A pós-graduação brasileira está passando por uma grande reformulação. Além da necessidade de reduzir desigualdades regionais quanto à formação de professores, há a demanda de tornar os programas mais flexíveis, rápidos, com conteúdo moderno e mais próximos da sociedade. A mudança visa também estancar uma crise: a redução do interesse e do número de alunos nas pós-graduações do país.

No âmbito estadual, as universidades públicas paulistas e a Fapesp estão unindo forças para implementar transformações que possibilitem uma pós-graduação mais atrativa, diversificada e compatível com as demandas sociais. Em nível nacional, a Coordenação de Aperfeiçoamentode Pessoal de Nível Superior (Capes) tem desenvolvido, desde 2022, o novo Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG).

A crise de identidade e as mudanças em curso foram objeto de debate no seminário “As transformações esperadas na pós-graduação brasileira”, realizado em 20 de fevereiro no auditório da Reitoria da Universidade de São Paulo (USP).

Luiz Roberto Liza Curi (USP), Marco Antônio Zago (Fapesp), Maria Arminda do Nascimento Arruda (USP), Carlos Gilberto Carlotti Junior (USP), Paulo Henrique Rodrigues Pereira (CDESS), Antonio Gomes (Capes) e Rodrigo Calado (USP) | Foto: Marcos Santos/USP Imagens

“Há anos ouço um discurso padronizado sobre as qualidades da pós-graduação brasileira. O quanto ela cresceu, o quanto descentralizou a ciência brasileira e o quanto a crescente produção científica do país depende da pós-graduação – isso até recentemente, pois nos últimos anos a produção começou a cair. Eu peço licença para discordar de muitas dessas afirmações ou, pelo menos, reconhecer que, em grande parte, elas têm fundamento frágil”, afirmou [o Acadêmico] Marco Antonio Zago, presidente da Fapesp.

Embora tenha caído, a concentração de docentes no país persiste nas regiões Sul e Sudeste, avaliou Zago. “A época do crescimento contínuo e ilimitado das pós-graduações terminou e há vários motivos para isto. E o argumento recorrente de que temos de formar mais doutores não resolve o nosso problema. Além do mais, não é aceitável que a idade média para completar o doutorado no Brasil seja de 38 anos [dez anos a mais que a média europeia]. Se não tomarmos medidas para mudar isso, não mudaremos o panorama do país.”

Segundo o presidente da Fapesp, é preciso atrair os jovens para o meio acadêmico, por exemplo, por meio de bolsas e outros mecanismos que permitam aos pós-graduandos uma vida digna e direitos previdenciários.

Zago afirmou ainda que, em meio à atual crise de identidade, é importante ter em mente que a pós-graduação “serve para o treinamento no método científico de questionamento e de busca por respostas a problemas concretos das diferentes áreas do conhecimento”. E continuou: “A meu ver, não é possível trabalhar no atacado. Não é admissível que um orientador não dedique tempo regularmente para discussão, planejamento, análise e resultados com o seu orientado, individualmente. A pós-graduação é um programa individual e não reprodutível. O restante, a meu ver, é perda de tempo”, concluiu.

Para [o acadêmico] Ésper Cavalheiro, assessor da Fapesp e coordenador do Plano Nacional de Pós-Graduação, o desenho dos programas no país transformou a defesa da tese ou a escrita da dissertação no objetivo final da pós-graduação, quando o objetivo deveria ser tornar o indivíduo um cientista. “A tese é uma consequência, é o instrumento para esse indivíduo se modificar”, ponderou.

“A maioria das políticas públicas no Brasil não está baseada na produção científica do país. Portanto, é como se tivéssemos mundos à parte. Dessa forma, o mais importante do programa foi recolocar o pós-graduando no centro da pós-graduação de novo”, acrescentou.

Cavalheiro acredita ser necessário trazer gente jovem para a pós-graduação para que o pensamento no país mude. “Ao centrar os resultados na produção de papers e no tempo [do curso], o pós-graduando se tornou uma mão de obra extra do orientador, um tarefeiro. Mas não era para ser assim. O pós-graduando é um indivíduo que tem o papel de ver o mundo de forma diferente daquela que o orientador vê, sem reproduzi-la. Triste o país que se repete de geração em geração.”

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Também participaram do seminário [o Acadêmico] Antonio Gomes, diretor de avaliação da Capes; Maria Arminda do Nascimento Arruda, vice-reitora da USP;  Rodrigo Calado, pró-reitor de Pós-Graduação da USP, [que foi membro afiliado da ABC 2013-2017]; Paulo Henrique Rodrigues Pereira, secretário-executivo do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (CDESS), órgão de assessoramento direto ao Presidente da República; Luiz Roberto Liza Curi, titular da Cátedra Paschoal Senise de Pós-Graduação (USP), que organizou o seminário.

A matéria na íntegra pode ser lida no site da Agência Fapesp

O evento pode assistido no canal do YouTube da Fapesp.