Nos dias 24 e 25 de junho, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) organizou o Fórum de Academias de Ciências dos BRICS 2025, reunindo representantes de Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Malásia e Egito no Palácio da Cidade, no Rio de Janeiro. Inicialmente também estavam previstos representantes de Belarus, Nigéria e Irã, mas estes não puderam comparecer. A realização do evento foi possível graças ao patrocínio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Governo Federal, e contou com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
A presidente da ABC, Helena Nader, abriu as discussões trazendo aquele que seria o ponto focal da presidência brasileira no Fórum: o fomento a cooperação científica no bloco. Ela lembrou que os países que hoje compõe os BRICS representam 45% da população mundial e 30% do investimento em ciência, porém ainda fazem apenas 7% de suas pesquisas em colaboração mútua. “Isso precisa mudar, que seja esse o momento”, disse.
O secretário-executivo do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luis Manoel Fernandes, ressaltou o papel crucial das academias em fomentar a diplomacia científica em um momento em que os países desenvolvidos estão dando as costas ao sistema internacional. “A mensagem que mandamos ao mundo é de que temos que consolidar um novo sistema com base na cooperação global. Enquanto potências estão largando o sistema internacional do pós-guerra, cabe a nós fortalecermos instituições multilaterais que reflitam as nossas realidades”, afirmou.
Sobre as deliberações do Fórum, o vice-presidente da ABC para a Região Norte, Adalberto Luis Val, refletiu ao encerrar o evento: “Estabelecemos compromissos ambiciosos, mas realistas: fortalecer a pesquisa e a inovação conjuntas, proteger e usar com sabedoria nossa vasta biodiversidade e riqueza cultural, desenvolver soluções de ponta para a crise climática e equipar nossos jovens com as habilidades e oportunidades necessárias para se tornarem os líderes do amanhã. Esses objetivos não são meras aspirações. São um chamado à ação”.
Confira um resumo do que cada Academia reforçou em suas falas:
Brasil
O objetivo da ABC na condução dos debates foi incentivar a criação de mecanismos que incentivem o intercâmbio e a colaboração entre cientistas dos BRICS. A Academia destacou, conforme se nota na declaração final, a importância do desenvolvimento conjunto e da redução das assimetrias na infraestrutura científica e tecnológica e na formação de cientistas. A ABC também elencou como prioritárias as áreas de biodiversidade, soluções climáticas e novas tecnologias digitais.
China
A Academia Chinesa de Ciências (CAS) focou no suporte à jovens cientistas dentro de um ecossistema científico dos BRICS. Seu representante incentivou a colaboração entre os países emergentes através da Aliança de Organizações Científicas Internacionais (Anso), organização criada em 2018 durante uma edição prévia do Fórum de Academias dos BRICS. No âmbito da Anso, foi ventilado a criação de um programa de cursos de verão para início já em 2026, em Beijing, onde jovens cientistas dos BRICS terão a oportunidade de acumular experiência internacional e expandir redes de colaboração.
A CAS também se posicionou favoravelmente a mecanismos de Open Science conjuntos para os BRICS, sobretudo em áreas estratégicas com IA, Big Data, computação quântica e mudanças climáticas.
Índia
A Academia Nacional de Ciências da Índia (INSA) destacou em sua participação que o Sul Global é heterogêneo e isso se reflete na forma como são estruturados os sistemas de CT&I de cada país. Dessa forma, é preciso evitar emular soluções desenvolvidas para os países desenvolvidos ou mesmo para outros países emergentes, mas focar em desenhar estratégias especificas para cada regiões, encorajando a experimentação e a troca de experiências.
O país identifica a digitalização como uma área vital para a inclusão produtiva de setores marginalizados na economia do século 21, com proteção aos direitos de autoria e à ética no desenvolvimento de novas plataformas que usam dados e prestam serviços. A criação de regulações nacionais deve respeitar as aspirações e necessidades de cada país, mas é preciso gerar compreensão internacional e pontos de contato que facilitem a criação de protocolos entre países e a geração de confiança mútua.
No caso de tecnologias emergentes, como a inteligência artificial, é indispensável que o Sul Global se posicione como um ator participativo na definição de caminhos pelas quais essas tecnologias irão trilhar, e não apenas como meros consumidores. Isso significa trazer o setor privado desses países, incentivando e apoiando startups de base tecnológica a competirem internacionalmente.
Egito
A Academia de Pesquisa Científica e Tecnológica (ASRT) do Egito trouxe um conjunto de propostas concretas que poderiam fomentar a colaboração científica. Entre elas estão a criação de um “passaporte científico” onde cientistas do bloco teriam prioridade na visitação à infraestruturas de P&D nos países do bloco; plataformas conjuntas de ciência aberta com comitês executivos de liderança rotativa; programas de bolsas para projetos necessariamente colaborativos; parques tecnológicos específicos para os BRICS e um fundo de investimento em CT&I compartilhado entre os BRICS com contribuições proporcionais à capacidade de fomento de cada país.
África do Sul
O representante da Academia de Ciências da África do Sul (ASSAf) destacou a necessidade do BRICS representar não apenas seus países membros mas todo o Sul Global, exemplificando com o papel que cumpre sua instituição ao fomentar a ciência nos países vizinhos à África do Sul. Ele frisou o caráter internacional da ciência, pedindo que o Fórum desse ênfase à diplomacia e à colaboração mesmo que o cenário geopolítico diga o contrário.
O papel que instituições multilaterais de ciência tiveram em fomentar o contato entre os blocos durante a Guerra Fria foi citado como um exemplo de como o Fórum deveria se portar num mundo que se divide. Além de fomentar a conversa entre posições antagônicas, o BRICS poderia servir como uma fonte alternativa de investimentos em momentos que grandes credores, como os EUA, retraem seus investimentos e se retiram do cenário internacional.
Rússia
A Academia Russa de Ciências (RAS) enfatizou a necessidade de infraestruturas de pesquisa comuns aos BRICS, focando sobretudo nas áreas de agricultura e biodiversidade. Seu representante salientou as ricas coleções biológicas das quais dispõe Brasil e Rússia, destacando o potencial de colaboração para a área de segurança alimentar e biotecnologia. Também foram sugeridos a criação de um journal em modelo ciência aberta para os BRICS e de mais associações profissionais no âmbito do bloco.
Malásia
A Academia de Ciências da Malásia (ASM) destacou a importância de que academias nacionais sejam boas comunicadoras e pontes para com os governos. Sua representante reforçou, através da experiência da instituição, que é possível colaborar ativamente no desenho de ações e incentivos e participar no cenário regional e internacional. As áreas de meio ambiente, transição energética, digitalização e saúde foram citadas como algumas das prioridades de colaboração nos BRICS.
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