos, mas os picos de extremos variam imensamente entre os meses. Como só avaliamos a média, então é como se nada tivesse acontecido – mas aconteceu”, apontou o engenheiro florestal.

Com relação às regiões que o grupo de Higuchi monitora há anos em suas pesquisas, ele explica que as projeções podem ser feitas de maneiras diversas e que, por isso, não pode afirmar qual é a capacidade máxima que a floresta suporta até começar a perder biomassa. ”Até porque o recorte feito nas três regiões que estudamos não representa a Amazônia como um todo.” Mais recentemente, porém, eles ampliaram as áreas de estudo, cobrindo todo o estado do Amazonas. ”Agora nossos resultados serão mais significativos, poderemos extrapolar a escala.” Ele relata que a fixação de carbono pela floresta vem se mantendo alta, independente desses eventos, como se ela estivesse indiferente ao humor do tempo.

Até o final do ano, o grupo de Higuchi colocará os novos dados de campo na internet, pois são resultantes de investimentos públicos e, em seu ponto de vista, ”são muito preciosos para não serem compartilhados, especialmente para quem trabalha com sensoriamento remoto”. Esses dados podem ser muito úteis par que se consiga produzir um mapa de carbono para a Amazônia. ”Nós temos o nosso, é inicial, mas já mostra algumas coisas. Mas nossos dados têm ainda muita incerteza, porque em algumas regiões não temos inventários e tivemos que utilizar dados secundários na elaboração do mapa. Mas nosso sonho é que nós ou outras pessoas consigam chegar a um mapa de carbono da Amazônia com o mínimo de incerteza possível.”