No dia 12 de fevereiro, os presidentes da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Jacob Palis, e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena Nader, divulgaram carta encaminhada ao governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (PMDB/RJ), e ao presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), Jorge Picciani (PMDB/RJ), em que sem manifestam contra o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 19/2016, que pede a redução em até 50% do orçamento da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj).
“É certo que a redução no orçamento da Faperj provocará consequências perniciosas ao sistema de ciência, tecnologia e inovação fluminense”, afirmam os presidentes na carta. “Desenvolvimento científico e tecnológico não ocorre de um dia para o outro. A exemplo do que ocorre com outras agências de fomento, muitos dos projetos financiados pela Faperj são de longa duração, o que prevê aporte de recursos durante alguns anos”, argumentam.
Confira a íntegra do texto abaixo:
Excelentíssimos Senhores
LUIZ FERNANDO PEZÃO, governador do Estado do Rio de Janeiro;
JORGE PICCIANI, presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro
Prezados Senhores,
Como cientistas brasileiros e presidentes da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e da Academia Brasileira de Ciências (ABC), vimos respeitosamente a Vossas Excelências manifestar nossa extrema preocupação com a possibilidade de a Faperj ter seu orçamento cortado em 50%, conforme prevê a Proposta de Emenda Constitucional 19/2016, enviada pelo Governo do Estado à Alerj no dia 02 do corrente mês.
Na condição de entidades representativas da ciência brasileira, e imbuídas do maior senso de colaboração, gostaríamos de apresentar a Vossas Excelências as razões de nossa preocupação.
É certo que a redução no orçamento da Faperj, proposta na PEC 19/2016, provocará consequências perniciosas ao sistema de ciência, tecnologia e inovação fluminense.
Desenvolvimento científico e tecnológico não ocorre de um dia para o outro. A exemplo do que ocorre com outras agências de fomento, muitos dos projetos financiados pela Faperj são de longa duração, o que prevê aporte de recursos durante alguns anos.
O corte à metade no orçamento da Fundação determinará a paralisação de muitos desses projetos, ou seja, não poderão ser concluídos – portanto, não produzirão resultados -, o que implicará no desperdício de todos os recursos neles investidos e todo o trabalho já realizado. Em suma, recursos valiosos e tempo de trabalho qualificado terão sido gastos em vão.
As consequências para o futuro do Estado do Rio de Janeiro serão igualmente desalentadoras. A depender da Faperj, a ciência, a tecnologia e a inovação do Estado do Rio de Janeiro estarão praticamente paralisadas durante pelo menos quatro anos: os três anos previstos na PEC 19/2016, mais um ano (2019) para que então novos projetos possam ser aprovados.
A situação dos investimentos em bolsas de estudo será a mesma. Um determinado número de alunos de mestrado e de doutorado fatalmente terá de suspender seus estudos, o que também acarretará prejuízos para as linhas de pesquisa atreladas aos cursos de pós-graduação das universidades e institutos de pesquisa sediados no Rio de Janeiro – além de provocar frustrações, se não revezes, na carreira profissional desses jovens que perderão suas bolsas.
O drástico corte no orçamento da Faperj proposto pela PEC 19/2016 não implica, porém, prejuízos somente à vida fluminense. As instituições de ensino superior e pesquisa do Rio de Janeiro são hoje responsáveis por 20% da pesquisa científica e tecnológica nacional e abrigam 22% dos cursos de pós-graduação com notas 6 e 7, máximas conferidas pela Capes-MEC.
Esses números indicam que o inevitável declínio que ocorrerá no sistema de C,T&I do Rio de Janeiro provocará abalos também no sistema de C,T&I do Brasil.
Assim, se a redução à metade do orçamento da Faperj se confirmar, o Rio de Janeiro estará desempenhando um papel histórico oposto ao que o Brasil conhece. Afinal, se o Rio foi o Estado que sempre puxou o Brasil para a modernidade, que sempre foi a ponta de lança da contemporaneidade da vida nacional, ele estaria agora trilhando o caminho da estagnação, se não do retrocesso.
Senhor governador e senhores deputados, obviamente temos ciência das dificuldades do atual momento de crise econômica que afeta todo o País. Contudo, se há uma certeza no mundo atual é a de que o melhor caminho para o desenvolvimento sustentável em termos econômicos, sociais e ambientais passa necessariamente pelo investimento ininterrupto e crescente em ciência, tecnologia e inovação. A Faperj tem um papel de protagonista na construção desse desenvolvimento – para o Estado do Rio de Janeiro e para o Brasil.
Temos na Petrobras um exemplo do quanto os investimentos em pesquisa e desenvolvimento proporcionam de benefícios para as economias estaduais e nacional. Sabidamente a Petrobras passa por um momento difícil, contudo seu patrimônio científico e tecnológico, edificado em grande medida com o trabalho das instituições de C&T do Rio de Janeiro, continua inabalável e afiançador da capacidade da empresa em gerar inovações e manter uma operação técnica eficaz.
Há que se registrar, também, que a política de ciência, tecnologia e inovação praticada pelo Rio de Janeiro nos últimos anos levou o Estado a uma posição de destaque no cenário nacional, especialmente com a atração de centros internacionais de P&D. É inegável que Cisco, Intel e Microsoft, dentre outras empresas, escolheram o Rio de Janeiro porque o Estado oferece infraestrutura de P&D (laboratorial e de recursos humanos) compatível com os anseios de empresas globais. A existência da Faperj está no epicentro dessa infraestrutura.
Mais um aspecto que não podemos deixar de observar é a recentíssima definição de um novo marco legal de C,T&I para o País. Depois de um intenso trabalho de entidades de de todo o País, do Congresso Nacional e dos ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), da Educação (MEC) e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), o Brasil conta desde o dia 11 de janeiro com a Lei 13.243/16, que estabelece um ambiente legal sem precedentes para o estímulo às atividades de C,T&I no Brasil. Essa era uma expectativa antiga e ansiosamente aguardada tanto pelas universidades e institutos de pesquisa como pelas empresas inovadoras. Ou seja, no momento em que o Brasil dá um passo gigantesco à frente para colocar C,T&I como protagonista do desenvolvimento nacional, a PEC 19/2016, se aprovada, certamente colocará o Rio de Janeiro em posição de simples figurante nesse cenário.
Assim sendo, a SBPC e a ABC vêm exortar Vossas Excelências, governantes do Rio de Janeiro, a manter o orçamento da Faperj no patamar atual e, portanto, não darem curso à aprovação da PEC 19/2016. Reafirmamos, essa emenda constitucional resultará em prejuízos incal
culáveis tanto para o Rio de Janeiro como para o País.
Agradecemos a atenção de Vossas Excelências e mantemos nossa disposição para o diálogo em torno da PEC 19/2016, bem como de qualquer outro assunto relacionado ao papel da ciência do Estado do Rio de Janeiro na vida do nosso País.
Atenciosamente,
Presidente da SBPC Presidente da ABC