No dia 25 de junho, durante sua apresentação gravada para o Fórum BRICS das Academias de Ciências, o climatologista e membro da Academia Brasileira de Ciências Carlos Nobre fez um alerta contundente sobre o agravamento da crise climática global. “As temperaturas de 2024 e do início de 2025 mostram uma aceleração no aumento da temperatura média global. Estamos ultrapassando um ponto de não retorno”, afirmou.
Segundo Nobre, os dados mais recentes sobre o aquecimento dos oceanos e a elevação contínua das temperaturas médias globais confirmam que o planeta já atingiu o limite de 1,5°C acima dos níveis pré-industriais — meta estabelecida como ideal no Acordo de Paris. “A ciência precisa entender por que passamos de 1,5°C antes do previsto. Há várias hipóteses sendo investigadas, como a redução de gelo marinho, o fim do El Niño e até a erupção do vulcão de Tonga, mas ainda não temos todas as respostas”, disse o pesquisador.
Ele explicou que o desequilíbrio energético da Terra — com mais calor entrando do que saindo — vem sendo monitorado por satélites da NASA há mais de duas décadas, e está diretamente ligado às emissões de gases de efeito estufa de origem humana. “Estamos colocando mais energia no sistema do que ele pode suportar. E cada fração de grau que conseguimos evitar significa menos sofrimento humano e menos perda ambiental”, ressaltou.
Consequências catastróficas e pontos de inflexão
Nobre alertou para a possibilidade de que o aquecimento global acima de 1,5ºC não seja mais uma exceção, mas uma tendência permanente, com impactos severos e irreversíveis. “Ultrapassar esse limiar significa correr o risco de desencadear mudanças profundas e irreversíveis nos sistemas de suporte à vida na Terra. Estamos falando de eventos extremos, colapso de ecossistemas e a quebra de vários pontos críticos do clima global”, declarou.
Entre os chamados tipping points — pontos de inflexão climática — mencionados por ele, estão o colapso da circulação oceânica no Atlântico (AMOC), o derretimento das geleiras da Groenlândia e da Antártica, o branqueamento dos corais, o descongelamento do permafrost e a savanização da Amazônia. “A Amazônia, por exemplo, pode estar se aproximando rapidamente de seu ponto de ruptura, agravado pela combinação entre mudanças climáticas e desmatamento”, alertou.
Desigualdade e educação climática
Carlos Nobre também destacou os efeitos desproporcionais da crise climática sobre as populações vulneráveis. “Eventos extremos já estão matando, destruindo e gerando bilhões em perdas econômicas. E os mais pobres são sempre os mais impactados”, disse.
Ele citou como exemplo o caso da comunidade do Retiro, em Jaboatão dos Guararapes (PE), onde nenhuma vida foi perdida durante as chuvas intensas de maio de 2022, graças à mobilização dos estudantes do programa Cemaden Educação. “Essas crianças salvaram vidas porque aprenderam sobre mudanças climáticas na escola. Isso mostra a força da educação para a adaptação e a resiliência”, afirmou.
Descarbonização e responsabilidade global
O acadêmico defendeu uma transição urgente para uma economia global descarbonizada, com o corte imediato das emissões de gases de efeito estufa. “Precisamos remover de 3 a 4 bilhões de toneladas de CO₂ até 2025. A janela de oportunidade está se fechando rapidamente”, alertou.
Segundo ele, 77% dos cientistas climáticos acreditam que o mundo ultrapassará 2,5°C de aquecimento ainda neste século — cenário que deixaria o Acordo de Paris obsoleto. “Não se trata mais de uma meta negociável, mas de uma fronteira planetária. Ultrapassá-la será uma sentença para a biodiversidade e para a humanidade”, afirmou Nobre.
COP 30 e o papel dos BRICS
Carlos Nobre concluiu sua fala com um apelo para que os países do BRICS — especialmente Brasil, China, Índia, Rússia e África do Sul — assumam protagonismo na luta contra o colapso climático. “A COP 30, que será realizada em Belém, não pode ser apenas mais uma conferência. Precisa ser um divisor de águas, com decisões concretas para zerar emissões até 2040 e preservar todos os biomas, incluindo a Amazônia”, finalizou.
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