Durante a conferência Avanços e Perspectivas da Ciência no Brasil, América Latina e Caribe 2008, realizada entre os dias 1º e 5 de dezembro na Academia Brasileira de Ciências (ABC), ocorreu também a 4ª Conferência Regional de Jovens Cientistas da TWAS-ROLAC (The Academy of Sciences for the Developing World – Regional Office for Latin América and the Carribean). Foram apresentados quatro simpósios que tiveram como palestrantes jovens talentos da ciência da América Latina.
O primeiro painel abordou as Ciências da Vida. Na ocasião, os pesquisadores Javier Carvajal, do Equador; Jorge Hernández, de Cuba; Serafim Vivanco, do México; e Ursula Matte, do estado brasileiro do Rio Grande de Sul, apresentaram seus trabalhos de pesquisa.
A biodiversidade das leveduras

Ele trabalha com leveduras, microorganismos que pertencem ao reino dos fungos e possuem diversas aplicações na Biotecnologia. “Basicamente, a nossa pesquisa está focada na caracterização e manutenção da biodiversidade desses organismos microscópicos, para os quais buscamos novas utilidades na Agricultura, direcionadas para os alimentos e os biocombustíveis”, explicou.
Os países tropicais, como Brasil e Equador, tem a maior diversidade biológica em leveduras. “Temos um potencial enorme para encontrar novas espécies que podem ter a resposta para muitas necessidades industriais, médicas… São coisas que ainda não conhecemos”, vislumbrou Carvajal.
O cientista lidera um grupo composto por nove pesquisadores e estudantes que participam de projetos destinados ao estudo das leveduras que eram utilizadas por povos indígenas dos Andes para a produção de uma fermentação ancestral. “Nosso trabalho sobre a cultura das populações andinas ampliou a perspectiva e a dimensão da história. Através da expressão dos fermentos e das leveduras, é possível recuperar o sabor original da cevada dessas comunidades antigas”, garantiu Carvajal. “A embaixada dos Estados Unidos vai financiar um projeto nesta área, de recuperação de bem patrimonial, pois a levedura da cevada antiga é nativa e tem mais de dois mil anos”.
Atualmente, o professor conta com o apoio do governo equatoriano para dar continuidade às pesquisas sobre a biodiversidade de leveduras do país, coordenando os bancos de termoplasmas de microorganismos do Equador. “Também trabalhamos em cooperação com indústrias agrícolas do Equador que estão interessadas no desenvolvimento de determinadas variedades desses microorganismos para auxiliar na pigmentação das gemas dos ovos e na elevação do peso de aves”, afirma. No campo dos biocombustíveis há um projeto de 1,7 milhões de dólares no país para o desenvolvimento de tecnologia sustentável para os combustíveis de álcool, segundo Carvajal,
Para o cientista, o intercâmbio com outros pesquisadores é essencial para o conhecimento dos avanços científicos de diferentes ramos e áreas. De acordo com ele, a conferência manteve um nível muito elevado, que certamente trará resultados positivos em curto prazo. “Estamos convencidos de que a cooperação entre as nações da América Latina é fundamental para o desenvolvimento dos nossos países, sobretudo do Equador, que está atrasado cientificamente frente ao Brasil e a Argentina, que possuem uma tradição muito maior na ciência e na tecnologia”, avaliou Carvajal.
Tecnologia de processos biológicos

Ele lidera um projeto que busca desenvolver tecnologia para a obtenção do fator de crescimento epidérmico (EGF-h) em larga escala. “Esta substância, que é uma proteína, é o elemento mais importante para a composição do produto HeberProt-P, medicamento empregado na prevenção de amputações de perna de diabéticos em função de úlceras”, explicou.
Segundo o pesquisador, a perspectiva futura da área onde atua é infinita. “A principal responsabilidade do setor de desenvolvimento tecnológico é converter uma molécula em um produto. Hoje em dia, existem muitos projetos de pesquisa que têm a intenção de desenvolver, produzir e comercializar produtos voltados para a saúde e a agricultura que entram na minha área, de desenvolvimento tecnológico”, afirmou.
Hernández acredita que a maior vantagem do evento é a oportunidade de conhecer o trabalho dos colegas de outras regiões. “A criação de uma rede entre os países latino-americanos é o que fortalece e complementa as pesquisas”, garante. De acordo com ele, a cooperação científica possui dois elementos essenciais: a integração dos trabalhos científicos e a otimização dos financiamentos, através da união e do compartilhamento. “Para quê trabalhar de forma independente, gastar dinheiro e tempo, se podemos unir os recursos e as forças para trabalharmos juntos em coisas novas?”, questionou.
Análise da expressão da síntese de proteína

Ele discursou sobre o seu trabalho de análise da expressão da síntese de proteína, que busca compreender e solucionar as questões envolvidas no processo. “Queremos descobrir como chegar a uma melhor eficiência da síntese, para podermos ajudar outros grupos que produzem trabalhos semelhantes”, afirma.
Segundo ele, foi muito enriquecedor participar do encontro, porque a conferência permitiu a interação com vários pesquisadores da América Latina. “Ganhamos consciência sobre as pesquisas realizadas por outros cientistas, o que possibilitou uma valiosa troca de opiniões”. Para Vivanco, a cooperação científica é fundamental para o avanço da ciência, porque produz um trabalho mais rápido e consolida novas idéias, de acordo com cada interesse.
Novas estratégias de terapia gênica

De acordo com a bióloga, diversos trabalhos promissores são publicados na área de terapia gênica, no mundo todo. “Muitas pesquisas utilizam RNA de interferência, uma estratégia oposta a nossa, que pretende inibir a expressão de uma proteína”, contou Ursula.
Para Ursula, o futuro deste estudo no Brasil depende, basicamente, de questões de financiamento. “Antes dos Institutos do Milênio não existia nenhuma organização de esforço coordenado de grupos de pesquisas neste tema no país. Existe uma rede de terapia gênica que produziu um grande impulso às pesquisas e vai acabar no ano que vem, mas seria muito interessante que ela continuasse. Em relação ao exterior, o Brasil ainda está muito defasado no setor”, adverte.
Na opinião da pesquisadora, a conferência permitiu que os jovens cientistas divulgassem os seus trabalhos e conhecessem pessoas com pesquisas em áreas afins. “O evento possibilita a futura realização de colaborações com pesquisadores do Brasil e de outros países”, disse a cientista.
De acordo com ela, a cooperação científica tem um papel fundamental hoje em dia, porque apenas um grupo de pesquisa não tem a competência técnica, de conhecimento ou financeira para conseguir competir e avançar no estudo científico. “A ciência atual – principalmente a área Biomédica, onde eu trabalho – atingiu um alto nível de complexidade que impossibilita o trabalho solitário. É necessário que cada cientista se especialize em uma determinada área, para gerar uma competência específica que, através do trabalho em equipe, aperfeiçoe o resultado final da pesquisa”, afirmou Ursula.