O candidato à Presidência da República pelo PSB, Eduardo Campos, prometeu atender a uma demanda antiga da comunidade científica e destinar 2% do PIB para ciência, tecnologia e inovação (CT&I), caso seja eleito. A declaração foi feita na sede da Academia Brasileira de Ciências (ABC), durante a apresentação de seu plano de governo para a área, na terça-feira, 5 de agosto.
No evento, Campos recebeu das mãos do presidente da ABC, Jacob Palis, o documento produzido pela Academia e subscrito pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e Conselho das Fundações de Amparo à Pesquisa (Confap), com orientações aos presidenciáveis na área de CT&I.
Jacob Palis, Eduardo Campos, Helena Nader e Marina Silva
“Educação, ciência, tecnologia e inovação têm que ser política de Estado, e não política de governo”, ressaltou o candidato, sobre o setor ter perdido muitos incentivos nos últimos anos. “Esse fato frustra o esforço de décadas para formar quadros novos, grupos de pesquisa, cooperação internacional. Um ano de governança que se perde é mais do que um ano, são décadas de esforço coletivo.”
Eduardo Campos foi ministro de Ciência e Tecnologia no governo de Luiz Inácio Lula da Silva de 2003 a 2006. Nesse período, foi responsável por iniciativas como a aprovação do programa de biossegurança (que possibilita o uso de células-tronco embrionárias para a pesquisa) e da Lei de Inovação Tecnológica. Ele comentou que, apesar de o percentual do PIB aplicado na área ter chegado a 1,2%, ainda não é o suficiente. Ele enfatizou que, em países avançados, esse total chega a 3%.
O candidato falou, ainda, sobre o contingenciamento de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT): “Temos o compromisso de tratar o FNDCT como ele deve ser tratado – uma política de Estado, e não com um olhar voltado apenas para o superávit do mês. Vamos nos esforçar para construir um sistema de financiamento”.
Campos também prometeu lutar contra a burocracia. “O Estado brasileiro precisa botar na cabeça que não é a sociedade que tem trabalhar para ele, é ele que tem que trabalhar para sociedade, facilitando a vida das pessoas que buscam dinheiro em vez de pedir 20 documentos que são dele mesmo”, brincou. Segundo o candidato, a burocracia é um empecilho especialmente para os pesquisadores que precisam importar insumos (veja mais sobre o assunto).
Sobre os marcos legais, Eduardo Campos apontou a necessidade de voltar ao debate sobre o código nacional de CT&I, cujo Projeto de Lei ainda aguarda votação na Câmara dos Deputados. Ele citou também a discussão sobre a Proposta de Emenda Constitucional 290/2013, que atualiza o tratamento das atividades de CT&I na Constituição, e defendeu a importância do regime de compras específicas para quem faz pesquisa em desenvolvimento, tecnologia e inovação.
Um diálogo mais eficaz com o Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT) também foi tema da apresentação de Campos na ABC. “O CCT precisa ser valorizado, provocar assuntos que pautam a academia brasileira.” A Acadêmica Helena Nader, presidente da SBPC, concordou: “O CCT existe na Constituição, mas está subutilizado”. Campos defendeu a criação de uma câmara técnica do Conselho que gere maior transparência dos recursos de ciência e tecnologia. “É fundamental termos capacidade de ver aonde estão indo os recursos de CT&I, que nem sempre acabam nessa área.”
O candidato afirmou que a prioridade de seu governo é a qualidade da educação básica. Segundo Campos, uma das metas do Plano Nacional de Educação (PNE) que serão antecipadas, caso seja eleito, é a de estabelecer o ensino integral no nível médio. Em relação a essa temática, ele comemorou os avanços obtidos na sua gestão como governador de Pernambuco, nos últimos sete anos: “Somos um Estado do Nordeste com mais alunos do ensino médio em tempo integral do que Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais juntos”. Ressaltou, ainda, que, nesse período, ampliou em 15 vezes o orçamento estadual de ciência e tecnologia.
Campos demonstrou alegria em participar do debate na ABC: “É importante termos cientistas de várias áreas do conhecimento contribuindo para sermos um país mais equilibrado, especialmente em uma casa quase centenária. A meu ver, esse debate foi negligenciado em 2010”, comentou o político. “Nosso país não tem vocação para ficar parado como está. O Brasil deve ser tão grande quanto o sonho do seu povo”, concluiu, prometendo que o país pode voltar a crescer em um curto espaço de tempo.
Debate com a comunidade científica
Após seu discurso, Eduardo Campos respondeu a algumas perguntas e comentários dos participantes. A Acadêmica Belita Koiller, diretora da Sociedade Brasileira de Física (SBF), citou um boato que tem corrido a comunidade sobre o Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que confere acesso imediato a publicações, poder ser interrompido. Sobre essa possibilidade, o candidato afirmou que não se justifica o fato de não haver recursos e, muito menos, falta de vontade política em manter um instrumento de popularização da ciência.
Auditório da ABC lotado de cientistas e jornalistas
Campos também concordou que os museus e centros de ciência são espaços de educação fundamentais, em resposta à pergunta do paleontólogo e Acadêmico Alexander Kellner sobre o papel destes ambientes. “Eles tornam a formação na escola pública muito mais integral do que a sala de aula e têm tudo a ver com o conceito de educação do nosso governo”, afirmou o candidato.
O professor do Instituto de Biofísica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Pedro Persechini questionou o fato de muitos doutores se formarem e acabarem desempregados, afirmando que a academia e a indústria ainda não sabem conversar. Eduardo Campos respondeu que, de fato, é preciso estimular o mercado a receber os pós-graduados: “Não podemos deixar de estimulá-los; simplesmente devolvê-los e impedi-los de serem empreendedores. Isso passa por um ciclo de desenvolvimento e expansão da economia e demanda políticas públicas de apoio a jovens pesquisadores”.
Silvia Donnini, do Instituto Abramundo, lamentou que a questão do currículo na educação básica tem se reduzido à mera alfabetização, de modo que não há ações contundentes para o ensino de ciências às crianças. Para Campos, é importante fazer uma pesquisa que
avalie o que os alunos querem estudar, em vez de impor o conteúdo. “Se perguntarmos, vamos descobrir que a juventude quer estudar ciências.”
avalie o que os alunos querem estudar, em vez de impor o conteúdo. “Se perguntarmos, vamos descobrir que a juventude quer estudar ciências.”
A candidata a vice-presidente pela chapa de Eduardo Campos, Marina Silva, também participou do evento e voltou a falar que a educação é a maior base de sustentação para o desenvolvimento, e que não se deve olhar apenas para os estudantes, mas também para os professores (veja mais na matéria sobre a participação de Marina Silva na 66ª Reunião Anual da SBPC). “Debates como esse podem nos ajudar a transformar as ideias junto a movimentos sociais e à academia brasileira”, reforçou.
Para Marina Silva, a sociedade brasileira está em um patamar em que deve decidir entre a opção – que, em sua visão, envolve apenas aquilo que já existe – e a escolha, que implica em criar novas opções. “Escolha é levar a eleição para o segundo turno”, enfatizou. Ela reforçou que a aliança feita com o candidato do PSB baseia-se em programa, e não em estratégia: “Eu não acrescento a ele [Eduardo Campos] um minuto de televisão, nem estrutura financeira, nem estrutura física”, disse, em tom de brincadeira. “Viemos nos encontrar com os cientistas porque precisamos do seu entusiasmo e militância para acender a cidadania brasileira”, concluiu Campos.
Confira parte da repercussão do debate com Eduardo Campos na mídia
Veja também a repercussão do debate no Twitter de Eduardo Campos