Eduardo Teixeira, Marcelo Viana, Daniel Felinto, Cecília Nunez e Luis Carlos Crispino

“Assimetrias regionais” foi o tema da última mesa com membros da ABC que integrou o simpósio “Ciência, Tecnologia e Inovação: Visões da Jovem Academia”. A mesa, que aconteceu no dia 16 de setembro, reuniu os Membros Afiliados Daniel Felinto (UFPE), que atuou como mediador, Luis Carlos Bassalo Crispino (UFPA), que foi o relator, Cecília Nunez (INPA) e Eduardo Teixeira (UFCE), além do Membro Titular Marcelo Viana (IMPA), como debatedores.

Viana afirmou que a assimetria é um fenômeno que ocorre em vários eixos, sendo que a mais marcada é aquela existente entre o espaço urbano e o rural. “A diferença acontece quando se compara o que ocorre no interior e nas capitais”, declarou. Segundo o pesquisador do Instituto de Matemática Pura e Aplicada, existem diferenças, por exemplo, em relação ao funcionamento das Fundações de Amparo à Pesquisa (FAPs): em alguns estados elas são menos eficazes que em outras. Ele também comentou que a forte concentração de bolsas na Região Sudeste é uma evidência de tais assimetrias.

De acordo com o Acadêmico, no triênio de 2007 a 2010 buscou-se expandir a rede de pós-graduação em matemática no Brasil e, para tanto, foram criados programas na Região Nordeste. A grande mudança no período, entretanto, foi a criação de programas de doutorado na Região Norte. “O ponto chave é que esses programas foram colaborações inter-institucionais”, disse Viana. “A iniciativa deve contar com as instituições regionais, fortalecendo a rede de ensino”.

Viana também comentou o projeto “Integrando a Amazônia”, da Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), que tem o objetivo de desenvolver e consolidar as atividades de pesquisa e ensino de matemática na Região Norte – a mais carente do Brasil – em nível de iniciação científica e pós-graduação, visando a integração de suas instituições à comunidade matemática nacional. Além disso, ele falou sobre o resultado da prova ABC – Avaliação Brasileira do Final do Ciclo de Alfabetização, que revelou que as regiões que mais têm problemas são Norte e Nordeste, mas que todas as regiões em geral tiveram um resultado ruim em matemática.

O Acadêmico mencionou o programa de Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional (Profmat), um curso semipresencial, com oferta nacional, que reúne cerca de 1.200 alunos e é coordenado pela SBM. O projeto visa atender professores em exercício no ensino básico, especialmente na escola pública, que busquem aprimorar sua formação profissional. Viana falou, por fim, sobre algumas ideias testadas, entre elas fomentar o desenvolvimento regional por meio da solidariedade institucional e apostar na formação dos jovens da própria região e na criação de condições para que eles retornem.

Já Cecília Nunez, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, comentou que, na sua região, falta a estrutura básica de pesquisa, como luz, internet e água. A estrutura física também é precária, de modo que os laboratórios são usados simultaneamente para aulas na graduação e para pesquisa. “Os professores doutores querem chegar à universidade ou instituto de pesquisa e poder produzir, e não ter que construir prédios – para depois o prédio ser considerado institucional e ir para outros grupos”, comentou. Segundo a cientista, o jovem doutor prefere ir para um grande centro onde ele não precisa conseguir dinheiro para comprar todos os equipamentos de pesquisa, o que provoca uma lacuna de tempo longa até que se possa começar a produção científica de fato.

“Enquanto na USP o pesquisador chega e já tem gente com pós-doutorado para ajudar, no Norte os professores precisam formar alunos desde o ensino médio, às vezes, porque não tem gente capacitada”, lamentou Cecília. “Algumas regiões não têm nem ao menos cursos de mestrado”. A pesquisadora ressaltou que, ainda que a ciência seja universal, o método e a utilidade são regionais, uma vez que a infraestrutura é diferente.

Cecília falou sobre a rarefação dos equipamentos: como não são suficientes no Norte, é necessário enviar as amostras para análise em outras instituições. “Assim, somos obrigados a colocar o nome da instituição no artigo só por usar o equipamento deles”. Ela também ressaltou a discrepância entre as FAPs: excluindo a Fapesp, Faperj e Fapemig, que têm boas condições de trabalho, as demais se veem em meio a inúmeras dificuldades.

Para Cecília, a atual política do CNPq que vincula os editais às FAPs – o CNPq disponibiliza recursos e as FAPs devem disponibilizar o mesmo nível de recursos para os projetos – gera mais problemas do que soluções onde essas fundações possuem menos dinheiro. “Essa política está produzindo mais desigualdades regionais”. Além disso, ela comentou as necessidades regionais de pesquisa e a dificuldade de logística, uma vez que só se chega a alguns lugares após três dias de barco. Cecília também defendeu a pesquisa multidisciplinar e afirmou que é possível fazer ciência de ponta em diversas regiões do Brasil, até mesmo no Norte, onde “os cérebros existem”.

Eduardo Teixeira, da Universidade Federal do Ceará, foi o último entre os três debatedores a fazer sua apresentação. Ele afirmou que os institutos de pesquisa são a disseminação da excelência e comparou a distribuição dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs) pelo país. Enquanto a Região Sudeste engloba 77 INCTs, o Norte conta com nove e o Centro-Oeste com quatro. “Eles são um importante dispositivo, mas não representam uma solução para o problema das assimetrias regionais”, enfatizou. “São institutos voltados para os problemas regionais”.

Teixeira também apresentou o panorama das Unidades de Pesquisa do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCT&I), concentrados sobretudo no Sudeste. Além disso, o cientista comparou a existência de institutos de matemática entre alguns países – enquanto os Estados Unidos têm 16 institutos e a França nove, o Brasil conta com apenas um. O pesquisador propôs a criação de mais centros de pesquisa nas regiões desfalcadas, ressaltando os benefícios reais para essas áreas. “O sucesso em implementar institutos de pesquisa de alto padrão científico proporcionaria saltos de qualidade em vários outros aspectos do desenvolvimento do país”, concluiu.

Em seu relatório final, elaborado após o debate entre os palestrantes e integrantes da plateia, a mesa ressaltou alguns pontos importantes relativos às assimetrias regionais. O papel das FAPs foi destacado como determinante para o desenvolvimento do país, sendo defendido, assim, que haja um incentivo para que os estados que ainda não têm FAPs as criem. Também foi mencionado o fato de que algumas FAPs não oferecem o financiamento necessário à demanda dos estados em Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I), potencializando as assimetrias atuais.

A mesa também defendeu a criação de novos centros de CT&I em locais estrategicamente escolhidos no Brasil, de modo a promover uma grande mudança no desenvolvimento científico e tecnológico do país. Além disso, foi enfatizada a existência de assimetrias também entre os estados brasileiros, umas vez que atividades e condições de pesquisa são discrepantes na capital e interior.

A Amazônia foi descrita como um desafio nacional, uma vez que constitui mais de 50% do território nacional, abriga 10% da população brasileira e reúne 10% do PIB, mas conta com apenas 5% dos cursos de pós-graduação do país. Assim, é preciso criar ações específicas para atender as necessidades da região. Finalmente, foi mencionada a importância da atração e fixação de jovens doutores e seniores em regiões periféricas. Um resumo do relatório foi apresentado para representantes das agências de fomento à pesquisa, como Capes, CNPq e as FAPs de diversos estados. Para visualizar o documento, acesse esta página.

Assista ao vídeo com o relatório da Mesa Assimetrias Regionais.