O Acadêmico Diogo Onofre Gomes de Souza foi o membro titular convidado para palestrar no Simpósio e Diplomação dos Novos Membros Afiliados da ABC-Regional Sul, realizado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) em 13 de agosto.

Souza começou destacando que o processo de ensino-aprendizagem é um processo neural e que ele, enquanto professor universitário, têm diversas ansiedades com relação ao tema.

Ansiedade 1: a neurociência não entra na avaliação em sala de aula

Souza afirmou que, mesmo não sendo pedagogo, sabe que o baixo desempenho do Brasil no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA, na sigla em inglês), que é a referência usada internacionalmente para avaliar o ensino em diversos países, pode ser melhorado com neurociência, sem grandes custos para o Brasil.

Tendo estudado a neurobiologia do aprendizado de memória, ele se pergunta como se avalia esse rendimento num ambiente que a neurociência não entra. Souza apresentou uma imagem representativa do processo de aprendizado e explicou que o conteúdo apresentado pelo professor na sala de aula entra num cérebro cheio de eventos internos, como memórias e emoções, que tornam os indivíduos únicos. “Cada memória é resultado de muitas memórias adquiridas durante a vida. Há um filtro em cada pessoa, que facilita ou impede a retenção do conteúdo”.

Ansiedade 2: a sala de aula é, obrigatoriamente, o melhor ambiente em todo e qualquer momento

Na visão de Souza, o professor não considera de onde o aluno vem quando entra na sua sala. “Antes da sala de aula o aluno pode ter estado num encontro amoroso, ter saído da cama exausto por ter dormido pouco, pode estar uma tristeza profunda, pode estar voltando do recreio – quem sofreu bullying no recreio ou quem fez um bom lanche volta diferente para a sala de aula”, observa o cientista.

Ele aponta que as emoções que acontecem antes, durante e depois da aula influenciam no aprendizado do aluno . “Este processo é absolutamente individual, então não tem como o professor achar que algumas semanas depois ele pode cobrar um conhecimento adquirido a partir da aula que ele deu.

Ansiedade 3: ênfase sistemática no fracasso do ensino fundamental

Para Diogo Souza, não é só o ensino básico que é problemático no Brasil: o ensino de graduação e pós-graduação sofrem dos mesmos males. “Os professores universitários é que são chamados a ensinar como se dar a aula no ensino básico. Mas não há evidência científica de que eles saibam dar aula melhor do que os professores do ensino básico – e isso se dá por desconhecimento da neurociência”, assegurou.

Ansiedade 4: ênfase na concepção de que existe sempre um conteúdo central de conhecimento pétreo e universal, determinado pelo professor, a ser ensinado

Para explicar esta sua ansiedade, o Acadêmico deu como exemplo a alfabetização, um conhecimento básico universal. Ainda assim, existem teorias diversas sobre o processo de aprendizagem da escrita e da leitura, indicando que o modo de cada pessoa aprender é diferente da outra. “Assim como entre os cientistas, cuja maneira de fazer descobertas é individual, diferente de um para outro”, salientou.

Ansiedade 5: o professor é o transmissor central do conhecimento

Souza observou que o professor costuma pensar que todos os alunos estão prestando atenção ao que ele está escrevendo no quadro, por exemplo. E a possibilidade de que isso seja verdade é mínima. Disse também que a chance de não ter nenhum aluno que saiba mais do que o professor sobre alguma coisa é zero.

“Na minha área, foram publicados 25 mil artigos nos últimos 14 anos. Então é impossível estar atualizado. Algum aluno meu pode ter lido um desses 25 mil artigos, e este pode ter sido o artigo mais importante sobre aquele assunto neste período. Ele pode, portanto, saber mais do que eu sobre o assunto”, esclarece Souza.

Ele destaca que esses números se referem a um determinado tema e faz algumas hipóteses. “São números apenas sobre o tema da aula de hoje – porque o tema da aula de sexta-feira, por exemplo, tem mais milhares de outros artigos recentes sobre outro assunto. Ou seja, não tem como nem o professor nem o aluno estar atualizado nos dias de hoje.”

Ansiedade 6: pouca relação interpessoal

A interação professor-aluno, do ponto de vista de Souza, está acabando. “Quando se trata de crianças pequenas, essa interação ainda é preservada, mas na universidade a afetividade, a compreensão e o envolvimento ficaram impossíveis, pela quantidade de alunos”, lamenta o Acadêmico.

Mas o poder central, observa ele, ainda é do professor. “Ele determina o que o aluno tem que saber, quando e como ele tem que aprender, e determina ainda como e quando ele tem que ser avaliado. Isso não tem nenhum fundamento neurocientífico”, argumenta.

Ansiedade 7: falta de avaliação docente

“O professor ensina e avalia o aluno. Mas a avaliação deveria ser mútua. Eu dou aula há 30 anos e nunca fui avaliado como professor”, relata Souza. Ele afirma que, inclusive, não há evidência científica de que a avaliação deva ser feita pelo professor que pensa que ensinou um determinado conteúdo, porque não há evidência científica de que ele é a pessoa mais qualificada para tal.

Concluindo sua instigante apresentação, Diogo Onofre de Souza chamou atenção para o fato de que o uso que é feito das descobertas científicas está além do controle do cientista que as realizou. “Quando Marie Curie descobriu a radioatividade, não tinha ideia que poderia ser usada para fazer uma bomba atômica ou para desenvolver um tratamento de radioterapia. Se o avião inventado por Santos Dumont ou pelos irmãos Wright vai servir para unir pessoas distantes que estão com saudade ou para jogar bombas sobre civis depende da humanidade.”