No dia 30 de outubro, no Centro Cultural da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre, a Academia Brasileira de Ciências promoveu um evento duplo: o Simpósio e Diplomação dos Membros Afiliados ABC Regional Sul 2024 e 2025. No ano anterior, os novos afiliados ficaram sem sua diplomação em função das enchentes no estado, que impediram a realização do encontro.
Assim, os dois grupos se reuniram este ano para apresentar seus trabalhos e receberem seus diplomas. Dos dez jovens cientistas de até 40 anos, eleitos pelos pares por suas pesquisas de excelência como membros afiliados à ABC por cinco anos, oito estavam presentes e apresentaram seus trabalhos: Ives Cavalcante Passos (Ciências da Saúde – 2025), Jade de Oliveira (Ciências Biológicas – 2025), Jonas Alex Morales Saute (Ciências da Saúde – 2025), José Reck Júnior (Ciências Biológicas – 2024), Luciana Tovo Rodrigues (Ciências da Saúde – 2024), Ulisses de Pádua Pereira (Ciências Agrárias – 2024) e Vanessa Galli (Ciências Agrárias – 2025). Os afiliados Rafael da Costa Nunes (Ciências Físicas – 2025) e Renata Rojas Guerra (Ciências Matemáticas, 2024 – 2028) não puderam comparecer.

Conheça as pesquisas e saiba mais sobre os dez pesquisadores de destaque nas matérias linkadas abaixo!
Ciência para o bem-estar de pacientes e cientistas
Farmacêutica e professora da UFPel, a afiliada Cristiane Luchese teve motivações familiares para escolher a carreira, e defende o equilíbrio entre o laboratório e a vida pessoal.
Explorando a riqueza da interdisciplinaridade
O psiquiatra Ives Cavalcante Passos atua no Hospital das Clínicas da UFRGS, onde busca integrar psiquiatria, inteligência artificial e neurociências para personalizar o tratamento de transtornos mentais.
Doenças metabólicas e o desenvolvimento de neuropatologias
Professora da UFRGS, a bioquímica Jade de Oliveira busca entender como obesidade e colesterol alto podem afetar o cérebro e contribuir para problemas como demência e depressão.
Estudando doenças neurogenéticas que afetam o sistema motor
O médico Jonas Saute coordena um grupo multidisciplinar de ciência translacional no HCPA-UFRGS, buscando os melhores marcadores clínicos ou bioquímicos para monitoramento das doenças e avaliação de novos tratamentos.
A ciência como estilo de vida
O veterinário José Reck Júnior, pesquisador do IPVDF, estuda os carrapatos e as doenças que eles causam. Ele defende que ser cientista é mais do que uma profissão, mas uma forma de ser.
A genética ao longo da vida
Professora da UFPel e nova afiliada da ABC, a bióloga Luciana Tovo Rodrigues estuda como fatores genéticos influenciam na saúde mental a partir das coortes de nascimento de Pelotas.
Buscando explicar o ainda inexplicável
O astrofísico Rafael da Costa Nunes trabalha com cosmologia física na UFRGS, onde estuda matéria escura, energia escura, buracos negros e outros fenômenos cósmicos que desafiam nossa compreensão atual do Universo.
A ciência que guia outras ciências
Professora da UFSM e nova afiliada ABC, Renata Rojas Guerra é apaixonada pela estatística e a capacidade da área de transitar entre as Ciências Exatas, Naturais e Sociais.
Médico e pesquisador, dos bichos
Professor da UEL e especialista em patógenos de peixes, o veterinário Ulisses de Pádua Pereira combina técnicas clássicas e modernas para produzir soluções para a piscicultura.
Contribuindo para uma agricultura mais produtiva e sustentável
Atuando em biotecnologia e genômica vegetal, a bióloga da UFPel Vanessa Galli busca desenvolver plantas mais resistentes a estresses e trabalha no desenvolvimento de produtos alternativos aos agroquímicos atuais.
Na mesa de abertura do evento estavam o vice-presidente da ABC para a Regional Sul, Ruben Oliven; a Acadêmica Marcia Barbosa, reitora da UFRGS; o diretor técnico-científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (Fapergs) e Acadêmico, Rafael Roesler; e a representante da Pró-reitoria de Pesquisa da UFRGS, Maria Luiza Saraiva Pereira.

Professor de Antropologia da UFRGS, Ruben Oliven, declarou que a ABC promove os simpósios de membros afiliados com muita alegria, pois a categoria foi criada em 2007 na perspectiva de renovar a Academia. Ele deu a palavra à reitora e Acadêmica Márcia Barbosa, que apontou que aquele era um dia de festa. “Para nós não só como universidade, mas como Academia, porque, quando trazemos novas pessoas — e pessoas novas também —, pensamos em fortalecer os caminhos do conhecimento brasileiro, e a partir dele, o conhecimento mundial”, comentou a reitora.
Ela destacou que o título deve significar também uma interação entre os membros afiliados. “São pessoas de áreas diferentes, mas, a partir desta conversa, podemos conseguir construir um caminho mais profundo da transdisciplinaridade, que é um elemento fundamental para evoluir a ciência. O Brasil tem um número ainda muito pequeno de cientistas, e essa cooperação é um instrumento que pode alavancar ainda mais a ciência brasileira”, ressaltou Márcia.
Ela saudou a iniciativa da Fapergs de lançar editais específicos que obrigavam as pessoas de diferentes instituições a trabalharem no coletivo, com empresas. “Forçar a gente a conversar é uma necessidade se queremos resolver essa questão tão fundamental, que é uma questão científica, mas ao mesmo tempo é uma questão de sobrevivência da humanidade — não do planeta. O planeta vai continuar existindo muito bem, obrigado — mas da gente como ser humano dentro do planeta, e principalmente num estado como o Rio Grande do Sul, que é um estado grande produtor e que precisa lidar e dar soluções para essa questão ambiental.”
A chefe de gabinete da UFRGS, Maria Luiza Saraiva Pereira, professora titular de genética molecular, reforçou que para quem tanto se dedica e trabalha na área acadêmica, “é realmente muito importante saber que temos pessoas que vão renovar a cara da nossa pesquisa, das nossas universidades e das nossas instituições científicas”.
Ela destacou que estava representando o Acadêmico Flávio Kapczinski, pró-reitor de Pesquisa da UFRGS, que não pôde comparecer na ocasião. “A Pró-Reitoria incentiva novas iniciativas, diferentes do que se espera dentro de uma caixinha de pesquisa científica tradicional. Porque precisamos de criatividade para inovar, além de visão de futuro, para saber onde devemos colocar os nossos esforços”, indicou.
O Acadêmico Rafael Roesler, representando a Fapergs, disse estar muito feliz por participar do evento, lembrando que integrou a primeira turma de membros afiliados da ABC, em 2007. “A nossa turma tinha o desafio de pensar o queseríamos, o que vamos fazer dentro da ABC. A Academia nos provocou a arejar e agitar as coisas — e acho que fizemos bastante. O peço que vocês, que estão entrando agora, façam isso também: provoquem a Academia, proponham discussões, tomem iniciativas.”
Roesler destacou que os afiliados formam um celeiro de futuros titulares. “Fui eleito titular em 2023. Isso tem acontecido com alguns ex-afiliados, após um período de amadurecimento.” Ele contou ter sido indicado por Jorge Guimarães, a quem chamou de “maior gestor científico da história do Brasil”, agradecendo por ter lhe aberto portas na gestão científica.
Falando pela Fapergs, abordou as emergências climáticas, tema central nos editais recentes. “Assim que houve a enchente, imediatamente nos mobilizamos para elaborar um edital de resposta. Conseguimos 30 milhões para projetos sobre resposta, prevenção, mitigação e mudanças climáticas.” Explicou que o grupo estudou experiências internacionais, como as respostas da National Science Foundation (NSF) ao Katrina e de agências japonesas e internacionais a desastres naturais. Mencionou ainda o novo edital CRIEC, voltado à criação de redes de pesquisa sob a governança de um centro de referência internacional, formando “um grande instituto virtual de pesquisa para que sejamos um modelo e uma vitrine”.
Palestras Magnas
Dois Acadêmicos proferiram as palestras magnas. O químico Aldo Zarbin falou sobre nanoarquiteturas para baterias transparentes, flexíveis e sustentáveis e o glaciologista Jefferson Cardia Simões abordou o registro das mudanças ambientais no gelo polar. As palestras serão reportadas na próxima semana.
Diplomação
Em seguida, os membros afiliados diplomados na ocasião foram saudados pela aAcadêmica Elisa Orth, afiliada eleita para o período 2021-2025. Ela é professora de Química na Universidade Federal do Paraná e atualmente secretária-geral da Sociedade Brasileira de Química (SBQ).
Elisa contou que sua diplomação foi online devido à pandemia. “Fui diplomada em casa, na frente da tela do computador, vestindo uma roupa de gala que ninguém percebeu, acompanhada do meu marido e do meu filho de apenas um ano, nascido na pandemia, em 15 de março de 2020”. Por conta deste contexto, declarou sua alegria em participar de uma diplomação presencial, pois não teve essa oportunidade. E sua emoção estava em sintonia com a dos diplomados 2024-2028, que não tiveram evento de diplomação devido à catástrofe das enchentes.

“Mesmo assim, minha diplomação online não foi menos importante. Ser membro afiliada da ABC é uma das coisas de que mais me orgulho no meu percurso. É aqui que se discute a melhor ciência. É aqui que se debate o futuro. É aqui que se pautam estratégias. Essa Academia recebeu Einstein, recebeu Enrico Fermi, além de tantos outros cientistas fantásticos. Temos a certeza de fazer parte de algo muito grandioso”, apontou Elisa. Ela ressaltou a postura forte de resistência em prol da ciência e da soberania nacional vista, ao longo dos anos, nas falas e nas posturas assumidas pelos presidentes da ABC e, mais recentemente, pela presidente Helena Nader, que lhes dá orgulho.
“Ser um membro afiliado da ABC é muito mais que um título: é uma responsabilidade, é representar, é ser atuante, engajado, é inspirar outras gerações, é fazer a diferença. Essa posição me trouxe muitas oportunidades – são eventos, comissões, posições de representação, entre tantos outros. Mas, principalmente, é ser um representante da ABC. Ser um membro afiliado é pertencer, é carregar a responsabilidade de fomentar uma ciência responsável, ética, sustentável, democrática e inclusiva. Não nos calemos, porque juntos somos mais fortes”, concluiu a pesquisadora.
Depois de “repassado o bastão” para os grupos que estão começando, as representantes destes fizeram seus agradecimentos e considerações. Em nome dos novos afiliados, fizeram os agradecimentos Luciana Tovo Rodrigues (2024) e Vanessa Galli (2025).

Em nome dos afiliados eleitos em 2024, Luciana Tovo Rodrigues declarou estarem ali celebrando a ciência brasileira, a dedicação de tantos pesquisadores e pesquisadoras e a esperança de uma ciência que represente e transforme o nosso país. “A ABC, criada há mais de 100 anos, tem importantes missões, que envolvem promover o avanço científico, fortalecer a educação e usar o conhecimento como um bem público em benefício da sociedade. Receber esse diploma hoje é mais do que uma conquista pessoal — é assumir um compromisso coletivo com a ciência, com a educação, com a sociedade e, principalmente, com o futuro do nosso país. Fazer parte dessa instituição é aceitar esse chamado para defender a ciência em tempos difíceis, para sustentar verdades em meio às incertezas e para transformar o conhecimento em desenvolvimento humano e social”, destacou a pesquisadora.
E isso só será possível, segundo Rodrigues, se desenvolverem uma ciência plural. “A ciência hoje é feita por muitas mãos, com diferentes histórias de vida, trajetórias e visões de mundo. É dessa diversidade que nascem as ideias mais criativas e as soluções mais inovadoras”, reforçou. Mas, ao mesmo tempo que se celebra a pluralidade, é impossível não reconhecer que ainda existem barreiras. “Como mulher cientista, sabemos que avançamos muito, mas ainda há desigualdades que limitam a plena participação de grupos historicamente excluídos”, apontou Luciana Rodrigues.
Ela ressaltou que mulheres continuam sub-representadas em cargos de liderança, recebem menos recursos e enfrentam interrupções na carreira por diversos motivos. Muitas acumulam jornadas múltiplas e enfrentam obstáculos invisíveis que tornam o caminho mais difícil. “Ainda assim, seguimos produzindo, inovando e transformando a ciência brasileira com competência, sensibilidade e coragem. Ser cientista mulher no Brasil, muitas vezes, é um ato de resistência, mas também é um ato de esperança”, afirmu.
Luciana reconheceu que a Academia tem reafirmado seu compromisso com a equidade de gênero e com a valorização da diversidade, “porque a ciência só é verdadeiramente plural quando reflete a sociedade que a produz. E promover equidade é isso: garantir que tanto meninas quanto jovens mulheres se vejam na ciência, que sintam que esse espaço também lhes pertence. Cabe a nós, como afiliados, transformar esse compromisso em ação — criar oportunidades, abrir caminhos e ser exemplo sempre que possível.”
Além disso, Luciana Rodrigues apontou que fazer ciência não é só descobrir, é também compartilhar. A divulgação científica é uma das missões mais importantes da Academia, porque uma sociedade bem-informada entende melhor seus desafios e reconhece a ciência como uma aliada. “Divulgar ciência é transformar rigor em linguagem acessível, é transformar dado em diálogo, é levar o conhecimento para fora das paredes da universidade. Quando fazemos isso, despertamos a curiosidade — aquela curiosidade nas novas gerações que faz uma menina ou um menino pensar que quer ser cientista. Vivemos tempos difíceis para o conhecimento. Vimos a ciência e a universidade sendo questionadas, às vezes desacreditadas, mas é justamente nesses momentos que precisamos ser mais firmes: comunicar, educar e dialogar. Formar jovens cientistas talvez seja o legado mais bonito que a gente possa deixar”, declarou a Acadêmica.
Por fim, lembrou que uma das missões da Academia vai além dos laboratórios e das publicações. Ela também tem o papel de assessorar o país e o Estado, oferecendo conhecimento sólido para políticas públicas em saúde, educação, meio ambiente, energia, inovação e inclusão social.
“Em nome dos afiliados de 2024, reafirmo o nosso compromisso: fazer ciência com ética, com responsabilidade, com propósito e com equidade. Que cada um de nós leve adiante essa certeza de que a ciência é uma das maiores expressões humanas. Muito obrigada pela oportunidade.”
Vanessa Galli falou em nome dos membros afiliados de 2025, corroborando a fala anterior. Ela fez um agradecimento em especial aos familiares e amigos, cujo apoio e incentivo tornaram e tornam possível cada passo da trajetória acadêmica de todos os diplomados. “Essa distinção simboliza o reconhecimento do nosso compromisso com a pesquisa científica e com a geração de conhecimento de impacto em nossas áreas de atuação, tanto em nível nacional quanto internacional”, ressaltou Galli.
Ela declarou que os membros do grupo pretendem atuar de forma participativa na missão da Academia, influenciando políticas científicas, incentivando colaborações e inspirando jovens talentos a seguirem o caminho da ciência. “Reconhecemos a necessidade de mostrar o que desenvolvemos e de ouvir a comunidade, de entender suas necessidades, para que possamos transformar a ciência em inovação e tecnologia que impactem de forma efetiva na vida das pessoas.”
Vanessa Galli também destacou a importância da representatividade das mulheres cientistas. “Ainda há um longo caminho a percorrer em busca da equidade, mas cada conquista representa um passo significativo na direção de uma ciência mais diversa, inclusiva e plural. Juntos, continuaremos a trabalhar com dedicação e entusiasmo pelo avanço da ciência e pelo desenvolvimento do nosso país. Expresso nossa profunda gratidão à Academia Brasileira de Ciências pela oportunidade e confiança”, encerrou a Acadêmica.