Nos dias 24 e 25 de junho, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) organizou e conduziu o Fórum de Academias de Ciências do BRICS 2025, no Palácio da Cidade do Rio de Janeiro. A Acadêmica Denise Pires de Carvalho, presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), foi uma das convidadas para apresentar uma conferência especial.
O papel estratégico da educação no Sul Global
A expansão da educação no Sul Global foi o foco da apresentação da Acadêmica Denise Carvalho no Fórum BRICS de Academias.
Em discurso fundamentado em dados e marcado por um apelo à ação coordenada, a pesquisadora destacou os desafios e as oportunidades comuns aos países emergentes na construção de um futuro baseado em conhecimento, inovação e equidade.
Denise começou por reafirmar o significado contemporâneo do termo “Sul Global”, que ultrapassa fronteiras geográficas para incluir nações com trajetórias históricas e desafios estruturais semelhantes, especialmente no campo do desenvolvimento econômico e social. “A renda per capita está diretamente ligada ao acesso à educação superior”, explicou. “E é aí que os BRICS podem e devem atuar juntos.”
Dados apresentados revelam a importância do acesso à educação como catalisador de mobilidade social. A Austrália, o Chile e o Uruguai, por exemplo, demonstram que a elevação do nível de escolaridade da população impacta diretamente o status de renda das nações. No Brasil, o número de instituições de ensino superior triplicou entre 2002 e 2023. O desafio atual, no entanto, não é apenas de quantidade, mas de qualidade e equidade.
A presidente da Capes alertou para as desigualdades regionais e raciais na educação. Enquanto os concluintes negros, indígenas e multirraciais do ensino médio — cerca de 66% dos estudantes — se concentram nas regiões com menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Nos locais com maior IDH, há mais oferta de educacao superior. Há, portanto mais oportunidade de ingresso na educacao superior para brancos e asiaticos. O desequilíbrio urbano-rural também pesa na equação.
“É urgente expandir a educação técnica e profissional de excelência, com formações mais rápidas e eficazes para quem não quer ou não pode cursar uma faculdade”, defendeu Denise, ressaltando a importância de políticas públicas como o programa Pé de Meia, voltado a apoiar financeiramente estudantes do ensino médio.
Na pós-graduação, os números mostram avanços e impasses: apenas 14% dos programas brasileiros são considerados de excelência, segundo a Capes. Entre 2019 e 2023, cortes orçamentários comprometeram o crescimento do sistema e reduziram o número de publicações científicas — um impacto direto na capacidade do país de inovar.
Nesse sentido, Denise destacou a importância da articulação entre universidade e setor produtivo. Citando a Embrapii como exemplo de parceria bem-sucedida, ela defendeu a adoção do modelo da “hélice quádrupla” — que integra governo, academia, indústria e sociedade — para fortalecer ecossistemas de inovação. “Start-ups que interagem com universidades estão fisicamente mais próximas delas. A ciência precisa de proximidade, de ambiente, de sinergia”, afirmou.
Esse é o princípio da chamada universidade de quarta geração, que rompe os muros acadêmicos para operar em distritos de inovação, onde conhecimento, tecnologia e impacto social caminham juntos.
A pesquisadora apresentou ainda os compromissos assumidos pelos BRICS na 12ª Reunião dos Ministros da Educação, realizada em Brasília no início de junho. Os temas centrais envolvem inteligência artificial com ética e equidade, reconhecimento acadêmico transnacional, fortalecimento da educação técnica e profissional (TVET) e expansão da Rede de Universidades do BRICS.
Por fim, Denise destacou os novos desafios que se impõem aos sistemas educacionais do BRICS: cibersegurança, mudanças climáticas, conectividade digital com fins pedagógicos, saúde mental, segurança alimentar e migração forçada. Desafios interligados, que exigem soluções baseadas em evidências científicas e colaboração internacional.
O que foi dito, em suma, pela palestrante, é que educação não é despesa. É soberania. É ciência, é autonomia, é resiliência. “O Sul Global não pode mais esperar: devemos investir na formação do nosso povo se quisermos moldar o nosso próprio destino. E que os BRICS liderem essa transformação com coragem, cooperação e compromisso com as gerações futuras.”
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