A Academia Brasileira de Ciências (ABC ) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) encaminharam à Casa Civil da Presidência da República uma carta conjunta, no dia 3 de julho, em reunião institucional com o Secretário Especial da Casa Civil, Bruno Moretti, demonstrando o compromisso das entidades científicas com a construção coletiva de soluções que fortaleçam o Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI).
A carta contém recomendações para o aprimoramento dos critérios de contrapartida junto às operações de crédito incentivado. A proposta visa uma alocação estratégica dos novos recursos de superávit do Fundo.
Esta iniciativa se deu no âmbito da aprovação do Projeto de Lei nº 847/2025, que amplia os recursos para as operações de crédito no âmbito do FNDCT.
A carta destaca princípios fundamentais para orientar a concessão de crédito, como a adoção de critérios públicos de risco tecnológico, a valorização de parcerias com pesquisadores e instituições científicas nacionais, a valorização e o estímulo ao desenvolvimento de conteúdo local, e o fomento à infraestrutura de pesquisa e inovação em todas as regiões do país. Também enfatiza a importância de implementar, no PLOA 2026, a divisão orçamentária de 60% para operações não reembolsáveis e 40% para reembolsáveis, conforme deliberação do Conselho Diretor do FNDCT e recomendação do TCU.
As duas maiores entidades representativas da comunidade científica brasileira aguardam agora o chamamento da Casa Civil para a consolidação, em diálogo com o governo e a sociedade, de um modelo de contrapartidas equilibrado e aderente aos interesses públicos, garantindo que os investimentos em CT&I impulsionem o desenvolvimento sustentável, a redução das desigualdades regionais e a soberania nacional.
Leia a carta na íntegra:
Excelentíssimo Senhor
Ministro RUI COSTA
Casa Civil da Presidência da República
Brasília, DF.
Senhor Ministro,
A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC), no exercício de seu papel histórico na defesa da ciência, tecnologia e inovação como pilares fundamentais do desenvolvimento nacional, apresentam à Casa Civil a presente Proposta para Revisão do Modelo de Contrapartidas em Operações Incentivadas do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).
Os recursos oriundos do FNDCT, conforme disposto no Projeto de Lei nº 847/2025, destinados a operações de crédito operadas pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), deverão observar os seguintes princípios e diretrizes:
I. A aplicação dos recursos será orientada por critérios públicos e normatizados de risco tecnológico, compreendido como a possibilidade de insucesso na obtenção dos resultados esperados em função de incertezas científicas ou tecnológicas no desenvolvimento de novos produtos, processos ou serviços.
II. Os projetos apoiados deverão apresentar avaliação explícita de risco tecnológico, com base em métricas reconhecidas como os níveis de maturidade tecnológica (Technology Readiness Levels – TRL), sendo a concessão de crédito proporcional ao nível de risco identificado.
III. A concessão de crédito às empresas deverá estar vinculada:
a) à participação técnico-científica de pesquisadores com titulação mínima de doutorado em áreas correlatas ao projeto e residentes em território nacional, com prioridade à contratação de doutores e pós-doutores, especialmente egressos do sistema nacional de pós-graduação;
b) ao estabelecimento de parcerias formais com Instituições Científicas, Tecnológicas e de Inovação (ICTs) sediadas no território nacional, devendo estas parcerias representar, no mínimo, 15% e, preferencialmente, até 20% do valor total contratado com recursos incentivados;
c) à modernização e ampliação da infraestrutura científica e tecnológica nacional, por meio de bolsas, laboratórios compartilhados, transferência de tecnologia ou acesso aberto a dados e resultados.
IV. As contrapartidas exigidas das empresas beneficiárias deverão ser calibradas conforme o grau de risco tecnológico do projeto, seu potencial de impacto socioeconômico e socioambiental, com exigências proporcionais e mecanismos de retorno variável nos casos de sucesso comercial, como royalties, reinvestimento em ciência básica e aplicada, ou participação em fundos de inovação orientados ao bem público.
V. Os resultados dos projetos financiados que forem convertidos em ativos de propriedade intelectual – como patentes, programas de computador ou outros direitos autorais – deverão ser obrigatoriamente registrados no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), com estímulo à cotitularidade entre empresas e ICTs.
VI. A alocação dos recursos deverá priorizar a redução das desigualdades regionais e a integração territorial das capacidades científicas e tecnológicas, com metas objetivas de mitigação das assimetrias. Atualmente, apenas cerca de 6% dos recursos de CT&I são aplicados nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. É fundamental que este percentual seja ampliado para pelo menos 20%, de modo a consolidar um piso mínimo de investimento e garantir a inclusão efetiva dessas regiões no desenvolvimento nacional. As operações devem estar alinhadas às diretrizes da política industrial nacional, notadamente a Nova Indústria Brasil, com foco em temas estratégicos, como:
• transição energética;
• exploração e produção de minerais críticos;
• preservação e uso sustentável de biomas;
• produção nacional de fármacos e insumos estratégicos para o SUS;
• criação e expansão de parques tecnológicos e ambientes de inovação integrados regionalmente.
Além da proposta de revisão do modelo de contrapartidas em operações incentivadas, é fundamental assegurar a implementação da divisão de 60% para operações não reembolsáveis e 40% para operações reembolsáveis, conforme deliberação do Conselho Diretor do Fundo e recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU), expressa no Acórdão nº 144/2024, no âmbito do processo TC 027.270/2021-1. Nesse sentido, a SBPC e a ABC solicitam o apoio da Casa Civil da Presidência da República para que articule, junto à Junta de Execução Orçamentária (JEO) e à Secretaria de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento e Orçamento, a incorporação desses percentuais na proposta orçamentária anual (PLOA 2026), conforme disposto no artigo 12 da Lei nº 11.540/2007.
A adoção dessa diretriz é essencial para garantir que os recursos do FNDCT cumpram sua finalidade pública, contribuindo para o fortalecimento do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação e para a promoção de ações estruturantes de alto impacto social, econômico e ambiental.Respeitosamente,
HELENA BONCIANI NADER
Presidente da ABC
RENATO JANINE RIBEIRO
Presidente da SBPC