A ciência que guia outras ciências

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A estatística está na grade curricular da maior parte dos cursos científicos, sendo uma ferramenta fundamental nas Ciências Exatas, Naturais ou Sociais. Para Renata Rojas Guerra, professora da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), a interdisciplinaridade é um dos encantos da área que escolheu para se especializar. “Sempre que alguém me pede para explicar sobre o que fazemos, eu peço para a pessoa mencionar qualquer tema de seu interesse, e tento construir um exemplo com base nessa resposta”, conta.

Por exemplo, um dos seus projetos atuais envolve aplicar conceitos da probabilidade na análise de séries temporais de recursos hídricos, como o volume de água disponível num reservatório. Conseguir prever essa disponibilidade é fundamental para projetar a produção de energia por hidrelétricas, ou antever a necessidade de usar termoelétricas. Outro projeto, que olha para os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, acompanha a evolução de indicadores, por exemplo a proporção de crianças frequentando a escola, para ver como cada país está progredindo rumo às metas.

A interdisciplinaridade se manifestou desde cedo, Renata cresceu rodeada por livros em uma família que sempre prezou pela leitura. Adorava enciclopédias e passava horas imersa em livros e, na escola, tinha facilidade em quase todas as matérias, muitas vezes ajudando os colegas a aprenderem também. “Estudávamos em uma escola pública, e esses momentos de colaboração criaram laços de amizade que perduram até hoje”, conta.

Filha única, Renata teve na mãe o apoio fundamental para focar nos estudos. Maria Cristina precisou se desdobrar para manter a casa depois que o marido, André, faleceu precocemente. Felizmente, contavam com o suporte da família, de tios e avós que moravam perto, o que fez com que Renata crescesse muito próxima às primas, Ana Paula e Fernanda, que considera irmãs. “Ana Paula, cinco anos mais velha, fez curso técnico e faculdade, e foi quem despertou meu interesse pela universidade. Já Fernanda, seis anos mais nova, também precisou se mudar de Uruguaiana para Santa Maria, para a faculdade, e moramos juntas vários anos. Crescer com elas e contar com esse apoio foi fundamental para mim.”

Refletindo sua interdisciplinaridade, Renata escolheu a área da ciência que melhor transita entre as Exatas e Humanidades, cursando Ciências Econômicas na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Os anos de graduação foram bem aproveitados, participando de projetos, estágios, extensão, monitorias e empresa júnior. Essa diversidade de experiências foi fundamental e, ao participar da Escola de Séries Temporais e Econometria, teve a certeza de que gostaria de atuar nas áreas de probabilidade e estatística. “Para alinhar essa nova linha de pesquisa com a graduação quase concluída, optei por cursar disciplinas complementares no curso de Estatística”, lembra.

Nessa época, Renata conheceu o professor Fábio Bayer, que a orientaria no mestrado em Engenharia de Produção, também na UFSM. “O professor Fábio é um pesquisador de renome nacional e internacional e desempenha um papel fundamental na formação de novos profissionais. Com o tempo, fui compreendendo a importância de ter um mentor que não só orienta pesquisas, mas também investe na formação de seus alunos como cientistas. Ele cria um ambiente enriquecedor para a interação e a troca de ideias, ajudando a construir uma visão crítica essencial para o avanço científico.”

Renata obteve o título de mestre em 2015, mesmo ano em que decidiu por uma mudança radical na vida. Ela pediu licença não-remunerada no banco em que trabalhava e embarcou para Recife para cursar doutorado em Estatística na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). “Percebi que era hora de direcionar meus estudos para a Estatística, mas não haviam programas de pós-graduação em Estatística na região Sul. Foi na UFPE que solidifiquei as bases necessárias para atuar nas ciências matemáticas e desenvolvi minha paixão por pesquisa na área.”

O doutorado foi feito sob orientação do professor Gauss Cordeiro, outra grande fonte de inspiração científica. “Ele possui uma atuação excepcional na comunidade científica e contribuiu significativamente para o surgimento e a solidificação da área de Probabilidade e Estatística no Brasil. Ouvi-lo contar sobre a história da Estatística no país é sempre muito motivador. O Professor Gauss não é apenas um grande mentor, mas também uma pessoa extremamente gentil, preocupada com o bem-estar dos estudantes. Testemunhei diversas vezes como ele ajudava colegas, mesmo aqueles que não eram seus orientandos, a resolver problemas burocráticos na universidade e até a obter medicamentos na rede pública de saúde.”

Renata concluiu o doutorado em tempo recorde, apenas dois anos e dois meses, e em 2017 entrou como professora adjunta em sua alma mater, a UFSM. Ela ainda cursou dois pós-doutorados, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e na Universidade de Pavia, na Itália. “Tenho me esforçado ao máximo para fazer contribuições à ciência e, ao mesmo tempo, me envolver em projetos de iniciação científica e iniciativas que visam mostrar aos meus alunos e alunas que, mesmo que o trabalho de pesquisador não seja a sua opção de carreira, é importante ter essa vivência. A iniciação científica é essencial para desenvolver habilidades de pensamento independente e para entender melhor o papel da pesquisa em nossa formação como indivíduos e na sociedade”, afirma.

Agora na ABC, a nova Acadêmica quer promover a inclusão e a diversidade na matemática, campo onde a desigualdade de gênero ainda é grande. “É crucial que as meninas vejam mulheres pesquisadoras ocupando posições de destaque para se sentirem representadas e entenderem que têm um lugar na Matemática”, conclui.

(Marcos Torres para ABC | Foto: Estúdio Asaphoto)