A sessão do evento “Aperfeiçoando a gestão de recursos hídricos em um mundo em transformação: Academias de Ciências trabalhando juntas para ampliar o acesso à água e ao saneamento” foi coordenada pelo biólogo Marcos Gomes Nogueira, doutor em Engenharia Hidráulica e Sanitária e também em Ciências Ambientais, professor da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) que se especializou em gerenciamento e qualidade das águas no Comitê Internacional de Ambientes Lacustres (ILEC, na sigla em inglês), no Japão.

Fernando Urquidi-Barrau, Nisreen Al-Hmoud e Marcos Gomes Nogueira

A natureza não reconhece fronteiras políticas
A primeira palestrante da sessão foi a professora Nisreen Al-Hmoud, doutora em microbiologia pela Universidade de Abertay, em Dundee, na Escócia. Ela é membro da Sociedade Científica Real da Jordânia (RSS, na sigla em inglês), onde atua como chefe da Divisão de Laboratórios; é docente de Microbiologia Médica da Universidade da Jordânia e chefe do Departamento de Gerenciamento Ambiental da Universidade de Tecnologia Princesa Sumaya (PSUT, na sigla em inglês).

A expositora enfatizou a importância de se promover lógicas de cooperação num ambiente tão complexo. As águas transfronteiriças da parte oeste da Jordânia formam a maior fonte de recursos hídricos para muitos países da região, assim como suprem 50% da necessidade de água da própria Jordânia. “O ambiente não reconhece fronteiras políticas. As soluções sustentáveis devem levar isso em conta”, destacou Nisreen. Ela observou ainda que a cooperação no campo da água pode dar bons retornos para todos os países envolvidos, principalmente se for acompanhada do estabelecimento de mercados comuns. “A existência de interesses comuns entre as nações contribui para evitar conflitos, o que direciona a capacidade desses países para a expansão dos esforços de desenvolvimento sustentável, incluindo mais países e mais povos”. Ela acredita que a cooperação regional é fundamental para garantir a segurança hídrica na região, e que essa cooperação é possível.
Pouca atenção aos aquíferos transfronteiriços no direito internacional

Barrau destacou que três bacias compõem 85% da rede hidrográfica da Bolívia – Orinoco, Amazonas e Rio de la Plata. Observou que das trinta bacias transfronteiriças da América do Sul, apenas seis tem tratados assinados. “Os aquíferos transfronteiriços são temas de muita complexidade: ainda existe pouca atenção sobre o tema no direito internacional e o desafio é grande, dada a interdependência das ações dos países envolvidos.”
Ele deu como exemplo a bacia do lago Titicaca, distribuída entre a Bolívia e o Peru. Esses países exercem um gerenciamento conjunto exclusivo e indivisível sobre suas águas de modo geral, envolvendo toda a bacia hidrográfica. Para tanto, assinaram um tratado para a criação de uma Autoridade Autônoma Binacional do Lago Titicaca (ALT), submetida à legislação pública internacional. “Foram criadas duas unidades operacionais nacionais para promover e conduzir programas e projetos, assim como para gerenciar o manejo, controle e proteção do sistema hídrico”, explicou o cientista.
Para Barrau, a crise da água é uma crise de governança. “As instituições não dão conta de superar abordagens conflitantes com relação ao uso e alocação da água de um sistema aquífero ou de uma bacia, tanto em nível nacional quanto transfronteiriço”, alertou o palestrante.
O debate que se seguiu à apresentação mostrou a importância de se buscar formas cooperativas na governança de bacias transfronteiriças. Embora haja poucos exemplos de conflitos importantes em torno da água, os participantes destacaram que não se pode ignorar a pressão sobre os recursos hídricos e que as respostas tem que ser dadas tanto no plano tecnológico quanto no estímulo à cooperação entre os interessados. “A questão é essencialmente política e o maior desafio é a necessidade de se reforçar a solidariedade entre os atores envolvidos. Cabe à comunidade cientifica prover a sociedade e os tomadores de decisão de informação sem tomar partido, de forma que essa informação realmente venha a contribuir nas decisões”, concluiu o relator Pedro Jacobi.
