Leia artigo exclusivo do Acadêmico Paulo Artaxo para a ABC, diretamente de Dubai:

Começou ontem a COP 28 em Dubai. Já no primeiro dia foi aprovado a criação do fundo voluntário de perdas e danos, com cerca de US$ 100 bilhões por ano, para ajudar os países pobres a se adaptarem ao novo clima e compensá-los pelos danos climáticos. É uma discussão que já tem 25 anos. Mas a emergência climática mostra que as necessidades são de no mínimo US$ 500 bilhões de dólares por ano para estas tarefas.  E tem dois aspectos importantes:

  1. Os países ricos vão começar a depositar recursos neste fundo de perdas e danos, com dinheiro público, dos impostos de cada cidadão. E as companhias de petróleo, que lucraram trilhões de dólares somente nesta década? Quem fica com os lucros são as companhias de petróleo e carvão e quem paga o prejuízo são os cidadãos? E este fundo é totalmente voluntário, não vinculante.
  2. Corre pelos corredores da COP 28 que isso foi mais uma manobra dos países produtores de petróleo. Eles vão fazer todo o possível para que o documento final da COP28 não mencione explicitamente o fim dos combustíveis fósseis. O Secretário Geral da ONU, Antônio Guterres, foi forte em seu discurso, explicitando que o mundo tem que acabar rapidamente com o uso de combustíveis fósseis.

O Brasil está tendo uma forte participação na COP 28, com três diferentes palcos. Além do presidente Lula, estão em Dubai sete ministros – Fernando Haddad (Economia), Marina Silva (Meio ambiente e Mudanças do Clima), Nísia Trindade (Saúde), Luciana Alves (Ciência, Tecnologia e Inovação), Carlos Fávaro (Agricultura), Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário) e Alexandre Silveira (Minas e Energia) -, além de Aloizio Mercadante e André Correa do Lago, entre outros. A delegação brasileira conta com 2.400 participantes, a maior entre todos os países.

Haddad e Mercadante lançaram hoje um plano de transformação ecológica, com uma proposta de globalização sustentável e inclusiva. Eles apontam para o sistema financeiro nacional apoiando a transição energética e a sustentabilidade. Haddad e Marina lançaram o plano Florestas Tropicais para Sempre. A proposta é criar um instrumento financeiro para compensar quem preserva florestas em todo o mundo, criando condições para que países desenvolvidos possam auxiliar os países a protegerem suas florestas tropicais.

O Pavilhão do Brasil na COP 28 está sediando uma série de painéis que terão a participação de representantes do Governo Federal e da sociedade civil em debates sobre diversos temas ligados ao clima e à energia renovável. Foram definidos dez eixos temáticos: Adaptação e Perdas e Danos; Financiamento Climático e Mercado de Carbono; Florestas e Bioeconomia; Governança Climática Compartilhada: Entes e Poderes; Indústria e Gestão de Resíduos; Justiça Climática, Juventudes, Igualdade de Gênero e Racismo Ambiental; Oceanos, Gestão Costeira e Recursos Hídricos; Povos Indígenas, Povos e Comunidades Tradicionais; Segurança Alimentar e Agricultura de Baixa Emissão de Carbono; e Transição Energética e Transportes.

Nem tudo são flores, claro. Vimos também o convite para que o Brasil integre a OPEP+ (Organização dos Países Exportadores de Petróleo). O Ministro de Minas e Energia, na contramão de uma economia moderna e baseada nos enormes recursos naturais renováveis do Brasil (geração de energia eólica e solar), imediatamente apoiou o convite para integrar a OPEP+. Ele também apoia abertamente a exploração de petróleo na Foz do Amazonas.  Na verdade, a COP 28 teria que trazer o compromisso de acabar com a era do petróleo e iniciar a era da energia sustentável, pois a janela de abertura para novos poços de petróleo já passou há décadas. O Ministério de Minas e Energia e a Petrobras estão alinhados com o passado e o atraso energético.

Tudo isso somente nos primeiros dois dias de COP. Teremos duas semanas com fortes emoções sobre o futuro de nosso planeta. A sociedade não pode desistir de lutar por um futuro climático sustentável.

COP 28 acontece entre 30 de novembro e 12 de dezembro em Dubai, Emirados Árabes Unidos (EAU)

Paulo Artaxo é climatologista e membro titular da Academia Brasileira de Ciências. É professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas. É membro do Comite Orientador do Fundo Amazônia, do Fundo Nacional de Meio Ambiente e do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia. Está presente em Dubai para a COP 28.

 


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