A biologia celular é um campo da ciência que pesquisa processos dinâmicos como a divisão, a diferenciação e a morte das células. O estudo destes processos tem contribuído para a compreensão e o tratamento de doenças.
A Academia Brasileira de Ciências (ABC), em parceria com o Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), promoveu no dia 28 de março, em sua sede, o Simpósio “A Biologia Celular no Brasil: passado, presente e futuro”.
A sessão de abertura foi conduzida pela vice-presidente Regional da ABC para o RJ, Lucia Mendonça Previato, e o coordenador do evento, o Acadêmico Wanderley de Souza (UFRJ), diretor de Desenvolvimento Científico e Tecnológico da Finep. Previato destacou a importância do tema e explicou que estava representando o presidente da ABC, Luiz Davidovich, que estava em São Paulo na cerimônia de diplomação dos novos membros afiliados daquela região. Destacou que a ABC vem apoiando iniciativas interessante nas áreas científicas gerais e específicas, por ser este um dos seus focos principais: apoiar e difundir a ciência brasileira. Souza agradeceu aos organizadores do evento Claudia Mermelstein e Manoel Luis Costa, ambos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e à Diretoria da ABC, “cuja intensa atividade na missão de dar visibilidade à ciência brasileira merece destaque”, afirmou.
A importância da biologia celular no Brasil
A professora titular do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ Claudia Mermelstein explicou que a biologia celular, que envolve o estudo da estrutura e das funções das células, é uma área de enorme relevância. Contou que a biologia celular surgiu no Brasil como uma introdução aos estudos de histologia e, depois, manteve uma estreita relação com outras áreas de pesquisa, como a bioquímica, a genética e a biologia do desenvolvimento.
Sua ideia ao organizar o evento foi no sentido de pensar nos conteúdos de biologia celular a serem abordados em cursos de graduação. “Precisamos analisar os conteúdos de biologia celular oferecidos em cursos da área biomédica de universidades públicas brasileiras, discutir um conteúdo mínimo a ser sugerido pela SBBC [Sociedade Brasileira de Biologia Celular] para os diferentes cursos”, explicou, antes de apresentar a análise que fez em parceria com o Prof. Manoel Luis Costa.
Em sua análise foi destacado um ponto importante: os currículos hoje estão ainda muito focados na compreensão das estruturas celulares – como a membrana, plasmática, o citoesqueleto, o núcleo, as mitocôndrias, os lisossomos etc. – do que nos processos celulares, como a divisão, a morte, a migração, a adesão, a diferenciação e a sinalização. Ela acredita que estas áreas menos estudadas são exatamente as mais interdisciplinares, que requerem uma visão e uma atitude multidisciplinar dos professores.
Claudia ressaltou que uma demanda da área é que se torne uma área própria na Capes, e não um subtópico da área de morfologia, como é hoje. “Nada nas ciências biomédicas pode ser entendido senão sob a luz da biologia celular. Ela tem interseções com a biofísica, a bioquímica, a imunologia, a parasitologia, a genética, a biologia do desenvolvimento, a histologia, a neurobiologia, a medicina”, apontou a pesquisadora.
A palestrante relatou que no banco de dados da Plataforma Lattes, 11.130 pesquisadores declaram trabalhar com biologia celular. “No entanto, a SBBC só tem 1.700 membros. Então, estes outros devem trabalhar em áreas de interface. A biologia celular tem muito que crescer no Brasil”, concluiu Mermelstein.
A história da biologia celular no Brasil
Acadêmico e professor titular do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho da UFRJ, Wanderley de Souza, apresentou um histórico do desenvolvimento da área de biologia celular. Tudo começou com o versátil cientista alemão Athanasius Kircher (1601-1680), membro de um grupo holandês que começou a desenvolver sistemas óticos para ver coisas pequenas. “Ele é considerado o fundador da área, dado que fez as primeiras observações microscópicas de células”, relatou.
Robert Hooke (1635-1702) foi o primeiro cientista a identificar uma célula. “Graças aos corantes, foi possível identificar, por exemplo, o núcleo da célula, obra de Fontana e Brown”, observou. Schwan (1810-1888) foi o criador da teoria celular primordial e Virchow (1821-1902) foi o primeiro a mostrar que alterações nas células podiam causar doenças.
Com a invenção do microscópio eletrônico, o que se via com os corantes pôde ser confirmado e passou-se a ver coisas novas, como os microtubos e microfilamentos por Porter e Huxley, tendo este último ganhado o Prêmio Nobel por causa desta pesquisa.
Após os primeiros séculos de história europeia da biologia celular, Wanderley referiu-se à primeira pesquisadora brasileira que trabalhou com culturas de células e de protozoários intracelulares, Hertha Meyer (1902-1990). Ela nasceu na Alemanha, mas viveu no Brasil – e foi membro da Academia Brasileira de Ciências.
Souza remeteu-se ainda aos primeiros livros brasileiros considerados como referência para o estudo da área, de autoria de Vidal e Mello, Octacílio Lessa e Junqueira-Carneiro, e listou os principais cientistas brasileiros da área, já falecidos: Luis Carlos Junqueira (1920-2006) que identificou movimentos celulares; Raul Machado (1917-1996), que se dedicou à citologia vegetal; Crodowaldo Pavan (1919-2009), que trabalhou com amplificação gênica; Ricardo Brentani (1937-2011), que se dedicou ao processamento de RNA mensageiro; e Leopoldo de Meis (1938-2014), que pesquisava microssomos e transporte de cálcio.
Contou também que a organização da Sociedade Brasileira de Biologia Celular (SBBC) se deu a partir do impacto da primeira reunião internacional da área, em Boston, no ano de 1976. “Como consequência dessa reunião, partiu do Junqueira a propostas de criar-se a SBBC, que teve sua primeira reunião na Faculdade de Medicina da USP, em 1978”.
Wanderley de Souza ressaltou que, apesar das imensas dificuldades financeiras, temos equipamento de bioimageamento hoje em diversos laboratórios. “Precisamos botar a imaginação para funcionar e articular colaborações, para otimizarmos o uso dos equipamentos existentes e promovermos avanços na área da biologia celular”, apelou o Acadêmico.
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