Pesquisadores brasileiros têm se engajado ativamente no movimento de acesso aberto (“Open Access“), mas será que isso está realmente ampliando o alcance global de suas publicações?

Segundo um artigo recente publicado nos Anais da Academia Brasileira de Ciências (AABC), o cenário é complexo e desafiador. A pesquisa revela que, embora autores brasileiros publiquem mais artigos em acesso aberto do que seus colegas globais, especialmente em periódicos do Sul Global, isso não necessariamente se traduz em maior impacto ou mais citações.

O estudo, liderado pelos pesquisadores Connie McManus (UnB, titular ABC), Claudia Figueiredo (UFRJ, ex-afiliada ABC 2015-2019), Brenno da Silveira Neto (UnB, ex-afiliado ABC 2014-2018) e Abilio Baeta Neves (UFRGS e PUC-RS, colaborador ABC), realizou uma análise abrangente dos artigos científicos publicados pelos 267.823 doutores formados no Brasil no período de 2005 a 2021, em todas as áreas do conhecimento. A pesquisa se debruçou sobre as bases de dados da Web of Science e Scopus entre os anos de 2013 e 2022. O foco foi mapear a visibilidade internacional das publicações, avaliando a acessibilidade dos periódicos e utilizando indicadores-chave de qualidade científica para comparar tendências globais. Como parâmetro de qualidade foram utilizados a porcentagem de documentos citados, o fator de impacto do periódico (JIF) e o Category Normalised Citation Index (CNCI) de cada artigo. O JIF mede a média de citações recebidas por artigos em um jornal específico em um ano, enquanto o CNCI ajusta as métricas de citação pela área de pesquisa, comparando as citações de um artigo com a média de sua categoria.

Os resultados mostraram que, para autores brasileiros, a escolha pelo acesso aberto não melhorou significativamente o número de citações (%DocCited, ver figura abaixo) ou o impacto de suas pesquisas. Enquanto o acesso aberto se correlaciona com a qualidade para autores globais, no caso brasileiro, não houve impacto significativo. Um ponto importante abordado no estudo é a influência positivas das colaborações internacionais, especialmente com a indústria, no impacto dos artigos. Isso destaca a importância de fortalecer as redes de colaboração e buscar parcerias que transcendam fronteiras nacionais.

Além disso, a escolha de publicar em revistas do Norte Global está intimamente ligada à área de estudos. Temáticas de interesse nacional ou do Sul Global, em algumas ocasiões, podem ganhar mais destaque se divulgadas em periódicos do Sul, variando bastante conforme a área de pesquisa. Esta é uma reflexão importante sobre como a escolha do periódico deve considerar a relevância e o público-alvo do estudo.

Importante ponderar que periódicos de grande impacto, como Nature e Science, adotam políticas de acesso aberto obrigatórias, o que implica em taxas elevadas de publicação. Enquanto revistas predatórias ou de baixa qualidade podem cobrar cerca de mil dólares por publicação em acesso aberto, periódicos com rigorosa política editorial como Nature e Science cobram em torno de 5 a 10 mil dólares. Essa realidade apresenta um desafio significativo para pesquisadores de países com recursos limitados, como o Brasil. É crucial, portanto, que os investimentos para publicações em acesso aberto sejam direcionados de maneira estratégica, e não dispersos em publicações de pouca visibilidade.

A pesquisa conclui que a atual política de acesso aberto não tem alcançado o objetivo de melhorar o impacto da ciência brasileira. Isso sinaliza a necessidade de reavaliar as estratégias de publicação e políticas públicas científicas no Brasil, considerando não apenas o acesso aberto, mas também a qualidade e a visibilidade global das pesquisas.

Este estudo é crucial para compreender a dinâmica do acesso aberto na ciência brasileira e seu papel na comunidade científica global. Ele destaca a necessidade de uma política de publicação mais robusta que equilibre acesso, qualidade e visibilidade internacional, garantindo que os investimentos em pesquisa retornem em termos de maior alcance e reconhecimento global.

Figura 3 do artigo. Autores brasileiros publicam mais em acesso aberto, sobretudo em journals do Sul Global. a-b) Publicações de acesso aberto e fechado no Norte e Sul Global por autores brasileiros (a) ou internacionais (b). c-d) Porcentagem de periódicos de acesso aberto onde publicam autores brasileiros (c) ou mundiais (d) no Sul ou Norte Global. e-f) Média do Fator de Impacto de Periódicos (JIF) de artigos de acesso aberto ou fechado publicados por autores brasileiros (e) ou mundiais (f) em periódicos do Norte e do Sul Global (a linha pontilhada representa o que se espera de um JIF adequado). g-h) Porcentagem de documentos citados (%DocCited) publicados por autores brasileiros (g) ou mundiais (h) em periódicos abertos ou fechados do Norte e Sul Global. i-j) Média do Category Normalised Citation Index (CNCI) de artigos de acesso aberto ou fechado publicados por autores brasileiros (i) ou mundiais (j) em periódicos do Norte e Sul Global (a linha pontilhada representa o que se espera de um CNCI adequado)