No dia 7 de agosto, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) promoveu o lançamento de dois novos relatórios organizados por grupos de trabalho compostos por Acadêmicos e outros especialistas. Os trabalhos tratam da exploração de petróleo na margem equatorial brasileira e da contaminação humana e ambiental por microplásticos.
O relatório “Petróleo na Margem Equatorial Brasileira” foi organizado por um grupo de 12 especialistas, coordenados pelo vice-presidente da ABC, Jailson Bittencourt de Andrade. “Nós estamos mostrando o que pode acontecer numa eventual exploração”, frisou o Acadêmico. Na mesma linha, a presidente da ABC, Helena Bonciani Nader, reforçou a posição da Academia. “Estamos trazendo o olhar científico para que o governo e a sociedade tenham embasamento antes de tomar qualquer decisão”, salientou.
A margem equatorial brasileira, sobretudo na região da foz do Amazonas, possui uma plataforma continental extensa, podendo chegar a 250 quilômetros além da costa. Trata-se de um ambiente ecologicamente complexo, com vários ecossistemas coexistindo, e muito dinâmico, com fortes correntes marítimas, sobretudo a Corrente Norte do Brasil (CNB), que tem papel relevante no transporte de massa e calor para o hemisfério norte e que, a depender da profundidade, atua em direções distintas.
As correntes marítimas são o caminho pelo qual se espalharia um eventual vazamento de petróleo e, portanto, devem estar no centro das análises. “A modelagem computacional para simulação de impactos é extremamente relevante, deve ser feita de forma continuada e com base no que há de melhor em evidências científicas. Isso é importante porque existe uma oferta muito grande de serviços de monitoramento, mas nem todos estão pautados pelos melhores protocolos e práticas”, alertou Jailson Bittencourt.
Outra questão que precisa ser abordada se refere aos possíveis impactos que acidentes podem trazer para a biodiversidade e a economia dessas regiões. O relatório destaca principalmente os ecossistemas de manguezais e recifes.
Os manguezais se estendem por quase toda a costa brasileira e contêm uma biodiversidade rica e bastante diferente, dependendo da região. No caso da foz do Amazonas, os manguezais recebem um grande volume de água doce e sedimentos, sustentando um amplo sistema de recursos pesqueiros que são a base econômica de muitas comunidades costeiras. “São os berçários do ecossistema marinho”, resumiu Bittencourt.
Quanto aos recifes, esses ricos ecossistemas estão espalhados por toda a costa brasileira, inclusive em regiões onde há exploração petrolífera. Na região de desague do Amazonas, estes se concentram em áreas afastadas da costa e em águas profundas, o que os fez serem menos estudados do que os recifes de águas rasas e costeiras. Apenas recentemente os recifes amazônicos ganharam destaque na literatura científica e ainda há muito que precisamos entender sobre eles. Eventuais explorações precisarão levar em conta e mitigar possíveis danos a essas estruturas, que são bastante vulneráveis devido ao seu lento crescimento e baixa capacidade de recuperação natural.
Em suma, qualquer atividade de extração de petróleo atualmente deve vir acompanhada de muita ciência e monitoramento, e isso se torna ainda mais crucial numa região ambientalmente sensível como a margem equatorial brasileira. Planos de contingência e mitigação, capazes de dar respostas rápidas a acidentes, são indispensáveis, assim como é indispensável a criação de salvaguardas ambientais que busquem neutralizar as emissões associadas às novas fronteiras de exploração.
Entre outras medidas, a ABC propõe projetos de proteção e reflorestamento da floresta e dos manguezais amazônicos; aceleração da transição energética dos sistemas de transporte urbano; mais investimentos em tecnologias de captura e armazenamento de carbono e apoio direto às comunidades locais, tendo como norte a justiça climática, a geração sustentável de renda e a criação de resiliência socioambiental.
“A margem equatorial exige cautela e transparência, em caso de exploração. É preciso alinhamento com a agenda climática e organismos internacionais e, nesse ponto, a diplomacia é crucial. A ciência deve estar no centro do processo decisório”, finalizou o vice-presidente da ABC.