Dentro do Simpósio e Diplomação dos Novos Membros Afiliados da Regional Norte 2017-2021, realizado no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em 31 de agosto, as arboviroses emergentes no Brasil foram o tema da Sessão Especial.
Desde 2014, a ciência brasileira vem enfrentando um novo desafio causado por vírus. O chikungunya, transmitido pelo mosquito aedes aegypti – mesmo transmissor da dengue, – o zika, e um recente surto de febre amarela alarmaram setores de saúde pública e pesquisa biológica no pais.
O virologista e diretor do Instituto Evandro Chagas (IEC), Acadêmico Pedro Fernando da Costa Vasconcelos, explica que o começo do estudo da variedade de vírus no Brasil se deu com uma parceria do IEC com a Fundação Rockefeller. No pais, a região Norte é a área de maior presença de arbovírus o que se deve, em parte, à grande biodiversidade amazônica.
Vasconcelos apresentou um pouco do trabalho que o IEC tem feito na pesquisa de vírus presentes no Brasil. As pesquisadoras da instituição Jannifer Oliveira Chiang, Lívia Carício Martins, Raimunda do Socorro Azevedo e o pesquisador da Fiocruz-AM, Sérgio Luiz Bessa Luz, destacaram os quatro vírus que têm causado maior impacto na população atualmente: chikungunya, febre amarela, zika e dengue.
O pesquisador conta que na década de 80 explodiu no Brasil o vírus oropouche. Com quatro tipos genéticos, sendo o 1 o mais conhecido, todos ocorrem no país, com grande incidência em áreas próximas à Amazônia. Além dele, há ainda o vírus mayaro, espalhado desde a Argentina até a América Central, com diversos surtos notificados. As sequelas físicas causadas por ele se estendem de forma crônica, durando meses.
Em relação às viroses que causaram comoção coletiva nos últimos anos, Vasconcelos aponta a dengue como uma preocupação continuamente presente no país, desde 1986. “Esse é um vírus que causa grande impacto na saúde pública. Só o Brasil é responsável por 60% das notificações de casos nas Américas”. O pesquisador acredita que a tendência é apenas de crescimento no número de casos notificados e lembra que as ocorrências de mortes vem aumentando, passando de 1,5 milhão.
Sérgio Luz, da Fiocruz, destacou que, em Manaus, a instituição usou o próprio mosquito transmissor – o aedes aegypti – para espalhar o larvicida pelos focos. “Nós colocamos a substância em locais de água parada, as chamadas ‘estações de disseminação’, e quando o mosquito pousa para colocar os ovos, entra em contato com o larvicida, levando-o consigo para outros focos de água. A técnica deu certo e já ampliamos nossa atuação para outras cidades da Amazônia”, explicou. Sobre o chikungunya, transmitido pelo mesmo mosquito do dengue, apontou: “Por ser exótico nas Américas, sua consequência aqui foi explosiva. Ao contrário do dengue, apresentou mais complicações por causa de sua relação com a microcefalia em bebês infectados pela mãe durante a gestação.”
A pesquisadora Jannifer Chiang ressaltou que a primeira aparição registrada dele se deu em uma epidemia na Tanzânia. Embora o quadro clínico seja parecido com o do dengue, o vírus causa uma dor intensa nas articulações, que gerou seu nome: “No dialeto makonde, chikungunya significa aquele que se dobra, ou corpo inclinado”, explicou ela.
Pedro Vasconcelos destacou que a febre amarela foi a primeira doença importada para o novo mundo entre os arbovírus. “Epidemias periódicas cíclicas dela têm acontecido no Brasil, mas nada como neste ano”, alertou o virologista. Segundo a pesquisadora Lívia Vasconcelos, nos anos de 2014, 2015 e 2016, já existia a ocorrência de casos, de forma sazonal. “Não foi uma surpresa essa epidemia. Quem vinha estudando, sabia que o vírus estava se aproximando de áreas populosas”, observou.
O vírus zika foi encontrado pela primeira vez em Uganda. Da mesma família do dengue, tem diversos genótipos, mas, no Brasil, o tipo transmitido é o asiático. Em 2016, um estudo liderado por equipe do IEC apresentou a hipótese de que o vírus teria entrado no Brasil durante a Copa das Confederações, trazido pela equipe haitiana, no final de 2013. A teoria contrariou as crenças anteriores de que ele teria chegado ao país em 2014, quando surgiu o primeiro caso notificado. A incidência foi maior em Pernambuco e na Paraíba, onde se concentraram estudos da relação do vírus com a microcefalia.
“A epidemia estimulou muitos estudos, mas a pergunta que ficou foi o que existe por trás da microcefalia, quais outras consequências o vírus pode trazer com a passagem dos anos”, pontuou Vasconcelos. Sobre este aspecto, Socorro Azevedo destacou intensas mudanças no tecido celular, principalmente o nervoso, dos bebês nascidos com microcefalia e mortos poucas horas depois do nascimento.
Vasconcelos explicou ainda que, para que se produzam vacinas para as viroses, é extremamente necessário entender de que forma cada vírus age e o que pode causar. A pesquisadora Lívia Vasconcelos defendeu ainda o isolamento dos vírus em laboratório como a melhor forma de fazer o diagnóstico laboratorial.
“Acredito e sempre defendo que ter o vírus isolado é sempre a melhor opção, mesmo o método sendo considerado antigo e demorado. A ferramenta molecular é muito boa, mas apenas para encontrar o genoma do vírus e não ele como um todo”, apontou.