Os Acadêmicos Glaucius Oliva, Alvaro Prata e Wanderley de Souza
O financiamento de pesquisas científicas no Brasil foi tema recorrente durante a 68ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, realizado entre 3 e 9 de julho em Porto Seguro (BA). Em 2013, último ano em que foram divulgados dados oficiais de investimento em ciência e tecnologia no Brasil, o orçamento era de R$ 85 bilhões, 1,66% do Produto Interno Bruto do país. Dados promissores, pensando no exemplo de países como Estados Unidos e China onde o investimento é de 2% do PIB.
Porém, este cenário piorou desde então. Embora não se tenham valores oficiais, o recente fechamento de projetos de pesquisa, mostrado em matéria do G1, revela que os investimentos na área de pesquisa estão caindo e a recente fusão do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação com o das Comunicações não colabora para projetar um futuro mais otimista.
Falta de cultura científica
Secretário de inovação no novo Ministério e ex-secretário executivo de CT&I do governo Dilma Rousseff, Álvaro Prata afirma que, em alta e média tecnologia, o Brasil não é nem nunca foi competitivo. Isso pode ser exemplificado pela prática, há muito criticada no país, de se exportar matéria prima e importar produtos industrializados.
Para Prata, o país não tem a ciência reconhecida como um dos pilares para seu desenvolvimento, nem vê os investimentos a longo prazo como necessários para tirar o Brasil da crise econômica. “Se não investimos em ciência e tecnologia, não vemos nenhum prejuízo em uma ou duas semanas. Os prejuízos vêm em um, dois ou d anos.”
Este estigma da pesquisa científica no Brasil se deve, segundo o pesquisador, à falta de divulgação da ciência e ao empreendimento incipiente. “O brasileiro é muito empreendedor, mas não tecnologicamente”, afirma Prata. Outras razões são o fato de a maioria dos pesquisadores estarem nas universidade, dada a falta de investimento da indústria em pesquisa.
Do laboratório à indústria
Dados do IBGE e do Fundo Monetário Internacional mostram que apesar de estar hoje em nono lugar entre as principais economias do mundo, o Brasil ocupa a 70ª posição no quesito inovação.
Como o Acadêmico Edson Watanabe destacou em sua palestra sobre a formação de engenheiros no país, a inovação vai além de bons artigos e boas pesquisas, é a aplicação disso pensando na indústria.
O presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), Wanderley de Souza, destaca a responsabilidade da instituição de fazer a ponte entre os institutos de pesquisas e as empresas. Em ocasião anterior, Souza brincara dizendo “Finep é CNPJ, CNPq é CPF”, em referência aos investimentos de cada um dos órgãos. Enquanto o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) investe em projetos de pesquisa de proponentes, a Finep contribui com auxílio a instituições de pesquisa públicas e privadas, promovendo infraestrutura, instalação de equipamentos e contratação de pessoal especializado.
De 2002 a 2016, passando pela época de crescimento do investimento nacional em CT&I, a Finep investiu um total de 7,9 bilhões de reais em institutos de pesquisa no país, sendo que R$ 400 milhões foram investimentos considerados “não-reembolsáveis” a instituições no Nordeste do país. “Esse investimento reflete o fortalecimento da infraestrutura em todo o país”, afirma o pesquisador. Mas observa que esse cenário começou a mudar.
A Finep atualmente conta com um orçamento de pouco mais de R$ 1 bilhão, o que é suficiente para pagar as dívidas, mas não para embarcar em novos projetos.
Atualmente, a fundação trabalha em um modelo de avaliação com relatórios anuais de prestação de contas para ser enviado ao Tribunal de Contas da União. “Esse modelo poderá mostrar a produção dos Institutos de Ciência e Tecnologia, proteger a propriedade intelectual e justificar os investimentos”, afirma Wanderley de Souza.
Participação da indústria na pesquisa
O professor titular do Instituto de Física da Universidade de São Paulo em São Carlos e Acadêmico Glaucius Oliva, reforçou que, no Brasil, a importância da pesquisa científica para a economia não é difundida. “O problema da baixa inovação no Brasil não é só dos políticos, ou da universidade ou dos pesquisadores. É de todos nós e cabe a todos mudar isso.”
Oliva criticou a formação de profissionais no Brasil, afirmando que na universidade não se cria um ambiente que estimule a criatividade do estudante. “O grande problema da gestão é a falta de pessoal qualificado para o empreendedorismo. Nós precisamos de mais patentes saindo das empresas”, disse o Acadêmico.
Ampliar o conhecimento
Atual presidente do CNPq, Hernan Chaimovich afirmou, em sua palestra, que o país aprendeu a publicar, aumentando sensivelmente a quantidade de artigos científicos divulgados nas últimas décadas. Porém, isso não se refletiu no impacto social destas pesquisas. “Gastamos muito, mas não o suficiente para sermos competitivos”, disse Chaimovich. “É muito mais fácil contar paper do que ler projeto”, prosseguiu o pesquisador. “Ler exige avaliação crítica, subjetiva.”
“Ciência e tecnologia são a solução para sair de qualquer crise”, estabeleceu o pesquisador. “EUA e China aumentaram os investimentos em CT&I durante a crise e, quando a situação melhorou, inundaram o mercado com produtos novos”, disse Chaimovich, reforçando a importância do investimento social para favorecer a produção intelectual. “Não adianta só investir em ciência. Sem investimento na qualidade de vida, não vamos a lugar nenhum.”

“(Samil Chalupe para NABC)”