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Mais uma vez Sérgio Mascarenhas tem razão

Leia artigo do Acadêmico Constantino Tsallis, comentando entrevista do Acadêmico Sérgio Mascarenhas para a Fapesp:

Em entrevista no dia 2 de setembro à Agência Fapesp, o Acadêmico Sérgio Mascarenhas focaliza os sistemas complexos ou, equivalentemente, o fenômeno da complexidade. Ele faz, mais precisamente, a distinção entre a ciência dos sistemas complexos e a ciência de suas consequências práticas.

O estudo dos fundamentos da complexidade é, além de fascinante, necessário quando o que se deseja é a compreensão profunda dos fenômenos envolvidos, suas causas, suas conseqüências. Necessário, sim, mas não suficiente quando o que se deseja é atingir a sociedade como um todo, e não somente sua atávica procura de universalidade, de satisfação de sua curiosidade — o Homo sapiens é sapiens porque é curioso, o mais curioso dos animais! Se não é suficiente, de que mais precisa?

Exatamente aquilo do qual fala Sérgio Mascarenhas, isto é, a ponte que conecta esses conhecimentos a suas aplicações. A ciência é necessária à engenharia, mas nao é suficiente. O tipo de saber envolvido nas ciências é primo irmão do saber envolvido nas suas aplicações, mas é certamente diferente. Como disse muitos anos atrás o notável físico Anatole Abragam, em sessão inaugural do Institut de France, na presença do presidente Valéry Giscard dEstaing e seus ministros, o cientista aplicado é aquele que, se a coisa funciona, não lhe interessa primordialmente o porquê, enquanto que o cientista puro, se ele sabe o porquê, não lhe interessa primordialmente como, mesmo se não funciona. No rio do saber humano, o cientista puro – o físico, o químico, o biólogo, o astrônomo, o linguista – procura as fontes, de onde a água vem, enquanto o cientista aplicado – o engenheiro, o médico – olha para onde as águas vão. É a simbiose de ambos os saberes que tem propulsado a humanidade ao longo da sua história, para o melhor e para o pior.

Muitas décadas atrás, Sérgio Mascarenhas criou, na qualidade de reitor, a Engenharia de Materiais na Universidade Federal de São Carlos. Esta disciplina se beneficiou enormemente do gabarito de muitos cientistas dos materiais provenientes da USP de São Carlos, ali ao lado, e da Unicamp, de Campinas. Mas seu conteúdo foi, como não poderia deixar de ser, diferente do da ciência dos materiais. A atual proposta de Sérgio Mascarenhas de incentivar, de criar no Brasil cursos de Engenharia de Sistemas Complexos, corre em via totalmente paralela, e, se implementada, não tenho dúvidas de que terá também um grande sucesso, como de fato acontece hoje com as Engenharias de Materiais. A comparação é muito eloquente e é a que percorre o mundo desenvolvido de hoje, levando os conhecimentos das nanociências para as nanotecnologias e destas para os celulares, para a internet, para a medicina a cada dia menos invasiva, para somente citar alguns exemplos conhecidos de todos.

E o que seria mais exatamente esta Engenharia de Sistemas Complexos? Ela deve consistir no domínio das características práticas dos sistemas complexos – feitos de muitos elementos relativamente simples interconectados em geometrias frequentemente hierárquicas, fractais, irregulares. O comportamento coletivo de tais sistemas, suas estruturas e dinâmicas sofisticadas, originam-se em elementos que interagem através de dinâmicas de grande simplicidade. É na interminável repetição, nos grandes números, que nascem os fenômenos macroscópicos que o homem observa e nos quais está imerso. É isto que ocorre nas complexas dinâmicas ecológicas, nos desastres naturais, como tsunamis, terremotos, furacões, na complexa evolução de nosso meio ambiente, nas profundas modificações que o homem – querendo ou sem querer – vai provocando na fauna e na flora, na agricultura. É assim também no plasma do vento solar, intensamente estudado pela NASA, ESA e outros organismos internacionais, acompanhados pelas Nações Unidas.

É isto que ocorre na evolução das línguas e das culturas, dos mercados, na camada de ozônio, nos surtos epidêmicos da doença de Chagas, do dengue, da tuberculose. É isto que ocorre nas turbulências da nossa atmosfera, das galáxias, das multidões e da fusão nuclear no tokamak, que talvez venha a representar uma das mais importantes fontes de energia para uso humano para nossos filhos, nossos netos. É talvez isto que ocorra nas profundezas das sopas de quarks e glúons que se formam após as formidáveis colisões entre prótons e outras partículas elementares, que são provocadas no poderoso LHC em Genebra, ou em Brookhaven, nos Estados Unidos, ou nos fluxos de raios cósmicos, observados pelo observatório Auger. Todas essas manifestações da natureza, dos sistemas artificiais e dos sistemas sociais têm surpreendentes elementos em comum. É isto que estuda a ciência dos sistemas complexos – razão de ser do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Sistemas Complexos, criado três anos atrás e congregando atividades de 36 cientistas de 18 instituições do Brasil.

E qual é o foco proposto para uma Engenharia de Sistemas Complexos? As aplicações práticas desses conceitos no processamento de sinais (eletrocardiogramas, eletroencefalogramas, temperaturas de El Niño, perfis ao longo dos acessos a reservatórios de petróleo), no processamento de imagens (de mamografias, de tomografia computadorizada, de visão noturna, das placas -ocasionalmente sujas, ou enferrujadas – dos carros que atravessam sinais em vermelho ou que viajam a velocidades proibidas), da classificação automática de centenas e milhares de células normais ou cancerosas. As aplicações práticas para a otimização das rápidas e numerosíssimas operações financeiras do mundo de hoje, dos algoritmos computacionais que regulam procedimentos de praxe nas indústrias química e farmacêutica, do tráfego de sinais na internet e outras redes computacionais, e no de carros e motocicletas nas grandes cidades. A lista é simplesmente interminável.

Mais uma vez, como quando patrocinou a criação da Engenharia de Materiais em São Carlos e o Departamento de Física de Recife, ou quando, durante um seminário na UnB, 35 anos atrás, disse: “Nos países subdesenvolvidos, temos que estar sempre atentos, pois até quando a gente tem razão, dizem que a gente está errado”, Sérgio Mascarenhas está coberto de razão.

Por uma nova engenharia

Leia entrevista do Acadêmico Sérgio Mascarenhas para a Agência Fapesp, publicada em 2 de setembro:

O Brasil está ficando para trás em uma área de fronteira do conhecimento, denominada “sistemas complexos”, que é tão importante como a nanotecnologia e as terapias com células-tronco, nas quais o país tem investido e em que a nova área também se aplica.

O alerta é de Sérgio Mascarenhas, professor e coordenador do Instituto de Estudos Avançados (IEA) de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP).

No início da década de 1970, quando foi reitor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Mascarenhas idealizou e lançou o curso de engenharia de materiais, pioneiro na América Latina.

Segundo ele, o país deve investir agora na criação da engenharia de sistemas que interagem entre si e que são de alta complexidade, como são definidos os sistemas complexos. Ou, caso contrário, poderá ficar muito atrás de países como os Estados Unidos, que lideram nas pesquisas nessa nova área que reúne física, química, biologia, educação e economia, entre outras especialidades.

Em 2008, Mascarenhas fundou no IEA de São Carlos, juntamente com o professor do Instituto de Química da USP de São Carlos Hamilton Brandão Varela de Albuquerque e a professora do Instituto de Física Yvonne Primerano Mascarenhas, um grupo de trabalho em sistemas complexos para contribuir para o desenvolvimento de pesquisas na área no país.

Por meio de uma associação com o Nobel de Química de 2007, Gerhard Ertl, premiado por suas pesquisas em sistemas complexos, e com um aluno do cientista alemão na Coreia do Sul, os pesquisadores brasileiros estabeleceram uma rede internacional de pesquisas na área conectando os três países.

Agora, a proposta de Mascarenhas é fomentar no Brasil a criação de um programa de pós-graduação em engenharia de sistemas complexos para diminuir o atraso do país nessa área.

Professor aposentado da USP, Mascarenhas contribuiu para a criação da área de pesquisa em física da matéria condensada no campus de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP), no fim dos anos 1950; da Embrapa Instrumentação Agropecuária, no final da década seguinte, na mesma cidade, e da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), no começo dos anos 60.

Em 2007, Mascarenhas ganhou o prêmio Conrado Wessel de Ciência Geral e, em 2002, a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico.

Professor visitante de diversas universidades estrangeiras, em suas pesquisas Mascarenhas tratou de assuntos diversos, como os eletretos, corpos permanentemente polarizados que produzem um campo elétrico e que seriam utilizados mundialmente na fabricação de microfones e aparelhos telefônicos.

No início da carreira, o pesquisador se dedicou ao estudo do efeito termo-dielétrico. Mais tarde, também realizou trabalhos na área de dosimetria de radiações (processo de monitoramento de radiação emitida), o que lhe permitiu, por exemplo, medir a quantidade de radiação existente em ossos de vítimas de Hiroshima.

Recentemente, Mascarenhas desenvolveu um método minimamente invasivo para medir pressão intracraniana que recebeu apoio da Organização Mundial da Saúde (OMS) para ser difundido no Brasil e em toda a América Latina. O projeto foi desenvolvido com apoio do Programa FAPESP Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE).

Agência FAPESP – O que é a engenharia de sistemas complexos?

Sérgio Mascarenhas – É uma engenharia de sistemas de sistemas. O que já existe é a engenharia de sistemas, que é aplicada em logística, em transporte e em sistemas construtivos, entre outras áreas. O que não existe é uma engenharia de sistemas que interagem entre si e que são complexos. O melhor exemplo de um sistema de sistemas é a internet, onde há desde pornografia até o Wikileaks e o Google.

Agência FAPESP – Em quais áreas a engenharia de sistemas complexos pode ser aplicada?

Mascarenhas – Ela se aplica não só a materiais mas em operações financeiras e no agronegócio, por exemplo, em que há uma série de problemas que influenciam a produção agrícola. Há o problema do solo, de defensivos e insumos agrícolas, de estocagem e transporte, por exemplo, para que toda a produção da região Centro-Oeste do Brasil seja exportada.

Agência FAPESP – São sistemas que envolvem muitas variáveis?

Mascarenhas – Exatamente. Todo sistema que apresenta muitas variáveis é um sistema complexo. E isso pode se agravar se a interação entre essas variáveis for não linear. Por exemplo, no agronegócio, se dobrar a produção de milho, se quadruplicar o preço do transporte do sistema logístico frente às dificuldades das estradas brasileiras, aí aparecem as chamadas não linearidades. Então, quando se tem um sistema complexo, as variáveis podem interagir não linearmente. Elas podem se multiplicar até exponencialmente.

Agência FAPESP – O que o motivou a encampar a criação no Brasil dessa nova área?

Mascarenhas – Neste ano se comemoram 40 anos da criação do curso de graduação em engenharia de materiais na UFSCar, que idealizei quando era reitor da universidade e que é um sucesso. Agora, achei que deveria propor algo mais moderno, voltado para o século 21. A engenharia de sistemas complexos é uma área nova e muito interessante e para qual não está sendo dada a devida atenção no Brasil. Se fala bastante no país em pesquisa em áreas como a nanotecnologia e células-tronco, mas não sobre a engenharia de sistemas complexos, que se aplica a todas essas áreas e na qual não estamos formando gente.

Agência FAPESP – Como essa nova engenharia poderia ser implementada no país?

Mascarenhas – A ideia seria criar um programa de pós-graduação em engenharia de sistemas para formar professores e pesquisadores nessa área. Não existe engenharia de sistemas complexos no Brasil e não há pesquisadores no país nessas áreas nem em faculdades tradicionais, como a Escola Politécnica da USP e as Faculdades de Engenharia da USP de São Carlos e da UFSCar. O que já existe no Brasil é engenharia de sistemas, mas não uma engenharia de sistemas que interagem entre si e que são de alta complexidade.

Agência FAPESP – Por que essa nova engenharia ainda não existe no Brasil?

Mascarenhas – Porque é uma área muito nova e no Brasil há uma preocupação em “tapar o buraco” de uma porção de outras engenharias, como a de materiais, de sistemas elétricos e até de meio ambiente, e se perde o futuro tratando do passado. É um atraso muito grande da engenharia brasileira ainda não atuar em sistemas complexos. Além disso, o problema dessas áreas novas é que é preciso ter bons contatos internacionais e políticas de Estado – e não de governo – para enfrentar algo que representa um risco.

Agência FAPESP – De que modo as pesquisas nessa área no Brasil poderiam ser articuladas?

Mascarenhas – Teríamos que ter uma rede. Hoje não se faz nada, se se quer ter impacto, sem falar em rede de pesquisa. Mesmo porque ainda somos tão poucos no Brasil que se não nos juntarmos em rede conseguiremos muita pouca coisa, por falta de massa crítica. Um centro de pesquisa nessa área não pode ser sediado só em São Carlos. Outras universidades também estão interessadas.

Agência FAPESP – Há algum grupo de pesquisa nessa área no Brasil?

Mascarenhas – No Instituto de Estudos Avançados da USP, em São Carlos, temos um grupo de trabalho sobre sistemas complexos. Essa é uma história interessante porque quem ganhou o prêmio Nobel de Química em 2007 foi um cientista alemão, chamado Gerhard Ertl, por suas pesquisas sobre sistemas complexos. E nós, no IEA, fizemos uma associação com o Ertl, na Alemanha, e com um aluno dele na Coreia do Sul. Então, agora temos em São Carlos uma rede de pesquisa sobre sistemas complexos integrando Berlim, São Carlos e a Coreia do Sul.

Agência FAPESP – Quais os países que lideram nas pesquisas em sistemas complexos?

Mascarenhas – O país que está na vanguarda nessa área são os Estados Unidos, com o MIT [Massachusetts Institute of Technology], com um centro que lida muito com questões bélicas. A própria guerra é um sistema complexo, porque nela há uma série de sistemas interagindo, como o de transportes, ofensivo, estratégico e de logística, para alimentar os soldados e transportar equipamentos e armamentos. Os militares lidam com sistemas de sistemas. Aliás, se olharmos para o passado, vemos que muitas aplicações de engenharia foram motivadas pelo poder bélico, como a internet, a robótica e bombas atômica e de fusão. O grande problema da humanidade hoje é criar instituições motivadoras de inovação que não sejam estimuladas apenas pela guerra militar, porque temos outras guerras para vencer. Tem a guerra da saúde, da educação, da violência urbana e muitas outras. E a engenharia de sistemas complexos pode ser aplicada para acabar com essas guerras sociais. Se o Brasil não aproveitar essa chance para ingressar nessa área, vamos ficar muito para trás em relação a outros países.

Falece José Marques Correia Neves

Morreu nesta terça-feira, 9, aos 82 anos, o professor José Marques Correia Neves, aposentado do Departamento de Geologia do Instituto de Geociências (IGC) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Professor Emérito da UFMG, era membro da Academia Brasileira de Ciências. Foi agraciado com a Ordem do Mérito Científico do CNPq. Fundou, em 1981, o Centro de Pesquisa Professor Manoel Teixeira da Costa (CPMTC), “sua mais importante criação para institucionalização da pesquisa em geologia na UFMG”, segundo o professor Antônio Carlos Pedrosa Soares, que teve Correia como primeiro orientador e inspirador científico.

Pedrosa afirma que José Marques Correia Neves “desde Coimbra, aprendeu, exercitou e disseminou, por muitas terras, o valor da Ciência na formação das pessoas e desenvolvimento dos povos”.

Em documento endereçado a amigos e pesquisadores de vários países que conviveram com Correia Neves, Pedrosa expressa seu “profundo agradecimento pelos ensinamentos e pela criação do CPMTC”.

Leia homenagem prestada a Correia Neves prestada em 2000, na revista Geonomos, do IGC.

Membro Correspondente Morris Pollard falece aos 95 anos

Faleceu, no dia 18 de junho, o Membro Correspondente da ABC Morris Pollard. O norte-americano de 95 anos era professor emérito de Ciências Biológicas e diretor do Laboratório Lobund da Universidade de Notre Dame, em Indiana, nos Estados Unidos.

Nascido em 1916, o patologista experimental graduou-se na Universidade do Estado de Ohio em 1938, concluiu o mestrado no Instituto Politécnico de Virginia em 1939 e o doutorado na Universidade de Berkeley, na Califórnia, em 1950. O Membro Correspondente pesquisou sobre doenças virais e descobriu o primeiro retrovírus em 1938. Pollard pesquisava sobre a leucemia aviária para o Departamento de Agricultura dos EUA quando começou a Segunda Guerra Mundial, em 1939.

Durante quatro anos, ele serviu ao US Army Veterinary Corps, que visa apoiar a estratégia militar nacional oferecendo ajuda médica veterinária. Lá, ele pesquisou e testou vacinas para doenças exóticas que atingiam soldados no Pacífico, como Tifo e Pneumonia Atípica Primária. A exposição a esse trabalho perigoso, que chegou a matar dois colegas de Pollard e deixou outros com deficiências permanentes, levou o cientista a receber a Medalha do Exército e as mais altas honras militares por heroísmo fora de combate.

Após a guerra, o cientista ingressou na Universidade do Texas, onde sua pesquisa pioneira o levou ao desenvolvimento do primeiro teste sorológico para a hepatite A. Em 1961, Pollard foi convidado para assumir o Laboratório Lobund, uma instalação para pesquisas biológicas da Universidade de Notre Dame que estava então em declínio. Como diretor do laboratório, ele fez com que a pesquisa e o ensino se desenvolvessem, supervisionando o mais longo programa de pesquisa médica da universidade por quase 50 anos e publicando mais de 300 artigos científicos.

Pollard estudou continuamente os vírus e o câncer, contribuindo com avanços à pesquisa sobre transplantes de medula óssea para tratar a leucemia, o que o levou a ser agraciado com o Prêmio Hope da American Cancer Society. O cientista havia afirmado, recentemente, que “não poderia se imaginar fazendo outra coisa”: “Eu acho que, se você estiver fazendo algo significativo e importante e de repente para, você sempre vai olhar para trás com arrependimento”.

Falece o Acadêmico Paschoal Senise

Morreu aos 93 anos, no dia 21 de julho, o Acadêmico Paschoal Ernesto Américo Senise (na foto ao lado). Senise era ex-diretor e um dos pioneiros do ensino e da pesquisa em química na USP, tendo sido conselheiro da FAPESP e vice-presidente da ABC. A missa de sétimo dia será celebrada na quarta-feira, dia 27/07, às 19h na Igreja Nossa Senhora Mãe do Salvador (Cruz Torta), situada na Av. Prof. Frederico Hermann Jr., n° 105, Alto de Pinheiros, em São Paulo. A Academia cumprimenta a família e lastima a grande perda.

Em sua homenagem, o Acadêmico Ivano Gebhardt Rolf Gutz escreveu um depoimento.

“É com pesar que comunicamos o falecimento do Professor Emérito Paschoal Senise, ocorrido no dia 21 de julho de 2011. Admirável como docente, cientista, Acadêmico, dirigente, formulador, conselheiro, gentleman e amigo, o Prof. Senise foi o protagonista da implantação do bem sucedido sistema de pós-graduação da Universidade de São Paulo, com profundos reflexos no sistema brasileiro. Ofertou à Educação todo o trabalho de sua longa vida, como bem registra o livro que lhe foi dedicado pela CAPES, “Paschoal Senise: uma Carreira Dedicada à Educação” [Colli, W. et al. (Eds.), Brasília, Paralelo 15, CAPES, 2001].

Nascido em agosto de 1917, Paschoal Ernesto Américo Senise ingressou na recém-criada Universidade de São Paulo em 1935, como aluno da 1ª turma do Curso de Química. Em 1939 foi admitido com Assistente Adjunto da FFCL, enquanto trabalhava em sua tese, orientada pelo Prof. Heinrich Rheinboldt e defendida em 1942. Foi o primeiro docente da instituição a concentrar-se na Química Analítica, sempre propagando a visão de que a pesquisa deve voltar-se para a elucidação de fenômenos básicos e gerar conhecimento amplo, para que dele decorram, de maneira lógica e natural, as aplicações analíticas. Contribuiu nas linhas de extração com solventes com destaque para sais de fosfônio, estudos de estabilidade de complexos, especialmente os de pseudo-haletos, desenvolvimento de spot tests e métodos quantitativos de análise. Cuidou da introdução de linhas de pesquisa em análise microquímica e química eletroanalítica depois do pós-doutorado com os Profs. Philip W. West e Paul Delahay nos EUA (1950-1952). Crescentemente requisitado em atividades de gestão acadêmica, gerou, assim mesmo, relevante produção científica, inclusive quatro dezenas de trabalhos científicos indexados. Entre seus dez discípulos, Eduardo F. A. Neves, Alcídio Abrão, Jaim Lichtig e Oswaldo E. S. Godinho foram os mais pródigos na formação de pós-graduados, que se espalharam pelo país e, em sua maioria, seguiram carreira universitária, de modo que sua descendência acadêmica já alcança a 5ª geração e é contada em centenas. Suas aulas magistrais, devotadas à compreensão dos equilíbrios químicos e demais princípios em que se fundamentam as técnicas e métodos analíticos, mesmo quando dirigidas à graduação, atraíam doutorandos e até docentes do quadro.

O Prof. Senise ascendeu na carreira até o cargo de Professor Catedrático (1965) e, como primeiro diretor do Instituto de Química da USP (1970-1974), acolheu e integrou com sucesso, nos novos departamentos de Química Fundamental e de Bioquímica, todos os pesquisadores dessas áreas, dispersos pelas unidades da universidade até a reforma universitária de 1970. Voltou a ocupar a direção entre 1978 e 1982, quando impulsionou a ampliação do quadro e da infra-estrutura. Sua atuação como presidente da Câmara Central de Pós-Graduação da USP por quase duas décadas (1969-1987) foi decisiva na implantação e estruturação da pós-graduação na USP e no seu florescente desenvolvimento. Senise compôs ou dirigiu conselhos de entidades como CAPES, FAPESP, CNPq, Conselho Federal de Química, Instituto Butantan, Academia Brasileira de Ciências e outras. Com inteligência, discrição, estilo e precisão peculiares, o Prof. Senise nos dá a conhecer a história que ajudou a moldar no livro “Reminiscências e Comentários sobre a Origem do Instituto de Química da USP” (2006, disponível no site do IQ-USP). De leitura obrigatória são, também, as suas reflexões e citações de outros eminentes cientistas sobre as diferenças entre “Química Analítica e Análise Química” (Química Nova, 1993, 16, 257).

Durante todo o último quarto de século, já como Professor Emérito da USP (1987) e, consecutivamente, Prof. Honorário do Instituto de Estudos Avançados da USP (1997) e Pesquisador Emérito do CNPq (2004), Paschoal Senise prosseguiu trabalhando do IQ-USP todas as manhãs e interagindo semanalmente com as novas gerações de mestrandos e doutorandos ao coordenar os Seminários Gerais em Química Analítica. Atendia com admirável, cordialidade, lucidez e dedicação todos quantos buscassem sua ajuda ou conselhos.

Membro da Academia Brasileira de Ciências e de várias associações científicas nacionais e internacionais, o Prof. Senise era Comendador da Ordem do Rio Branco (1976), recebeu a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico (1994), as medalhas do Jubileu de Prata (SBPC, 1973) e Simão Mathias (SBQ, 1997), os prêmios Heinrich Rheinboldt (1969), Moinho Santista (1981) e Anísio Teixeira (MEC, 1991) e outras honrarias e homenagens.

Em suma, o Brasil foi servido durante 3/4 de século por um acadêmico que, com talento, estudo, ética, espírito universitário e amor ao trabalho, gerou ciência, deixou escola, educou gerações, administrou instituições, traçou e geriu políticas científicas. Sua memória certamente persistirá como paradigma para as gerações vindouros, exemplificas pela multi-talentosa pré-universitária Tábata C. A. de Pontes, vencedora de diversas olimpíadas científicas no país e que acaba de conquistar medalha para o Brasil na Olimpíada Internacional de Química. Tábata quis conhecer o Prof. Senise e ele a recebeu em 21 de junho passado. Ambos comentaram ter ficado impressionadíssimos nesta que foi a última longa entrevista.”

Acadêmico Otto Gottlieb falece aos 91 anos

O Acadêmico Otto Richard Gottlieb, reconhecido internacionalmente por suas contribuições à Química, faleceu na madrugada do dia 20 de junho. Ele foi responsável por desenvolver estudos sobre a estrutura química das plantas, que permite analisar o estado de preservação de vários ecossistemas brasileiros. Sua pesquisa o levou a ser indicado ao Prêmio Nobel de Química em 1999.

Nascido na Tchecoslováquia (atual República Tcheca) em 1920, Otto chegou ao Rio de Janeiro em 1939. Sendo sua mãe natural de Petrópolis, ele optou por obter a nacionalidade brasileira aos 21 anos. Graduou-se em Química Industrial em 1945 e, após atuar na indústria durante dez anos, decidiu seguir a carreira acadêmica.

Fascinado pela diversidade da composição química da flora brasileira, Otto foi pioneiro na introdução da fitoquímica e da química orgânica moderna. O cientista considerava que, no século XXI, a compreensão dos mecanismos da natureza teria grande importância para o futuro da vida no planeta e constituiria o desafio mais significativo para os cientistas que vivem nas últimas fronteiras biológicas. Ele estudou, entre outras espécies, as lauráceas e miristicáceas, além da canela, cujo estudo resultou em aplicações medicinais, fitoterápicas e culinárias da espécie.

Com mais de 700 trabalhos publicados, Otto implantou o laboratório de fitoquímica da Universidade de Brasília (UnB), criou o laboratório de Química de Produtos Naturais no Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP) e foi pesquisador do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) no antigo Departamento de Fisiologia e Farmacodinâmica, onde atuou até se aposentar.

Entre os muitos prêmios e homenagens conquistados pelo cientista, estão a Condecoração de Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico, concedida pela Presidência da República; o prêmio de C&T da Cidade do Rio de Janeiro, concedido pela Prefeitura; o Prêmio Scopus 2006, concedido pela Editora Elsevier e Capes/MEC, e a Medalha do Mérito do Jardim Botânico do Rio de Janeiro.

O sepultamento acontecerá nesta terça-feira (21 de junho), às 12h, no Cemitério Comunal Israelita do Caju, no Rio de Janeiro.

Falece o Acadêmico Juarez Brandão Lopes

Juarez Brandão Lopes nasceu em Poços de Caldas, Minas Gerais, em 1925. Começou cursando Engenharia, mas a trocou pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo, onde se bacharelou em Ciências Sociais e Políticas, em 1950. Fez o mestrado e o doutorado na Universidade de Chicago, mas defendeu a tese na Universidade de São Paulo (USP), onde trabalhou toda a vida. Também foi docente da Faculdade de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas.

Sua carreira teve forte caráter interdisciplinar. Sempre dedicado à Sociologia Industrial e Urbana, mesmo depois de aposentado na USP, trabalhou, ainda, por doze anos, no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde aposentou-se compulsoriamente em 1995. Atuou ainda como Professor visitante em várias instituições estrangeiras, como a Universidade do Texas, a Universidade de Amsterdam e a Universidade da Califórnia.

Foi um dos fundadores do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), do qual foi diretor e presidente. Exerceu cargos administrativos na esfera do governo federal, tendo sido diretor do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), adjunto na Secretaria de Planejamento da Presidência da República (Seplan) e vice-presidente do Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais (IPEA). Foi Assessor Especial do Ministério do Trabalho e coordenador geral do Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, junto do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável, no atual Ministério de Desenvolvimento Agrário. Foi presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs) e participou de comitês do Social Science Research Council, nos EUA.

Recebeu da Presidência da República do Brasil o título de comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico, em 1996, e a Grã-Cruz, em 2001. No mesmo ano, lhe foi outorgada a comenda da Ordem do Rio Branco pelo Ministério das Relações Exteriores e a Medalha Capes 50 Anos, pelo Ministério da Educação.

O sociólogo Juarez Rubens Brandão Lopes morreu na madrugada de 9 de junho, aos 85 anos, por falência de órgãos. Ele deixou viúva, um filho e uma neta. A Diretoria da ABC lamenta essa grande perda e cumprimenta a família.

Falecimento de Acadêmico Aluízio Prata

Considerado a maior autoridade brasileira em Medicina Tropical, Aluízio Rosa Prata morreu na última sexta-feira, 13 de maio, aos 91 anos. Seu corpo foi velado na Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), de onde partiu o féretro rumo ao Cemitério São João Batista, em Uberaba (MG).

Veja abaixo matéria publicada nas Notícias da ABC em 2008, contando sua história, à qual foram acrescentados dados recentes, publicados no Boletim da Faperj:

Aluízio Rosa Prata nasceu em 1º de junho de 1920, em Uberaba, Minas Gerais, numa família de fazendeiros, sendo o mais velho de seis irmãos. Criado na fazenda, aos oito anos foi encaminhado para o colégio interno – o Colégio Marista -, que tinha uma disciplina muito rígida. “Eu sofri muito, tinha que acordar cedo, tomar banho frio, antes eu vivia solto lá na fazenda”, conta Aluízio.

No início ele não era bom aluno, não gostava, não estudava. Mas com o tempo foi vendo que ia ter que ter uma profissão, mudar, ia ter que dar um rumo para a vida. Quando terminou o ginásio conversou muito com um parente do Rio de Janeiro, que lhe apresentou diversas opções, e lá se foi Aluízio, com 17 anos, para o Rio de Janeiro. “Tive um choque muito grande, a vida no Rio era muito diferente, tinha saudade de casa”, confessa o pesquisador.

Ele conta que de início, via os amigos do seu tio, profissionais bem sucedidos, alguns médicos, mas não achava que tivesse muita vocação pra Medicina, que pudesse ser igual a eles. E se preocupava em apresentar algum retorno, alguma justificativa para estar no Rio de Janeiro, pois seu pai não era muito rico, mas lhe mandava religiosamente uma mesada. “Meu pai dava muito apoio para tudo que a gente queria fazer, quando eu fui embora ele disse pra eu experimentar seis meses, e que voltasse se não desse certo.”

Fazia o Colégio Universitário, para entrar na universidade, ainda sem saber o que cursar. Com o tempo, porém, foi tomando gosto pelo estudo, e quando decidiu entrar para Medicina foi logo que pôde para o pronto socorro, para a parte prática. “Já estava disposto a estudar bastante, vi que eu era capaz.”

No Rio trabalhou em vários hospitais, já tinha gosto pelo estudo e pensava em se dedicar mais às doenças do Brasil, como a esquistossomose e a doença de Chagas. “Eu já estava formado, clinicava na Marinha, já tinha feito concurso, e pesquisava ao mesmo tempo. Conversava muito com pessoas que tinham voltado de Mato Grosso e achei que seria um lugar interessante para começar a vida. Fiz o concurso e fui para Ladário, em Corumbá.”

Aluízio estudava muito, assinava 15 revistas médicas internacionais, estava sempre se atualizando e foi se dedicando cada vez mais às doenças infecciosas. “Lá tinha muita sífilis e eu me dediquei bastante a isso. Mas fiquei lá só dois anos, era ruim demais. Um calor insuportável, os outros médicos muito competitivos com quem vinha do Rio, enfim, vi que lá não ia ter muita oportunidade”, concluiu o ousado pioneiro.

Conseguiu ser transferido de volta para o Rio de Janeiro, montou um consultório e clinicava em três hospitais. Conheceu então os irmãos José e Hélio Pellegrino, médicos mineiros como ele, que gostavam de fazer pesquisa, e se interessou pela área. “Achei que eu deveria sair do Rio e achar um lugar que tivesse mais condições de estudar o que me interessava. Estava entre amebíase, onde o forte era no Pará, e esquistossomose, forte na Bahia, que foi para onde eu decidi ir”, recorda Prata. E lá ele descobriu do que realmente gostava.

“Quando cheguei na Bahia, vi que o pessoal não gostava de trabalhar com esquistossomose porque tinha muito, eles gostavam de doenças raras. Então eu me envolvi e me tornei representante da Bahia em diversas reuniões nacionais sobre esquistossomose.” Ele mesmo fazia os exames de fezes, já tinha então 150 doentes e vários resultados. Foi representar a Bahia numa reunião em São Paulo, e lá se abriu um outro mundo para ele. “Eu conheci lá os melhores profissionais do Brasil que trabalhavam com esquistossomose, o único fraco era eu. E eu decidi que ia chegar lá também. Foram dois dias com eles lá e então eu vi que era isso que eu queria da minha vida”, contou Prata.

O médico trabalhou muitos anos na Bahia, outros tantos em Brasília, e depois voltou para Uberaba. Tornou-se professor catedrático de Doenças Tropicais e Infecciosas e fundou diversos centros de pesquisa e cursos de pós-graduação na área, em todos os estados em que trabalhou. Joje, é considerado o decano da Medicina Tropical no Brasil.

Realizações profissionais

Aluízio Rosa Prata foi catedrático e livre docente da Universidade Federal da Bahia (UFBA), titular da Universidade Nacional de Brasília (UnB), titular e doutor honoris causa da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Nas três universidades, foi responsável pela criação de grandes escolas de tropicalistas no país.

Foi membro das Academias Mineira e Brasileira de Medicina, além de ter sido membro de diversas comissões da Organização Mundial de Saúde, da Organização Panamericana de Saúde e dos Ministérios da Saúde e Educação. Representou o Brasil na Unesco em sua área. Foi editor de diversas revistas científicas especializadas e fundou a Sociedade Latino Americana de Medicina Tropical (SBMT). Publicou mais de 530 trabalhos científicos e orientou mais de 50 teses de mestrado e de doutorado ao longo de sua vida.

Entre outros prêmios e homenagens, Aluízio Prata recebeu a Comenda da Ordem do Rio Branco do Ministério das Relações Exteriores (1974), o Prêmio Alfred Jurzykovski da Academia Nacional de Medicina (1980), a Medalha Capes 50 anos (2001), a Medalha da Ordem do Grande Mérito da Saúde do Governo do Estado de Minas Gerais (2002) e, no mesmo ano, a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico do Presidente da República do Brasil. Na Inglaterra, foi laureado pela Royal Society of Tropical Medicine.

O professor era casado com Martha Toubes Prata, com quem teve três filhos: Aluízio Prata Júnior, professor da Universidade da Califórnia; Álvaro Toubes Prata, reitor da Universidade Federal de Santa Catarina; e a educadora Martha Toubes Prata.

A Diretoria da ABC cumprimenta a família e lamenta a perda de tão ilustre Membro.

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