A pós-graduação brasileira está passando por uma grande reformulação. Além da necessidade de reduzir desigualdades regionais quanto à formação de professores, há a demanda de tornar os programas mais flexíveis, rápidos, com conteúdo moderno e mais próximos da sociedade. A mudança visa também estancar uma crise: a redução do interesse e do número de alunos nas pós-graduações do país.
No âmbito estadual, as universidades públicas paulistas e a Fapesp estão unindo forças para implementar transformações que possibilitem uma pós-graduação mais atrativa, diversificada e compatível com as demandas sociais. Em nível nacional, a Coordenação de Aperfeiçoamentode Pessoal de Nível Superior (Capes) tem desenvolvido, desde 2022, o novo Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG).
A crise de identidade e as mudanças em curso foram objeto de debate no seminário “As transformações esperadas na pós-graduação brasileira”, realizado em 20 de fevereiro no auditório da Reitoria da Universidade de São Paulo (USP).

“Há anos ouço um discurso padronizado sobre as qualidades da pós-graduação brasileira. O quanto ela cresceu, o quanto descentralizou a ciência brasileira e o quanto a crescente produção científica do país depende da pós-graduação – isso até recentemente, pois nos últimos anos a produção começou a cair. Eu peço licença para discordar de muitas dessas afirmações ou, pelo menos, reconhecer que, em grande parte, elas têm fundamento frágil”, afirmou [o Acadêmico] Marco Antonio Zago, presidente da Fapesp.
Embora tenha caído, a concentração de docentes no país persiste nas regiões Sul e Sudeste, avaliou Zago. “A época do crescimento contínuo e ilimitado das pós-graduações terminou e há vários motivos para isto. E o argumento recorrente de que temos de formar mais doutores não resolve o nosso problema. Além do mais, não é aceitável que a idade média para completar o doutorado no Brasil seja de 38 anos [dez anos a mais que a média europeia]. Se não tomarmos medidas para mudar isso, não mudaremos o panorama do país.”
Segundo o presidente da Fapesp, é preciso atrair os jovens para o meio acadêmico, por exemplo, por meio de bolsas e outros mecanismos que permitam aos pós-graduandos uma vida digna e direitos previdenciários.
Zago afirmou ainda que, em meio à atual crise de identidade, é importante ter em mente que a pós-graduação “serve para o treinamento no método científico de questionamento e de busca por respostas a problemas concretos das diferentes áreas do conhecimento”. E continuou: “A meu ver, não é possível trabalhar no atacado. Não é admissível que um orientador não dedique tempo regularmente para discussão, planejamento, análise e resultados com o seu orientado, individualmente. A pós-graduação é um programa individual e não reprodutível. O restante, a meu ver, é perda de tempo”, concluiu.
Para [o acadêmico] Ésper Cavalheiro, assessor da Fapesp e coordenador do Plano Nacional de Pós-Graduação, o desenho dos programas no país transformou a defesa da tese ou a escrita da dissertação no objetivo final da pós-graduação, quando o objetivo deveria ser tornar o indivíduo um cientista. “A tese é uma consequência, é o instrumento para esse indivíduo se modificar”, ponderou.
“A maioria das políticas públicas no Brasil não está baseada na produção científica do país. Portanto, é como se tivéssemos mundos à parte. Dessa forma, o mais importante do programa foi recolocar o pós-graduando no centro da pós-graduação de novo”, acrescentou.
Cavalheiro acredita ser necessário trazer gente jovem para a pós-graduação para que o pensamento no país mude. “Ao centrar os resultados na produção de papers e no tempo [do curso], o pós-graduando se tornou uma mão de obra extra do orientador, um tarefeiro. Mas não era para ser assim. O pós-graduando é um indivíduo que tem o papel de ver o mundo de forma diferente daquela que o orientador vê, sem reproduzi-la. Triste o país que se repete de geração em geração.”
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Também participaram do seminário [o Acadêmico] Antonio Gomes, diretor de avaliação da Capes; Maria Arminda do Nascimento Arruda, vice-reitora da USP; Rodrigo Calado, pró-reitor de Pós-Graduação da USP, [que foi membro afiliado da ABC 2013-2017]; Paulo Henrique Rodrigues Pereira, secretário-executivo do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (CDESS), órgão de assessoramento direto ao Presidente da República; Luiz Roberto Liza Curi, titular da Cátedra Paschoal Senise de Pós-Graduação (USP), que organizou o seminário.
A matéria na íntegra pode ser lida no site da Agência Fapesp