May-Britt Moser

No último dia 16, a Academia Brasileira de Ciências (ABC), em parceria com a Rede InterAmericana de Academias de Ciências (Ianas) e a Fundação Nobel, realizou o Diálogo Prêmio Nobel América Latina e Caribe. O evento reuniu cinco laureados com a maior premiação da ciência internacional para debater a carreira com jovens estudantes da região.

A sessão 1 contou com a presença da neurocientista May-Britt Moser, vencedora do Nobel de Medicina em 2014 por sua descoberta de células que atuam na localização espacial perto do hipocampo. Esse “GPS do cérebro” respondeu a uma pergunta que intrigava cientistas e filósofos há séculos – como nosso sistema nervoso mapeia o espaço e nos conduz nesse complexo sistema?

Nascida em uma pequena cidade do chamado “cinturão bíblico” da Noruega, May-Britt cresceu entre uma população muito religiosa e tradicionalmente conservadora. Ela reconhece a influência que o ambiente tem na formação de cada um e, até por isso, acredita na importância da diversidade na ciência. Acredita também que alguns valores são universais para bons pesquisadores, destacando dois deles: a curiosidade e a honestidade intelectual.

Curiosidade como motor da ciência

Para a cientista, essa é uma carreira que requer prazer na descoberta e no compartilhamento. “Entender algo que eu não entendia antes é a coisa que me faz mais feliz na ciência. A segunda coisa é dividir esse conhecimento com colegas e ouvir suas reflexões”, contou.⁰

Mas satisfazer a própria curiosidade não é suficiente. Parte integral do trabalho é difundir e aplicar seus resultados para benefício da sociedade. Para Moser, existem diversas formas de se impactar o coletivo – desde a divulgação científica até a orientação de políticas públicas. Para isso, é preciso entender as prioridades de cada grupo. “Os cientistas precisam entender porque aquele dado é relevante para aquelas pessoas. É preciso deixar a arrogância de lado e convidar o público para uma construção de conhecimento de mão-dupla”.

Os participantes da Sessão 1

Perguntas fundamentais e a importância do “não sei”

May-Britt relembrou uma palestra que fez para crianças em uma escola. Em determinado momento, uma menina levantou o braço e perguntou como era que todas aquelas células do sistema nervoso que ela havia apresentado se expressavam na nossa consciência. A curiosidade daquela garotinha levou a uma indagação que muitos neurocientistas experientes se fazem todos os dias.

“Essa é a pergunta central de toda a neurologia. Entendemos o funcionamento do sistema, quem se comunica com quem, mas sabemos muito pouco sobre o fundamental: como tudo isso gera essa experiência que estamos vivendo. Uma criança chegou a essa mesma indagação e tive que ser sincera – não sei”, relatou Moser.

Para aquela garotinha, a resposta de May-Britt Moser pode ter sido decepcionante. Entretanto, reconhecer os limites do seu conhecimento é crucial na carreira científica.

Honestidade intelectual e valorização do conhecimento

Para a pesquisadora, um dos maiores desafios é ter uma visão crítica e distanciada o bastante sobre o próprio trabalho. Resistir ao anseio de extrapolar suas conclusões pode ser difícil, mas é imprescindível para fazer ciência de qualidade. “Devemos contar a história reconhecendo os limites de nossos resultados, tendo em mente que o desconhecido é o que mantém a ciência excitante”.

Isso não diminui o valor do trabalho feito. Pelo contrário, credencia e valoriza o método científico como forma de obter as respostas mais racionais e com mais aplicação para o bem-estar coletivo. Sobretudo nos contextos de América Latina e Caribe, esse reconhecimento da capacidade da ciência de melhorar a vida das pessoas é de suma importância para que a região supere o subdesenvolvimento.

“É difícil convencer as pessoas de que recursos escassos precisam ir para a ciência básica. Porém, o potencial que a mesma tem de gerar soluções inovadoras e impensáveis é tremendo. Fazer compreender isso é o grande desafio de vocês”, disse, se referindo aos jovens cientistas presentes.

Assista à Sessão completa no YouTube.