Em 20/5, foi realizada a sessão “COVID-19, Direito à Vida, Ciência e Cidadania”, promovida pelo Núcleo de Estudos Avançados do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz). Com o objetivo de discutir o tema e promover o debate entre a comunidade científica intra e extramuros, o IOC convidou o médico epidemiologista e ex afiliado da ABC Pedro Hallal; o médico oncologista e escritor Dráuzio Varella; a professora titular da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) Deisy Ventura; a presidente do Conselho do Magazine Luiza e do Grupo Mulheres do Brasil Luiza Helena Trajano; e o presidente da Academia Brasileira de Letras, escritor e poeta Marco Lucchesi.
A sessão foi coordenada pelo Acadêmico e pesquisador emérito da Fiocruz Renato Cordeiro e pela pesquisadora da Fiocruz Maria de Lourdes Oliveira. Na abertura, o Acadêmico Renato Cordeiro lamentou profundamente as mais de 440 mil mortes de brasileiros e brasileiras na pandemia de COVID-19, que poderiam ter sido evitadas com o estímulo ao distanciamento social, ao uso de máscaras e à negociação de vacinas com antecedência.
Cordeiro dedicou a sessão à constituição de 1988, que significou uma grande conquista da democracia, no que se refere à ampliação dos direitos individuais e sociais e na participação política direta dos diversos segmentos da população. Ele destacou o artigo 196, no qual é estabelecido que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado e, a partir do qual, foi criado o Sistema Único de Saúde (SUS), o maior sistema público de saúde do mundo. “E foi graças à existência do SUS, com todos seus problemas de financiamentos e sucateamentos ao longo dos anos, que podemos enfrentar a pandemia e minimizar o sofrimento da população brasileira”, declarou o Acadêmico.

Ele afirmou que esses cortes afetam seriamente programas exitosos de pós-graduação, de fomento do CNPq e inviabilizam a continuidade de programas de alta produtividade, bem como o funcionamento de laboratórios e institutos. “Nossos jovens pesquisadores e doutores são impossibilitados de continuar suas carreiras no país. Uma grande evasão de cérebros deverá ocorrer e já está ocorrendo, privilegiando os países desenvolvidos por absoluta desvalorização do saber no cenário nacional, através de políticas equivocadas”, concluiu.
A professora da USP Deisy Ventura apresentou um estudo do qual ela participou, publicado em janeiro de 2021, e que será apresentado à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre a COVID-19. A pesquisa busca comprovar que houve uma estratégia institucional de disseminação do novo coronavírus no Brasil, promovida pelo governo federal sob a liderança do presidente da república. Segundo ela, há uma convergência absoluta entre as falas e os atos do presidente Jair Bolsonaro. “São atos de propaganda contra a saúde pública e assim nós chamamos a forma pela qual autoridades federais encorajam a população a agir contra as medidas de saúde pública, a invadir hospitais, a atacar governadores e prefeitos que adotam medidas quarentenárias, a não obedecer medidas restritivas, sendo elas necessárias”, afirmou.

Ventura também elogiou a atuação do Dr. Dráuzio Varella como difusor da área médica. “Ele sabe, melhor do que todos nós, que em saúde pública, comunicação é crucial. Existe uma disciplina técnica chamada de comunicação de risco durante emergência e, portanto, as palavras matam e matam em massa”, manifestou a professora, citando situações como o negacionismo científico e a utilização da comunicação como forma de gerar adversidades.
Em sua fala, o Dr. Dráuzio Varella defendeu a difusão de informações para parcelas da população que não possuem acesso a tais conhecimentos, uma vez que são os principais atingidos por questões de saúde pública. O médico concordou com o posicionamento da professora Ventura e disse que a posição do presidente ante o combate ao COVID-19 não foi apenas negacionista. “A posição não foi passiva, foi ativa. O presidente se dedicou ativamente a disseminar o vírus, não utilizando máscara e combatendo todas as medidas de prevenção”, reiterou Varella.

Ex-membro afiliado da ABC e médico epidemiologista, Pedro Hallal apresentou o dado de que o Brasil tem 2,7% da população mundial, logo, se o país estivesse na média mundial de enfrentamento da COVID-19, essa mesma porcentagem de mortes teria ocorrido no Brasil. “Isso seria cerca de 90 mil mortes. Então, o Brasil tem cerca de 340 mil mortes a mais do que seria esperado pelo nosso tamanho populacional, caso a gente tivesse um desempenho na média mundial”, explicou o médico. Hallal também ressaltou o sentimento de impotência que ele, bem como todos os profissionais da área de saúde, sentem ante a pandemia, por saberem que as soluções para o combate ao vírus, tão defendidas por cientistas, não estão sendo adotadas.

Até a data do evento, o Brasil se encontrava na 81ª posição no ranking de países com maior porcentagem da população vacinada no mundo, mesmo sendo o 11º no número relativo de mais mortes e o 2º em termos absolutos. “Então, a narrativa falaciosa de que o Brasil é um dos países que mais vacinam no mundo é baseada em números absolutos que, nesse caso, não são relevantes, pois o que importa para a imunidade de rebanho não é esse numero, mas sim o percentual da população imunizado”, divulgou Hallal.
O evento contou, ainda, com perguntas realizadas pelos moderadores Renato Cordeiro e Maria de Lourdes Oliveira, e com um debate entre os palestrantes. A transmissão online ocorreu pelo canal do YouTube do IOC/Fiocruz e está disponível na plataforma.
