claudio.jpg Claudio Landim é matemático e membro da Academia Brasileira de Ciências. É diretor-adjunto do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa) e Coordenador da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP).

Caetano, meu sobrinho, completará 53 anos em 2070. Que mundo será o dele? Colegas da área de informática afirmam que o homem terá inventado um computador mais inteligente que os próprios humanos. Este, por sua vez, poderá conceber outro ainda mais inteligente e assim por diante.

David Hilbert, um famoso matemático alemão do início do século 20, disse que se acordasse de um sono de 1000 anos perguntaria, antes de qualquer outra coisa, se a hipótese de Riemann havia sido resolvida. Até hoje, não foi.

Provavelmente, será possível substituir órgãos envelhecidos por novos, produzidos a partir de uma única célula, trocar um fígado ou pulmão por outro, estendendo a esperança de vida a limites nunca imaginados. Passear por reservas de animais extintos, engendrados a partir do DNA conservado em laboratórios.

Nesse estado de coisas, como se organizarão as relações de poder? A democracia será ainda uma forma plausível e desejável de governo? Quais serão os princípios éticos que guiarão as condutas humanas? Certos mitos e crenças atuais terão desaparecido? Terão sido substituídos por outros?

Haverá colônias em Marte, expedições a planetas habitáveis, vida comprovada em outros sistemas solares? Uma teoria única para explicar o universo do infinitamente pequeno ao infinitamente grande? A matéria escura, responsável por 80% da massa do universo, terá sido finalmente observada?

Este futuro está sendo imaginado, concebido e criado hoje pelos cientistas.

Há quatro anos, com a medalha Fields conferida ao pesquisador Artur Ávila, do IMPA, o Brasil descobriu que se produz ciência de altíssimo nível no país. Não surpreende, aliás, que um prêmio internacional de primeira importância tenha sido concedido a um matemático, área na qual bastam lápis, papel e uma boa biblioteca virtual para a produção científica. Como competir com nações que investem muito mais em ciência em áreas onde avanços requerem experimentos, reagentes, aparelhos, cobaias ou expedições de campo?

Por outro lado, impera no Brasil o achismo. Diariamente, publicam-se comentários sobre todos os tipos de assuntos, sem um único dado corroborando as considerações. Opina-se sem pudor e com autoridade de bispo sobre qualquer tema. Em contraste, matemáticos e cientistas têm comportamento diametralmente oposto. Pecam pelo excesso de recato, são mudos em sete línguas e só dialogam com seus pares.

De fato, com a crise política, jurídica e ética que o país atravessa, nada mais natural do que se voltar a atividades intelectuais. Pode haver prazer comparável a se abstrair do mundo e tentar provar que todo número par maior ou igual a 4 pode ser escrito como a soma de dois primos?

Esta coluna tem um compromisso. Dar a palavra aos especialistas para que comuniquem ao grande público o interesse e a importância de suas pesquisas. Ela publicará artigos de divulgação científica escritos por pesquisadores atuando no Brasil, resenhas sobre os progressos recentes da ciência exatas e humanas, seus desafios e problemas; análises das principais contribuições brasileiras e seus impactos no desenvolvimento tecnológico e cultural; artigos sobre políticas públicas que poderiam estimular o progresso da ciência no Brasil.

A coluna não poderia começar de melhor forma. Publica-se semana que vem um artigo do presidente da Academia Brasileira de Ciências, Luiz Davidovich, e outro do presidente da Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência, Ildeu de Castro Moreira, ambos professores do Instituto de Física da UFRJ. Continuará nas semanas seguintes publicando artigos às terças e quintas, e um quebra-cabeça de matemática às segundas.